Pó
e memória
*
Por Emanuel Medeiros Vieira
“O
homem é feito visivelmente para pensar; é toda a sua dignidade e
todo o seu mérito; e todo o seu dever é pensar bem”. (Blaise
Pascal).
A
morte sempre ganha: tem mais tempo. Pessimismo?Driblamos a Indesejada
até quando for possível. Pó e memória.
Mas celebramos o pássaro cantante, um instante, o arco-íris, um relâmpago de encantamento. E passamos – passamos. Os sonhos de juventude, transformaram-se em dores na coluna? Tanto ruído, tanta matéria, tanta agitação!
“Credibilidade é a única moeda válida neste vasto mercado repleto de ruído”. A vida? Definam-me urgentemente o que é a vida – por favor, um náufrago sorridente pede socorro.
Até a caminho da forca, pode-se apreciar a paisagem – alguém escreveu. O pássaro cantante sorri para mim. Mesmo que esteja cercado de mortos e de fotos, rebelo-me contra o oblívio.
Existe um menino que não pode estar perto de mim. Mas também somos feitos daquilo que perdemos. E o tempo se vai – sempre.
O mar, o trapiche, um fogão de lenha, um menino, boné, morango, amora, trapiche, mar, mãe pão feito em casa – repito-me, eu sei.
É como querer segurar um instante diante desta máquina descartável – nosso mundo. Queria escrever: meus valores não pertencem a ele, mas soaria retórico e discursivo.
“Humanismo beato”, reclama um promotor interno. É apenas uma prosa poética, uma manhã, um mês de julho –parece tão pouco e é tudo.
(Salvador, julho de 2013).
*
Romancista, contista, novelista e poeta catarinense, residente em
Brasília, autor de livros como “Olhos azuis – ao sul do
efêmero”, “Cerrado desterro”, “Meus mortos caminham comigo
nos domingos de verão”, “Metônia” e “O homem que não amava
simpósios”, entre outros. Foi
indicado ao Prêmio Nobel de Literatura de 2018.
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