domingo, 29 de julho de 2018

Felicidade sem mistérios - Pedro J. Bondaczuk


Felicidade sem mistérios

* Por Pedro J. Bondaczuk

A única coisa sem mistério é a felicidade, porque ela se justifica por si só”. Quem fez essa afirmação tão categórica foi Jorge Luís Borges e ele está coberto de razão. Há tantos infelizes no mundo só porque esses indivíduos procuram essa ventura em lugares errados.

Condicionam-na a uma série de fatores (riqueza, beleza, sucesso, pessoas etc.), quando ela é espontânea e incondicional. Não cobra nenhum preço, não exige nenhum esforço e só precisa ser “localizada”. Mas milhões, bilhões de pessoas buscam e buscam e buscam serem felizes, em vão. Por que? Porque sua procura é equivocada.

A felicidade só pode ser encontrada (e usufruída) em apenas um e um único lugar: no interior da nossa mente. Ela está, sempre esteve (e sempre estará enquanto vivermos) ali, generosa e paciente, à nossa espera, à nossa disposição, nesse jogo de esconde-esconde em que transformamos, sem nos darmos conta, a nossa vida, sem jamais se fazer de difícil ou de rogada.

Mas o lugar em que habita é tão óbvio, tão direto, tão fácil de se chegar, que sequer nos passa pela cabeça a mais remota ideia de procurá-la ali. Ela, porém, jamais se afasta desse local, para não dificultar a procura. Não dribla e nem se nega a ninguém.

Todos, absolutamente todos, até o mais miserável dos miseráveis, potencialmente, pode ser feliz. Basta, apenas, querer. Basta entender a felicidade. E esse entendimento não requer nem mesmo sabedoria ou esclarecimento ou uma batelada de informações e muito menos genialidade. Podemos ser os mais tolos dos tolos, absolutamente alienados, imersos em completa loucura e, ainda assim... podemos ter acesso a ela.

Afinal, a felicidade é a única coisa sem mistério. Não a entendemos porque não queremos. Temos incorrigível e renitente mania de complicar as coisas mais simples e claras que existem. Não compreendemos a simplicidade. Não acreditamos nela. Achamos que um prêmio tão grande, como a felicidade, só pode exigir de nós esforços inauditos, transcendentais, sobre- humanos. No entanto... Não é necessário nada disso.

Dessa forma, malbaratam-se sonhos, esforços e energias e tudo em vão. Se não soubermos procurar a felicidade no lugar certo, não a encontraremos jamais. Poderemos, por exemplo, conquistar todas as riquezas do mundo, mais, até, do que o rei Salomão conquistou, e ainda assim não seremos felizes.

A felicidade nunca está nessa posse de “bugigangas” que, intrinsecamente, não têm o mínimo valor e que, quando têm alguma eventual serventia, apenas nos facilitam tarefas cotidianas, mas jamais têm o poder de nos tornar felizes.

De posse dessa “fortuna”, que só tem essas características para nós, néscios humanos, ao cabo de uma vida, chegaremos indubitável e invariavelmente a uma e uma única conclusão, a mesma a que Salomão chegou na velhice: “Vaidade, vaidade, tudo no mundo é vaidade”.

Já que iniciei estas divagações citando a declaração de Jorge Luís Borges, aproveito o ensejo para reproduzir um poema dele, intitulado “Nostalgia do presente” e que ilustra muito bem o que quero dizer:

Naquele preciso momento o homem disse:
O que eu daria pela felicidade
de estar ao teu lado na Islândia
sob o grande dia imóvel
e de repartir o agora
como se reparte a música
ou o sabor de um fruto’.
Naquele preciso momento
o homem estava junto dela na Islândia”.

Pois é exatamente assim que a felicidade funciona. Basta imaginar alguma coisa, pessoa ou situação que nos satisfaçam e, naquele exato instante, nos sentiremos felizes. Sua extensão, porém, depende só de nós. Reitero o que já escrevi inúmeras vezes: a felicidade não é um objeto ou sequer condição especial. É um estado de espírito.

Tanto pode ser obtida num palácio dourado, quanto em nosso quarto de solteiro, no fundo de uma masmorra infecta e insalubre ou na gélida Islândia. Basta que a requisitemos, que a procuremos onde sempre esteve, está e estará, ou seja, que a encontremos em nosso interior e que acreditemos que ela se faz presente. E, subitamente, ela, de fato, estará conosco. Sem complicações, sem esforços e sem frescura..


* Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance Fatal” (contos), “Cronos & Narciso” (crônicas), “Antologia” – maio de 1991 a maio de 1996. Publicações da Academia Campinense de Letras nº 49 (edição comemorativa do 40º aniversário), página 74 e “Antologia” – maio de 1996 a maio de 2001. Publicações da Academia Campinense de Letras nº 53, página 54. Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com. Twitter:@bondaczuk

Nenhum comentário:

Postar um comentário