domingo, 30 de junho de 2013

Literário: Um blog que pensa

LINHA DO TEMPO: 7 anos, três meses e dois dias de existência.

Leia nesta edição:

Editorial – Os incompreendidos

Coluna Ladeira da Memória – Pedro J. Bondaczuk, crônica “Driblando o preconceito”.

Coluna Direto do Arquivo – José Paulo Lanyi, crônica “E se você jogasse a Copa?”.

Coluna Clássicos – Augusto Frederico Schmidt, poema “Retrato do Desconhecido”..

Coluna Porta Aberta – Guilherme de Carvalho, artigo “O gigante acordou ou levantou para fazer xixi?”.

Coluna Porta Aberta – Angélica Almstadter, poema “Bicho”..

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Livros que recomendo:

“Balbúrdia Literária” José Paulo Lanyi – Contato: jplanyi@gmail.com
“A Passagem dos Cometas” – Edir Araújo – Contato: edir-araujo@hotmail.com “Aprendizagem pelo Avesso” Quinita Ribeiro Sampaio – Contato: ponteseditores@ponteseditores.com.br
 “Cronos e Narciso” Pedro J. Bondaczuk – Contato: WWW.editorabarauna.com.br
“Lance Fatal”Pedro J. Bondaczuk - Contato: WWW.editorabarauna.com.br



Obs.: Se você for amante de Literatura, gostar de escrever, estiver à procura de um espaço para mostrar seus textos e quiser participar deste espaço, encaminhe-nos suas produções (crônicas, poemas, contos, ensaios etc.). O endereço do editor do Literário é: pedrojbk@gmail.com. Twitter: @bondaczuk.As portas sempre estarão abertas para a sua participação.

Os incompreendidos

O pintor holandês Vincent Van Gogh, hoje reconhecido, consensualmente, no mundo todo (até por quem não aprecia a pintura e não entende nada de artes plásticas), como gênio da sua arte, foi classificado, em vida, como “artista maldito”. Esse termo é geralmente empregado (não sei se adequadamente e entendo que não) para qualificar aqueles que, por um motivo ou por outro, não conseguiram o reconhecimento de seus contemporâneos e foram resgatados somente algumas gerações depois.

Muitos acabaram destruídos pelo fracasso e arruinaram-se, pessoal e financeiramente, terminando a vida como bêbados, mendigos, farrapos humanos, homens completamente derrotados. Van Gogh foi um deles. Terminou seus dias considerado como maluco, internado em um sanatório para doentes mentais em Arles, no Sul da França.

Alguns desses gênios incompreendidos recorreram ao jogo, e perderam o pouco que lhes restava de dinheiro e de dignidade, para não pensar no fracasso. Como se o esquecimento, nesses casos, fosse possível! Claro que não é! Não raros foram os que se entregaram a uma vida dissoluta, tendo bares e prostíbulos como cenários da sua decadência física e moral, entregues ao álcool e alguns às drogas como o ópio, para tentar afogar a imensa frustração gerada pelo insucesso e a dolorosa sensação da derrota e da inutilidade.

A arte, em geral, pune, em vez de premiar, os seus servos. E quanto mais leais e dedicados, pior é o castigo. Não raro os melhores e mais criativos têm que arcar com uma carga mais pesada de desgosto e aceitar o esquecimento e o ridículo (para alguns, temporários, para outros, definitivos) por parte dos contemporâneos.

Por isso, quem tem como trabalho a função de crítico, a tarefa de julgar as produções alheias, o poder de influenciar opiniões, nas colunas especializadas de jornais e revistas, precisa tomar imenso cuidado (caso queira ser justo e honesto) na avaliação da obra de qualquer artista, não importa de que arte, para não cair, ele próprio, muitos anos depois da sua morte, no ridículo, quando o valor do criticado for devidamente reconhecido (se o for, é claro).

Na poesia, qual o intelectual que não conhece “les cinq poétes maudites” franceses? Hoje, todavia, Rimbaud, Verlaine, Valéry, Baudelaire e Mallarmé representam, por si sós, toda uma época de ouro da literatura, não somente da França, mas do mundo todo. Mas quando eram vivos, quer pelo estilo que vida que tinham, quer pelos conceitos que emitiam, quer pelo que diziam e escreviam, eram tidos, pela maioria dos críticos, como iconoclastas. E, pior, como empulhadores, como falsos poetas, como pessoas de péssimo gosto e maléfica influência.

Vincent Van Gogh, por exemplo, conseguiu, em vida, vender um único quadro. E essa venda nem pode ser considerada como tal, pois quem adquiriu essa obra solitária foi o seu irmão, provavelmente por piedade e como uma forma de incentivo ao artista. Hoje, todavia, qualquer dos seus esboços, o mais simples borrão ou rabisco do mestre holandês, valem incalculáveis fortunas. E suas obras são acessíveis apenas a quem conte com uma conta bancária que ascenda a centenas de milhões de dólares.

Quem estava certo? Os marchands, que não somente recusavam seus quadros, mas cobriam-no de observações injuriosas, ou o irmão, que mesmo adquirindo um quadro por piedade ou para incentivar o artista (e ninguém pode provar que foi este o verdadeiro motivo da compra), investiu algum dinheiro, por mínimo que fosse, nesse talento não reconhecido?

Por paradoxal que pareça, hoje os críticos de arte são unânimes em reconhecer que o período de maior criatividade de Van Gogh foi aquele em que, consumido pelo desgosto, pelos fracassos, pelo álcool e pelo consumo compulsivo de absinto, que tomava em monumentais quantidades, esteve internado no sanatório para doentes mentais. Santa loucura!

Seus nervos superexcitados, levados ao ponto extremo de tensão pela humilhação causada pelo fracasso e pela incompreensão, fizeram com que, na oportunidade, o pintor transmitisse uma enorme, incomensurável e profunda angústia para o pincel e daí para as telas. É simplesmente genial, por exemplo, a carga emocional, a brutal autenticidade, a violência avassaladora contida nos ciprestes do quadro que pintou da fachada do hospício em que estava internado! A serenidade de espírito nem sempre (ou quase nunca) estabelece o clima ideal para a produção artística!

Há inúmeros Van Goghs, Verlaines e Rimbauds por aí, à espera de reconhecimento, de apoio, de patrocínio e de condições para sobreviver e para criar. Muitos são, e permanecerão, incompreendidos, amargurados, derrotados, à espera da morte. Não raros serão reconhecidos dentro de trinta, cinqüenta, ou cem anos. Claro que será muito tarde!

Talvez seja uma fatalidade que persiga boa parte dos gênios, cujas cabeças, cujo talento e cuja sensibilidade estão muitíssimo à frente do seu tempo. Nasceram em época e lugar errados. Ousam desafiar o comodismo das soluções fáceis, o convencionalismo da moda, os cânones consagrados, mas ultrapassados, para transmitir, através da palavra, da imagem ou do som uma inquietadora beleza, muitas vezes selvagem e brutal, que somente eles conseguem captar. Sua genialidade tem um preço que poucos, pouquíssimos, estão dispostos a pagar e por isso abdicam do talento e dedicam suas vidas a tarefas rotineiras, aparentemente importantes, que na verdade são destinadas aos medíocres e acomodados. A solidão é a maldição dos gênios!

Boa leitura.


O Editor.

Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
Driblando o preconceito

* Por Pedro J. Bondaczuk

O preconceito, qualquer que seja seu alvo, fulcro, motivação e intensidade, é o mais letal dos venenos dos relacionamentos entre indivíduos, povos e nações. Escrevi a esse respeito inúmeras vezes e reiterarei o quanto for necessário meu repúdio a esse comportamento doentio e irracional. Quem é vítima desse absurdo conceito prévio que alguns fazem de seus semelhantes, sabe o quanto isso dói, revolta e frustra.

Se houve alguém que poderia falar com propriedade a respeito dos estragos emocionais que o preconceito causa na vida de quem é vítima dele, esse foi Charles Chaplin. É verdade que esse homem talentoso e sábio – a exemplo do imortal personagem que criou, o ao mesmo tempo sagaz e ingênuo Carlitos, que driblava, com agilidade, as autoridades que lhe queriam barrar o caminho em alguma das suas peripécias – driblou essas circunstâncias injustas e absurdas de que foi vítima. E isso só valoriza ainda mais seu sucesso, que hoje é consensual, 36 anos após a sua morte, ocorrida em 25 de dezembro de 1977.

Chaplin foi, por exemplo, vítima do preconceito social. Nascido nas camadas mais baixas da sociedade inglesa, elitista por excelência, em que o “berço” conta mais do que o caráter, as aptidões e as virtudes, foi encarado com irônico menosprezo pelos seus conterrâneos quase que durante sua vida toda.

Hoje, contudo, é visto como um dos heróis nacionais. Tanto que, em 1975, foi sagrado como “Sir”, ou seja, como nobre, pela Rainha Elizabeth II, em cerimônia das mais concorridas no Parlamento britânico e com ampla cobertura da imprensa internacional (e, sobretudo, nacional).

Outro preconceito que sofreu (este ainda mais incompreensível) foi o étnico. Alguns historiadores afirmaram que o nome Chaplin é uma corruptela do judeu “Kaplan”. Um deles foi Theodore Huff, que demonstrou, também, que a mãe de Charles, embora irlandesa, tinha ascendência judia. O ator, na verdade, divertia-se com isso e ora confirmava, ora negava (como que confirmando) essa suposta origem.

Durante a Segunda Guerra Mundial, com boa parte da Europa ocupada pelas tropas nazistas e com o pleno andamento do hediondo plano de Adolf Hitler de simplesmente eliminar “todos os judeus” da face da Terra com sua delirante “solução final”, Chaplin pareceu vacilar. Deu declarações que, seis anos depois, iria negar. Afirmou, categoricamente, em 1940, em uma entrevista à imprensa: “Eu não sou judeu!”. Contudo, no filme “O grande ditador”, em que satirizou o “füherer” alemão (apenas quatro dias mais velho do que ele), tenha interpretado o papel de um barbeiro justamente de ascendência judia.

Terminado o conflito, em 1946, Charles voltaria a se manifestar a respeito da sua suposta ascendência hebraica. Na oportunidade, desdisse o que havia dito seis anos antes. Declarou, e não apenas uma única vez, mas em várias entrevistas que concedeu: “Dizem que eu sou meio judeu e é verdade. Eu nunca neguei”.

Hoje, num mundo razoavelmente mais esclarecido (embora nem tanto), essa suposta origem étnica certamente não teria a menor importância. Mas naquele período, em que o ódio fervilhava e o preconceito disseminado pelos propagandistas nazistas era candente... Era algo perigoso. Charles poderia, por exemplo, até ser assassinado por algum fanático nazista (e nos Estados Unidos havia muitos simpatizantes dessa ideologia), somente por essa suposta origem.

A terceira forma de preconceito a que Chaplin também teve que driblar foi a ideológica. Em 1952, o criador do Carlitos foi virtualmente expulso dos Estados Unidos, por influência da então todapoderosa “Comissão de Atividades Anti-americanas”. Os processos políticos, naqueles tempos sombrios e tensos, sequer exigiam provas incontestáveis para punir quem quer que fosse. Podiam basear-se em meras suspeitas, ou em denúncias anônimas sem nenhuma comprovação. Ou mesmo em provas meramente circunstanciais e ambíguas ou em evidências improváveis e duvidosas.

O mundo estava em plena guerra fria. Dos dois lados do Atlântico, o fanatismo ideológico campeava e obcecava as pessoas, notadamente as ligadas aos respectivos governos, dos Estados Unidos e da União Soviética. Foi uma época que não condiz nem um pouco com as tradições e convicções norte-americanas, que apregoavam (e apregoam) que o país é o paraíso da liberdade e da tolerância, ou seja, a pátria da democracia.

Charles Chaplin soube que estava sendo investigado a bordo de um navio, quando regressava a Nova York, após turnê pelo exterior. Sua primeira reação, como seria de se esperar, foi de surpresa. Essa seria sucedida, tempos após, pela de mágoa e, finalmente, pela de raiva. Pudera! O ator decidiu que não se deixaria crucificar passivamente, como tantos outros fizeram, e que iria se defender com todos os recursos ao seu dispor. Estes, porém, para as circunstâncias, eram virtualmente inócuos.

O que estava acontecendo, então, nos Estados Unidos, ia contra tudo o que Charles acreditava. Na tentativa de esclarecer o mal-entendido, ele resolveu escrever diretamente ao então secretário de Justiça, James McGranery. E para que tudo andasse mais rápido, optou por enviar um telegrama à referida autoridade, esclarecendo sua posição. Foram estes os dizeres da sua mensagem: “Não sou comunista. Jamais em minha vida aderi a qualquer partido político.  Sou o que o senhor chamaria de mercador da paz. Espero não tê-lo ofendido”.

McGranery, todavia, ignorou a mensagem. Não levou as palavras do ator em conta. Em vez disso, veio a público e declarou, em uma entrevista à imprensa: “Na minha opinião, ele (Chaplin) faz pronunciamentos que indicam sua atitude de desdém para com o país cuja hospitalidade o enriqueceu”.

Charles, ao regressar à Inglaterra, ainda mandou outra mensagem ao secretário de Justiça. Não se tratou (como seria lícito de se esperar naquelas circunstâncias) de nenhuma ofensa, pois isso não era do seu feitio. Escreveu, apenas: “Não penso que se deva dividir as pessoas de acordo com suas opiniões. Isso conduz ao fascismo. Creio na liberdade. Essa é a minha política”.

Alguns jornais (poucos, felizmente) atacaram o genial cineasta em suas páginas. O “Saturday Evening Post”, por exemplo, chegou, inclusive, a classificá-lo de “Pierrô Vermelho”. Não tardou, porém, para a verdade ser restabelecida. Seus acusadores jamais provaram a mais remota ligação de Charles com o comunismo. Mas não tiveram a grandeza de se retratar. Pagaram por isso. O jornal que o chamou de “Pierrô Vermelho”, não existe mais. E Chaplin...

O criador de Carlitos recebeu três prêmios Oscar ao longo de sua vitoriosa carreira. No entanto, apenas um deles, justamente o último, teve valor especial para Chaplin. Foi o de 1972, considerado como o da “reconciliação”. O prestigioso “The New York Times” afirmou, na ocasião da entrega da estatueta, em editorial: “Ainda bem que ele (Charles) veio. Se uma nação pudesse enrubescer coletivamente, e além disso amargar para sempre um sentimento de culpa, essa nação era a nossa”. E não era?!



* Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance Fatal” (contos) e “Cronos & Narciso” (crônicas). Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com. Twitter:@bondaczuk 

E se você jogasse a Copa?

*Por José Paulo Lanyi


Às vezes paro tudo e deixo a lógica para os outros. Faço de conta que o mundo é diferente e vejo o que acontece. Posso explicar com um exemplo. Outro dia soube do nome do novo campeão do Torneio de Roland Garros. Um garotão que, dizia a reportagem, tinha um senhor retrospecto. Eu não sabia quem ele era. Faz tempo que não dou a mínima para os campeonatos de tênis. Vi a cara do rapaz e concluí que, estivesse ele ao meu lado, a comprar na sapataria, não o distinguiria entre os demais. Experimentasse os seus sapatos, para mim estaria bem. Poderia mesmo confundi-lo com um vendedor.

Na TV, o jovem celebrava o seu feito. Perguntei-me quanto aquilo não lhe custara. Sem que ele soubesse da minha discreta existência, lambera muita quadra de saibro para chegar ao topo.

Imaginei, então, um absurdo. Ligaria a TV e, algo surpreso, depararia com o Fernando Mariz Masagão em Wimbledon.
 
EU
Oi, Mariella, tudo bem? Não sabia que o Fernando jogava tênis...

MARIELLA AUGUSTA
Eu também não. Na semana passada ele disse que faria uma surpresa. Aí me ligou lá daquele orelhão ao lado da quadra de Wimbledon.

EU
Orelhão? Mas isso não era no Maracanã?

MARIELLA AUGUSTA
Ai, Zé... Conservaram alguns poucos orelhões. Um deles instalaram em Wimbledon!

EU
Que estranho! Isso é bizarro! Orelhão é coisa de brasileiro!

MARIELLA AUGUSTA
Claro que não, Zé! Quer apostar o quê comigo?

EU
Nada, Mariella, você nunca me paga quando perde...

MARIELLA AUGUSTA
Ah, Zé, deixa de polêmica, vai...

EU (irônico)
Tá legal... Quer falar de amenidades, vamos falar de amenidades...

MARIELLA AUGUSTA
Zé, Zé...

EU
Então vamos lá... Ele tem tudo para ganhar. Está indo muito bem...

MARIELLA AUGUSTA
O Fernando é o máximo...

EU
Mas ele devia ter me avisado. Agora está muito em cima para uma festa decente...

MARIELLA AUGUSTA
Ah, Zé... Quando ele voltar a gente compra uma Coca-Cola e aqueles salgadinhos de saquinho...

EU
Tem razão, Mariella. Ele não está nem aí... E agora vai ser campeão de Wimbledon... O Fernando não está nem aí...

Na Copa é a mesma coisa... O hino brasileiro enquadra, passo a passo, cada uma das nossas estrelas... Dida, Ronaldo Gordo,  Kaká, Roberto Carlos, Pablo Uchoa...
Pablo Uchoa????

(No MSN, depois do jogo)

EU
Pablito, cacete, vc arrebentou!

PABLO UCHOA

Fala, Zé! Vc viu a piaba que demos naqueles gringos?

EU
Porra, Pablo, o mundo inteiro viu! Mas como é que foi isso? Como é que vc conseguiu jogar a Copa?

PABLO UCHOA
Ah, velho, eu estava aqui em Londres, um tédio desgraçado. Aí liguei para o Parreira e disse que queria jogar...

EU
E ele?

PABLO UCHOA
Bom... Eu estou aqui, não estou?

EU
He..he..he... É verdade.

PABLO UCHOA
Vc quer jogar também?

EU
Não vai dar, Pablito. Agora, com essa história de duas colunas por semana no Comunique-se...

PABLO UCHOA
Bobagem, manda os textos daqui! Eu falo com o Parreira! Se bobear, a gente joga junto contra a Austrália!

EU
Não, Pablo, deixa para a próxima...

PABLO UCHOA
C q sabe...

EU
Enfia os caras, Pablito!

PABLO UCHOA
Xá comigo, Zé! Abração!

EU
Abração, se cuida!
Agora, com o Pablito, temos um quinteto mágico. Nunca será tão fácil.     

(*) José Paulo Lanyi é jornalista, escritor e dramaturgo, autor do romance "Calixto-Azar de Quem Votou em Mim", do romance cênico (gênero que criou) "Deus me Disse que não Existe", da peça "Quando Dorme o Vilarejo" (Prêmio Vladimir Herzog) e da coletânea “Teatro de José Paulo Lanyi e Outros Loucos” (no prelo), todos da editora O Artífice. Trabalha com o músico paulistano Flávio Villar Fernandes, com quem compôs a trilha “Invernada Op1 N1” e a sinfonia Atlântica.



Retrato do Desconhecido

* Por Afonso Frederico Schmidt

Ele tinha uns ombros estreitos, e a sua voz era tímida,
Voz de um homem perdido no mundo,
Voz de quem foi abandonado pelas esperanças,
Voz que não manda nunca,
Voz que não pergunta,
Voz que não chama,
Voz de obediência e de resposta,
Voz de queixa, nascida das amarguras íntimas,
Dos sonhos desfeitos e das pobrezas escondidas.
Há vozes que aclaram o ser,

Macias ou ásperas, vozes de paixão e de domínio,
Vozes de sonho, de maldição e de doçura.
Os ombros eram estreitos,
Ombros humildes que não conhecem as horas de fogo do
amor inconfundível,

Ombros de quem não sabe caminhar,
Ombros de quem não desdenha nem luta,
Ombros de pobre, de quem se esconde,
Ombros tristes como os cabelos de uma criança morta,
Ombros sem sol, sem força, ombros tímidos,
De quem teme a estrada e o destino
De quem não triunfará na luta inútil do mundo:
Ombros nascidos para o descanso das tábuas de um caixão,
Ombros de quem é sempre um Desconhecido,
De quem não tem casa, nem Natal, nem festas;
Ombros de reza de condenado,
E de quem ama, na tristeza, a sombra das madrugadas;
Ombros cuja contemplação provoca as últimas lágrimas.

Os seus pés e as suas mãos acompanhavam os ombros
num mesmo ritmo.
Mãos sem luz, mãos que levam à boca o alimento
sem substância,
Mãos acostumadas aos trabalhos indolentes,
Mãos sem alegria e sem o martírio do trabalho.
Mãos que nunca afagaram uma criança,
Mãos que nunca semearam,
Mãos que não colheram uma flor.
Os pés, iguais às mãos
— Pés sem energia e sem direção,
Pés de indeciso, pés que procuram as sombras e o esquecimento,
Pés que não brincaram, pés que não correram.

No entanto os olhos eram olhos diferentes.
Não direi, não terei a delicadeza precisa na expressão
para traduzir o seu olhar.
Não saberei dizer da doçura e da infância daqueles olhos,
Em que havia hinos matinais e uma inocência, uma tranqüilidade,
um repouso de mãos maternas.

Não poderei descrever aquele olhar,
Em que a Poesia estava dormindo,
Em que a inocência se confundia com a santidade.
Não poderei dizer a música daquele olhar que me surpreendeu um dia,
Que se abriram diante de mim como um abrigo,
E que me trouxe de repente os dias mortos,
Em que me descobri como outrora,
Livre e limpo, como no princípio do mundo,
Envolvido na suavidade dos primeiros balanços,
Sentindo o perfume e o canto das horas primeiras!
Não direi do seu olhar!

Não direi do seu olhar! Não direi da sua expressão de repouso! 
Ainda não sei se era dele esse olhar,
Ou se nasceu de mim mesmo, num rápido instante de paz
e de libertação!


* Poeta, jornalista er escritor
O gigante acordou ou levantou para fazer xixi?

* Por Guilherme de Carvalho

I

Podemos garantir: os historiadores terão muito trabalho. Primeiro porque o povo que tomou as avenidas faz parte de uma massa heterogênea que até ontem era imiscível; não há lideranças visíveis; os canais estão abertos e todos os setores da sociedade brasileira irão participar do jogo; o movimento não veio para explicar, mas para confundir. Uma dica a quem não está entendendo nada e precisa de um repertório introdutório: somos a geração que assistiu aos filmes Clube da Luta, Matrix, V de Vingança e O Cavaleiro das Trevas. Mas comece pelo V de Vingança, muito mais urgente. Não temos rosto, usamos máscaras, nós somos todo mundo, o caos encarnado, mais Coringa que Batman. Há pouca concordância entre nós mas, naquilo em que concordamos, não iremos recuar. Vocês já perderam, portanto reduzam os danos enquanto é tempo.

II

Vão sempre noticiar que somos menos do que realmente somos, em número e em capacidade de atuação. Nós não estaremos nas ruas para mudá-los, mas para mudarmos. Vocês não vão mudar e é por isso que muitos de vocês não servem mais. Do asfalto esburacado das grandes avenidas brasileiras nascerá uma juventude inquieta que desconfiará dos discursos pré-fabricados, das fórmulas que não funcionaram, dos esquemas que são apenas bonitos, do entretenimento que tenta nos anular e do plano de vida que nós não queremos ter.

III

Nós falaremos sério, rindo. Nós assistiremos seu canal como deboche. Nós leremos sua coluna para sabermos o que não queremos ser. Nós não vamos disputar espaço: aqui, cada um tem o seu papel. Nós confundiremos analistas enquanto pudermos. Nós devolveremos o trauma. Nós somos muito bem informados e está cada dia mais difícil nos enganar e nos confundir. Quando começou o milênio, vocês pensaram que tinham nos derrubado nos mantendo em casa, mas rapidamente descobrimos como nos achar. Queremos a rua de volta!

III

Menos Prozac, mais voz!

IV

Direitos humanos é uma luta diária. Hoje é o morador da favela. Logo, logo é qualquer um, por motivo nenhum. Indigne-se em defesa do próximo.

V

A distância entre democracia e estado de exceção é, infelizmente, pequena. Nós criaremos um estado de emergência nas ruas que corresponda à nossa emergência interior.

VI

Menos câmeras de vigilância e mais cinema!

VII

A luta não é contra o sistema. Lutamos para nos inserirmos num sistema que nos excluiu. Não queremos o nosso dinheiro subsidiando empresas de transporte. Nós queremos o fim do lucro criminoso e ultrajante! Vinte centavos foi a diferença entre ir e ficar. Nós queremos ir!

VIII

A biopolítica nunca foi tão importante. Olhe-se nu no espelho: como as coisas estão indo, esse corpo é cada dia menos seu.

IX

Desconfie da mídia se ela mostra apenas um lado. Desconfie mais ainda se ela subitamente quer mostrar os dois. No momento em que ela estiver do seu lado, descarte-a: ela te trairá mais cedo ou mais tarde.

X

Nós sabemos que o Brasil não é tão ruim quanto dizem os que querem tomar o poder à força, nem tão bom quanto dizem os que não querem largar a cadeira oficial. Nós não queremos mais consumo e mais crédito! Nós não queremos mais índices e pesquisas mentirosas! Nós abandonaremos a nossa revolução se vocês revolucionarem a saúde e a educação brasileiras. E não falo apenas de destinar mais dinheiro: nós queremos comprometimento contínuo na mudança! Nós queremos projetos de longo prazo postos em prática e os de curto prazo começando amanhã!

XI

Um professor vale mais que o Neymar. Um médico vale mais que o Eike Batista. FIFA, nós gostamos de futebol, sim, mas gostamos ainda mais de nosso povo. Vocês analisaram mal, muito mal, quando pensaram que iriam instaurar suas leis, seus esquemas, suas remoções hediondas e nós ficaríamos calados. Aguentem a ressaca!

XII

O movimento estudantil organizado irá se iludir, se deprimir, se dividir e, quarenta anos depois, seus líderes escreverão livros de memórias com os dizeres: “nós erramos”? Não, não caiam no erro. Não façam discussões intermináveis, não desperdicem força e não tenham a pretensão de liderar. Vocês já venceram! Vocês começaram tudo isso e continuarão vencendo se continuarmos juntos! Não debatam com termos antigos, criem uma nova linguagem, ajam e deixem agir! A História saberá que foram vocês que acenderam a centelha. Deixem de lado as brigas internas e aproveitem! Não permitam que a classe média coxinha lidere, mas levem em consideração presença dela.

XIII

O governo de São Paulo queria saber com quem negociar. O governo do Rio de Janeiro quer saber com quem negociar. Não há liderança e, se houver, ela não representa ninguém senão a si mesma. Deixem eles se desgastarem eleitoralmente, sem saber por que, sem saber onde e como, e eles vão, talvez, começar a entender o que nós sentimos dia após dia. As balas vêm de todos os lados? Ótimo. É assim que vocês nos tratam.

XIV

Sabem o que é unânime? O Poderoso Chefão é o maior filme de todos os tempos. Família Soprano, o maior programa de televisão da História. E sabem por quê? Porque para onde olhamos há atividade mafiosa. Nós somos o Michael Corleone sentado numa festa de família odiando fazer parte de uma estirpe mafiosa, esperando a hora em que seremos obrigados a nos corromper. E, quando nos corrompermos, passaremos a vida frustrados por descobrirmos pouco a pouco que não é apenas a máfia ilegal e criminalmente punível que atua em nossas vidas, mas as estruturas mafiosas que permeiam todos os aspectos legais da vida; uma atividade contínua executada por gente de colarinho branco e carros oficiais, fazendo esquemas pelas nossas costas. Nós não queremos mais ser apenas espectadores da barbárie burocrática! Nós não queremos mais trocar confidências de esquemas! Nós não queremos uma vida assim!

XV

Ser contra a corrupção, todos somos. Esqueçam a ideia de uma revolução moral. Precisamos de uma revolução cognitiva que seja árdua, permanente, autorreflexiva e auto-crítica.

XVI

Não hostilize os partidos políticos e os movimentos sociais. Desculpe o choque de verdade, mas isso é tipicamente fascista. Respeite-os! Eles já lutavam por ideais antes de você nascer, lutavam pelas melhorias que hoje você luta até semana passada, apanhando de polícia com seus parcos companheiros e, quando você estiver casado, com filhos e assistindo ao Fantástico, eles continuarão lutando. Seja apartidário – é um direito seu não se identificar com partido nenhum, assim como não me identifico completamente – mas não seja anti-partidário. Cuidado com o discurso do “Sem nenhum partido, pela nação!”, pois isso se parece muito com “Pela nação sem nenhum partido!” Ditadura, em outras palavras. E saiba, com toda a responsabilidade que disso decorre, que se você não está na esquerda, está na direita. Centro, só o da cidade, que é onde estaremos enquanto não atingirmos os nossos objetivos. Posicione-se!

XVII

Não seja ufanista. O Brasil não é lindo. Não há um futuro glorioso nos esperando. Um país é fruto de uma luta diária, paciente, perene, com pequenas revoluções, pequenos atos, mudanças constantes, autorreflexão contínua. O gigante acordou como acordou outras vezes, mas a História mostra que sempre teimamos em voltar a dormir. Não durma! Esteja para sempre atento!

XVIII

Quebrar e depredar é uma atitude válida quando é política, direcionada, com manifesto e não quebra-quebra aleatório. Você acha que o banco te explora quando pega o extrato? Quebre o banco e piche: “Parem de me explorar, safados!”. Acha que o Cabral merece ter a casa quebrada para sentir a fúria? Quebre e deixe um recado. Pichar muros com dizeres políticos é política, é revolta legítima. Mas não destrua patrimônio particular de trabalhadores que são tão explorados quanto todos nós. Ele está do seu lado. Ele é você! Direcione sua fúria, se a fúria é sua linguagem. Mas durma com essa: trabalhadores vão limpar toda a sua fúria amanhã pela manhã. E custa caro. E eles vão dizer que custa mais do que custa de fato, como sempre. Ponha esse dado na balança e peça ao menos desculpas.

XIX

Não busque respostas. Faça novas perguntas. Você não é um idiota que viu a internet crescer. Você viu o maior ataque terrorista da História, genocídios na África, duas guerras americanas hediondas, os maiores países do mundo em crise, Oriente se insurgir contra ditaduras e o Brasil receber injeções diárias de desânimo. A História de nosso país é uma história de levantes, revoltas, insurgências (e, infelizmente, de golpes; cuidado!). Abrace o seu tempo. A História é agora.

XX

Não sei o que significa o gigante ter acordado porque não sei que gigante é esse. Se é um gigante autoritário, excludente, homofóbico, machista, racista e moralista, melhor continuarmos dormindo. Mas se é para acordar um gigante nunca visto e que pretende inspirar a mudança, então tire o seu pijama, escove os dentes e parta para a luta comigo!


* Estudante do curso de Letras na Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Bicho

* Por Angélica Almstadter

T
enho dentro de mim um bicho que me castiga,
Uma febre que arde e queima como urtiga.
Tenho um bicho que me rasga e sufoca,
Que me atormenta e provoca.
Por onde passeia esse bicho que me esgueira?
Na pele arranhada, na voz apertada ?
Onde me arranca gemidos esse maldito?
Que sabe o tamanho do meu grito.

Tenho cá dentro um bicho acuado,
Um bicho medonho e assustado;
Que cospe grunhidos,
Mancha minha carne de pruridos.
Onde guardo essa fera bestificada?
Que não sabe por onde ataca.
Tenho nos pulsos esse bicho violento,
Esse cão tinhoso, medroso,
Sangrando qual hemorragia.
Essa fera acuada que me rege;
Remói palavras e pare poesias,
Porque essa doce fera atrevida,
Tem da vida, louca fobia;
Se comporta como um santo herege,
Pra continuar enrustida,
Na minha verve doída...


* Poetisa

sábado, 29 de junho de 2013

Literário: Um blog que pensa

LINHA DO TEMPO: 7 anos, três meses e um dia de existência.

Leia nesta edição:

Editorial – Como e quando opinar?.

Coluna Direto do Arquivo – Fernando Mariz Masagão, crônica,“Patriotismo à brasileira”.

Coluna Clássicos – Leconte de Lisle, poema, “A morte dum leão”.

Coluna Porta Aberta – Urda Alice Klueger, trecho de livro,“Tempos felizes (4) – Animaizinhos na floresta”.

Coluna Porta Aberta – Clóvis Campêlo, crônica, “Um jogo de palavras”..

Coluna Porta Aberta – Paulo Reims, artigo “E as manifestações nas ruas? (2)”.

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Livros que recomendo:

“Balbúrdia Literária”José Paulo Lanyi – Contato: jplanyi@gmail.com
“A Passagem dos Cometas” Edir Araújo – Contato: edir-araujo@hotmail.com “Aprendizagem pelo Avesso” Quinita Ribeiro Sampaio – Contato: ponteseditores@ponteseditores.com.br
 “Cronos e Narciso” Pedro J. Bondaczuk – Contato: WWW.editorabarauna.com.br
“Lance Fatal” – Pedro J. Bondaczuk - Contato: WWW.editorabarauna.com.br


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Como e quando opinar?

Os seis primeiros meses deste ano de 2013 têm se revelado tensos, incertos, inseguros, com uma série de acontecimentos que podem, ou não, ter conseqüências futuras e até determinar novos rumos para alguns povos, se não para a humanidade. Assunto para ser comentado é que não falta. O que falta, isto sim, é tempo para a sua análise, para que se possa emitir opiniões sensatas, equilibradas e, sobretudo, responsáveis, que se baseiem exclusivamente em fatos e não em meras evidências, em aparências, em boatos, em fofocas, em diz-que-diz-ques e em situações ambíguas e obscuras que nos levem a conclusões equivocadas.

A tarefa do escritor é bem diversa da do jornalista. Sua visão dos acontecimentos e as conclusões que elas suscitam tendem a durar, não raro muito além da sua morte. Caso sejam corretas, consagradas pelas conseqüências que previu, pode ser considerado, até, como “gênio” pelas gerações futuras. Notem que afirmei que “pode” e não que “vai ser”. Por que? Porque corremos o risco de sermos completamente esquecidos e da nossa obra literária se perder por completo, sepultando, de vez, nossa memória, como se nunca tivéssemos existido e jamais produzido coisa alguma, quer no terreno concreto, quer (e principalmente) no instável e inseguro terreno das idéias.

Já as opiniões do jornalista podem (ou não podem) gerar efeitos imediatos. Todavia, uma semana depois (ou, quem sabe na tarde do mesmo dia em que seu texto foi estampado no jornal ou na revista) tende a ser esquecido até pelo mais atento dos seus leitores. Ele opina no calor dos acontecimentos, pois o veículo de que se utiliza prima por novidades, e sua probabilidade de equívoco é muitíssimo maior. Isso não quer dizer que o escritor, com todo o tempo do mundo para analisar ponto por ponto dos fatos antes de opinar não esteja sujeito a erro. Sempre estará.

Dependerá, para ter possibilidades mais amplas de acerto, do volume e exatidão de informações que conseguir colher, do seu preparo intelectual, da capacidade de observação e de análise, da sinceridade de propósito, da condição de se manter o mais neutro possível (pois neutralidade absoluta é mera ficção, é conto da carochinha) e vai por aí afora. E mesmo que seja excelente em tudo isso, não está e não estará nunca a salvo de errar, embora seja provável que erre muito menos do que o jornalista, por razões lógicas e até óbvias.    

Por exemplo, no início deste 2013, quem, em sã consciência, sequer cogitava da possibilidade do papa Bento XVI renunciar ao comando da Igreja Católica e se retirar para meditar sobre os rumos do catolicismo e do mundo? Por maior que fosse a capacidade de previsão de alguém, baseado ou em seu misticismo, ou em extrapolações de fatos, ou na intuição, ou em outro fator qualquer caso este exista, em janeiro deste ano quem sequer cogitou, mesmo que remotamente, dando asas a delirante fantasia, esta possibilidade? No entanto... aconteceu. E esta renúncia pode, ou não, trazer conseqüências para essa milenar denominação religiosa. Quais? Ainda estão no terreno instável das especulações.

Desde a manhã de 11 de fevereiro de 2013, quando a decisão de Bento XVI foi confirmada e que se materializou dezessete dias depois (em 28 de fevereiro, às 20 horas) jornalistas de todas as crenças e tendências ideológicas, das mais diversas partes do mundo, opinaram, opinaram e opinaram, tentando analisar as causas dessa atitude e extrapolar no que iriam (ou irão) resultar. Já os escritores... A imensa maioria ainda analisa esse fato, que já se tornou velhíssimo para os padrões jornalísticos, para decidir se vai ou não emitir opinião a propósito e de que forma será emitida: se em alentado ensaio, se na ficção colocando-a na boca de personagens ou se... sequer mencionará o assunto em nenhum de seus textos.

Citei esse caso meio que aleatoriamente, mas não é o único acontecimento dramático de 2013 que pode, ou não, gerar conseqüências para os envolvidos e até para o mundo. Poderia citar, por exemplo, a guerra civil na Síria. Ou as eleições presidenciais na Venezuela ou no Irã. Ou os protestos na Turquia. Ou, para trazer as coisas para mais perto de nós, a onda de manifestações que varre o Brasil, a imensa maioria das quais tem redundado em conflitos, em confrontos com a polícia, em vandalismo e em saques. Que conseqüências tudo isso trará? Jornalistas, diariamente, fazem suas extrapolações, com probabilidades variáveis de acerto. Já os escritores... Os mais sensatos e preocupados com a imagem (a própria e a do País) analisam atenta e cautelosamente as informações disponíveis e esperam,o fim dos protestos, para só então tentarem entender o que ocorreu (e aina está ocorrendo) e no que tudo isso deu ou pode dar.

Um amigo mais afoito, desses apaixonados que dizem tudo o que pensam, sem se deter na mais elementar análise antes de falar, movido, apenas, pelas chamas dos acontecimentos, fez, outro dia, uma observação que, a princípio, julguei tola (embora não lhe tivesse dito), mas sobre a qual estou refletindo (posto que ainda a considere pueril e despropositada). Disse que as pessoas erraram na interpretação da suposta profecia maia, de que o mundo iria acabar em 21 de dezembro de 2012. Para ele, o que esse povo pré-colombiano previu foi o fim de uma era e o início de outra. E que os acontecimentos destes dramáticos seis meses de 2013 seriam a prova disso.

Minha primeira reação foi a de dizer-lhe: “tolice!!!”. E de, na sequência, demonstrar-lhe a não procedência de sua infantil opinião. Reitero, não fiz nada disso. Calei-me e fiquei matutando com meus botões: “seria tolice mesmo? E se não for?”  Embora não tenha mudado em nada minha convicção a propósito, abri na mente um espaço para a saudável dúvida. O ceticismo, na medida certa, é manifestação de prudência. Afinal, como constatou o genial William Shakespeare, através de um de seu tantos personagens: “há mais mistérios entre o céu e a terra do que sonha nossa vã filosofia”. E não há?!!!  

Boa leitura.


O Editor

Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk.   

Patriotismo à brasileira

* Por Fernando Mariz Masagão


Hoje não acordei nublado, como vinha acontecendo nas últimas semanas. Hoje levantei otimista e patriota como a imensa maioria das pessoas. E isso porque hoje é o dia do jogo de estréia do Brasil na Copa do Mundo. É irresistível falar no assunto, pelo menos para mim que sou um viciado confesso no ópio comum do Gol. O país já está quase inteiro em estado de embriaguez coletiva. Bandeirinhas tremulam para fora dos carros, das casas e prédios, nos muros e nos postes. As ruas foram enfeitadas. Por todo lado só se vê a bandeira da Seleção Brasileira.

Sim, porque de acordo com uma amiga minha, o brasileiro pensa que a bandeira com a qual, de quatro em quatro anos, desafoga o peito oprimido é a bandeira da Seleção. De fato, é difícil identificar a flâmula verde e loura com qualquer outra coisa, mesmo com o país. Ela até me confessou que não entendia porque erguiam a bandeira do time do Pelé na frente de tudo quanto é prédio público. E é verdade. Se não, qual outra explicação se dá ao fenômeno de só sermos patriotas, neste grau de ufanismo dionisíaco, quadrienalmente? Segundo o catedrático de São Januário, o professor José Paulo Lanyi, isso se dá pelo fato de que só de quatro em quatro anos somos a potência inconteste.

E qual outro evento nos causa a mesma comoção? O carnaval? O 7 de setembro? A proclamação da República? O ano novo? Não. A resposta é óbvia. Só na Copa o brasileiro pode ser desavergonhadamente patriota, porque na Copa temos todos os motivos para tanto. Querer que esse sentimento aflore em qualquer oportunidade imbecil é querer que o brasileiro seja burro, e nós não somos.

Muito se fala na “baixa auto-estima” do brasileiro. Mas o brasileiro é na realidade um impiedoso autocrítico. E a sua “baixa auto-estima” não passa de vaidade exacerbada. Uma vaidade sombriamente podada pelas circunstâncias. É a dor inconsciente do ser e não ser. Isso nos indigna, mas não nos desperta. Seguimos ao sabor do vento e das piadas. E mesmo que finjamos não sentir, isso tudo nos espicaça. Toda vez que uma criança come lixo; toda vez que alguém morre sem socorro numa fila de hospital; enfim, toda vez que fingimos não ver o que 500 anos de ganância e corrupção estúpidas fizeram conosco, a frustração cresce silenciosa e maligna como um tumor. Por isso dizermos que temos vergonha de ser brasileiros. Estamos supurando um sentimento de amor ferido, de vaidade machucada, de decepção. É a face oposta da medalha. A Copa prova isso.

Basta vermos nossas melhores características triunfarem para comungarmos uma alegria por nosso povo e nossa cultura. Muitos exemplos no passado poderiam servir como um fator de união tão poderoso para o nosso país quanto o futebol (e muitos ainda por vir poderão também fazê-lo). Mas para isso teremos que acordar da ressaca em que vivemos e colocar a mesma paixão e seriedade que devotamos ao futebol na construção de nossas vidas. Está na hora do brasileiro se embriagar do Brasil. Me desculpem o patriotismo, ou o patri-otimismo (não resisto a trocadilhos). Deve ser efeito do ópio.

*Fernando Mariz Masagão é músico, dramaturgo, poeta e colaborador de publicações online sobre arte, com crônicas e críticas musicais. Guitarrista e vocalista de bandas de rock'n'roll, tem formação clássica vigorosa, em cursos de regência sinfônica, apreciação musical e instrumentação.