Resgate
e consagração
Os
recursos proporcionados pelo avanço da Tecnologia da Informação,
entre os quais destaco o surgimento, há
já algum tempo, do Ipad
(e de seus similares, genericamente batizados de “tabletes”)
são poderosa ferramenta para a divulgação, entre tantas outras
coisas, da literatura. Vem proporcionando, por exemplo, o resgate de
vários bons escritores, que estavam um tanto esquecidos (em alguns
casos, completamente), ao mesmo tempo que consagram os que já são
tidos e havidos como clássicos, cuja obra, finalmente (e
literalmente) se universaliza.
Essa
observação vem a propósito de notícia que li, se
não me engano, em 2011,
em vários sites da internet dedicados ao noticiário cotidiano,
dando conta de que o célebre poema de T. S. Eliot, “The waste
land” (“A terra devastada”, em português), composto (pasmem)
em 1922, serviu de base para um
aplicativo que se transformou, em um piscar de olhos, em campeão de
vendas no Reino Unido. Nada mais justo! Caso haja herdeiros do
escritor norte-americano – que abriu mão de sua cidadania e se
naturalizou inglês – estes, certamente, ganharam na loteria.
Suponho, no entanto, que a obra desse notável poeta, ganhador do
Prêmio Nobel de Literatura, já tenha caído no domínio público.
Mas não tenho certeza.
A
Apple, que criou o aplicativo para Ipad, certamente lucrou muito e é
justo que tenha lucrado. O público leitor, apreciador de boa
literatura, também saiu ganhando. Tanto que, subitamente,
transformou o poema apresentado dessa forma, tão prática e tão
moderna, em campeão de vendas. A procura, portanto, foi intensa e
certamente surpreendente, se levarmos em conta que se trata de
poesia, não tão valorizada como o romance, por exemplo. E a um
custo, de acordo com a notícia, bastante razoável e atrativo: de
US$ 13,99. Nada mau.
É
certo que quando se trata de criação, há que se considerar (e com
toda a justiça) a questão dos direitos autorais, nem sempre
respeitados. Aliás, a pirataria causa prejuízos enormes aos
verdadeiros criadores, que deveriam ser os únicos a usufruir dos
frutos da sua inteligência e sensibilidade, mas que, no final das
contas, são os que menos ganham. Isso, quando ganham alguma coisa.
Essa usurpação ocorre notadamente no ramo da indústria fonográfica
e na atividade de produção de programas de computadores.
Mesmo
tratando-se de crime, combatido a ferro e fogo pelas autoridades, a
pirataria continua mais próspera e ativa do que nunca, não raro com
a conivência e até a cumplicidade do público consumidor que, ao
adquirir um CD, por exemplo, pouco lhe importa a procedência, ou
mesmo qualidade técnica do produto, mas leva em consideração,
apenas, o preço. Sabe que o barato pode sair muito caro, mas opta
por arriscar-se e com isso só estimula a indústria da fraude e da
cópia irresponsável, feita quase sem custo, desse produto
preciosíssimo que é fruto do talento de gente criativa e não raro
genial.
O
aplicativo do célebre poema de T. S. Eliot foi desenvolvido,
conforme li no site de “O Globo”, pela Touch Press, de Londres,
que se especializou na produção de conteúdos para Ipad (que bom,
tomara que milhares de outras empresas se especializem nesse tipo de
textos também, para o bem e o conforto dos detentores dessa
potencialmente tão útil e genial engenhoca). Mas a produção do
poeta não foi pirateada. A empresa responsável pela criação desse
aplicativo teve o cuidado de fazer parceria com a Faber & Faber,
a editora em que T. S. Eliot trabalhou e que é detentora dos
direitos da sua obra. É assim que se deve proceder sempre.
E
os escritores brasileiros, o que podem esperar nesse aspecto? Podem
nutrir a expectativa de que suas obras também virão a ser adaptadas
para essa plataforma e chegarão, dessa maneira, a um público cada
vez mais amplo e qualificado? Não tenho dúvidas que sim. Claro,
depois que forem equacionadas as questões referentes a direitos
autorais, entre outras.
Como
escritor (posto que ainda dos “menores”, com pouquíssima
projeção, por causa da pouca exposição), tenho, claro, a
expectativa de um dia ver meus livros adaptados para o Ipad. Afinal,
sonhar não paga imposto (ainda). Talvez
até já tenham sido e eu não saiba. Não sou muito bem informado no
que se refere às novas tecnologias de informação. Já
caminhei tantos passos nesse acidentado e íngreme caminho da
literatura, que ouso nutrir fantasias a respeito. É certo que, se
isso ocorrer (ou que tenha
ocorrido), não se tratará
(ou não se tratou)
nem resgate de uma obra esquecida e nem de consagração de um
literato já vitorioso e que não tenha que provar mais nada para
ninguém. Tratar-se-á de revelação. Ou de ampliação do que a
internet já vem possibilitando, através de blogs e de sites que já
divulgam minha volumosa e razoavelmente boa (modéstia a parte)
produção literária.
Para
não deixar vocês com “água na boca”, tomo a liberdade de
reproduzir estes poucos versos, do extensíssimo poema “A terra
desolada” – que é uma ode à crise existencial que havia se
instalado na Europa ao término da (e em consequência
dela) Primeira Guerra Mundial. A tradução é de Ivan Junqueira, que
traduziu, aliás, toda a obra de Eliot no Brasil.
“Abril
é o mais cruel dos meses, germina
Lilás
e da terra morta, mistura
Memória
e desejo, aviva
Agônicas
raízes com a chuva da primavera.
O
inverno nos agasalhava, envolvendo
A
terra em neve deslembrada, nutrindo
Com
secos tubérculos o que ainda restava de vida.
O
verão; nos surpreendeu, caindo do Sttarnbergersee
Com
um aguaceiro. Paramos junto aos pórticos
E
ao sol caminhamos pelas aleias
de Hofgarten (...)”
Boa
leitura!
O
Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
Eu não tenho iPad, mas também acredito ser um excelente veículo para divulgar Literatura.
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