Literatura mal-remunerada
* Por Pedro J. Bondaczuk
A
Literatura, embora uma das mais complexas, se não a mais complexa
das artes, salvo exceções, é a que pior remunera seus artistas.
Ninguém adquire em leilão, por exemplo, por dezenas de milhões de
dólares, um livro, mesmo que se trate de raridade das raridades,
como ocorreu, por exemplo, com o quadro “Os girassóis”, de
Vincent Van Gogh, há alguns anos.
É
verdade que a valorização da obra desse pintor se deu muitíssimo
depois de sua morte, ocorrida em um hospício. Em vida, vendeu apenas
duas de suas telas, e ambas para o seu irmão Theo.
Viveu
e morreu miseravelmente, como a imensa maioria dos artistas. Mas,
pelo menos, as pinturas que legou à posteridade adquiriram valor.
Tamanho, que se constituem, atualmente, nos mais rentáveis
investimentos financeiros que existem. Estão em mãos não de
entendidos ou apreciadores de artes, mas de grandes investidores, que
não entendem lhufas de pintura. Com livros, porém... Nunca
aconteceu nada sequer parecido.
São
raros, no mundo todo, os fenômenos editoriais, os campeoníssimos de
venda. No Brasil, por exemplo, são poucos os escritores – tão
poucos que dá para serem contados nos dedos e, se bobear, de uma só
mão – que conseguem viver só de literatura. Vêm-me à memória,
de chofre, sem precisar fazer pesquisa, apenas os nomes de Paulo
Coelho e Jorge Amado. No mais... O escritor tem que ter algum
emprego, alguma outra atividade, se pretender sobreviver com
decência.
Muitos
vão parar nas redações de jornais (ou emergem delas para a
Literatura). Outros... Machado de Assis foi servidor público, assim
como João Cruz e Souza e Carlos Drummond de Andrade. Guimarães Rosa
foi médico e Vinícius de Moraes diplomata. E vai por aí afora.
Quem quiser, portanto, viver exclusivamente de literatura – salvo
exceções, claro – e não somente no Brasil, não conseguirá
pagar suas contas e terá vida miserabilíssima.
Honoré
Balzac, por exemplo, vivia atolado em dívidas, perseguido por
credores. Por isso, escrevia tanto. Precisava fazer dinheiro a todo o
custo e, em diversas ocasiões, teve os móveis de casa penhorados
para o pagamento de dívidas. O mesmo ocorria com Fedor Dostoievski,
jogador inveterado, que perdia, numa única noite, nos cassinos de
Montecarlo, o fruto do trabalho de anos. E que trabalho! Que talento!
Que genialidade!
Conta-se
que Camilo Castelo Branco escreveu dois romances inteiros em apenas
48 horas, pela necessidade, urgentíssima, de fazer dinheiro e saldar
dívidas com os credores, que o assediavam a todo o momento.
A
menos que você seja o gênio dos gênios, caríssimo aspirante a
escritor, e tenha a sorte fenomenal de cair, simultaneamente, no
gosto dos editores, críticos, imprensa e, principalmente do público,
e de se tornar, dessa forma, best-seller, ganhador dos prêmios
Pulitzer, Cervantes, Camões, Book Prize, Goncourt e, principalmente
do Nobel, trate de começar já a fazer o seu pé de meia, para não
se ver em sérias encrencas mais adiante.
A
Literatura poderá trazer-lhe muitas satisfações pessoais (ou não).
Poderá incensar a sua vaidade, inflar seu ego e catapultar sua
autoestima. Mas se estiver contando que ficará rico, apenas em
decorrência do seu talento.... Hummmm!!! Esqueça!
Desde
que você não fique vaidoso em excesso (e tudo o que é demais não
termina bem), é lícito que se delicie com elogios que entenda
sinceros e se satisfaça com palavras de louvor, principalmente
quando estas vierem de pessoas que você não conheça e que, por
isso, não o estejam elogiando à espera de alguma vantagem. Se
estiverem, contudo, bote esses hipócritas para correr. Não se
tratará de elogio, mas de lisonja.
O
escritor austríaco Karl Kraus afirmou, certa feita (e concordo com
ele): “Os artistas têm o direito de serem modestos e o dever de
serem vaidosos”. Se não forem, estarão negando, em público, o
próprio valor. Se você quiser o reconhecimento alheio pelos seus
méritos, seja o primeiro a reconhecê-los. Se os tiver, logicamente,
e se estiver convicto de sua existência.
*
Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de
Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do
Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções,
foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no
Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios
políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance
Fatal” (contos), “Cronos & Narciso” (crônicas),
“Antologia” – maio de 1991 a maio de 1996. Publicações da
Academia Campinense de Letras nº 49 (edição comemorativa do 40º
aniversário), página 74 e “Antologia” – maio de 1996 a maio
de 2001. Publicações da Academia Campinense de Letras nº 53,
página 54. Blog “O Escrevinhador” –
http://pedrobondaczuk.blogspot.com. Twitter:@bondaczuk
A eterna dificuldade em saber dosar a vaidade. Sem nenhuma, o amor próprio costuma sumir, muita, ninguém aguenta ficar perto.
ResponderExcluir