O besouro e a vidraça
Virou
moda, em tempos recentes, prever o fim do mundo e, por consequência,
da vida na Terra. Houve quem, baseado em suposições, “profecias”,
ou pseudociência, até tenha determinado, com exatidão absurda, a
data em que isso iria acontecer: 21 de dezembro de 2012. Claro, não
aconteceu nada do previsto nessa data e nem depois. Uns argumentavam
que se basearam no calendário da civilização maia, tido e havido
como infalível, que preveria uma hecatombe como nunca vista e,
exatamente, nesse dia, mês e ano, para fazer suas apocalípticas
previsões. Faltiu, apenas, determinar a hora exata disso, com os
respectivos minutos e segundos. Grandes charlatães, é o que esses
supostos profetas são.
Outros
tomaram por base as tais profecias de Nostradamus, que podem ser
interpretadas de mil maneiras diferentes, ao gosto do freguês. Houve
quem tenha visto num fenômeno astronômico, que se repete, apenas, a
cada 26 mil anos, a fonte da nossa destruição. Trata-se do
alinhamento do sol e de todos os planetas do nosso sistema com o
centro da nossa galáxia, a Via Láctea. E ele estava previsto para
ocorrer quando? Isso mesmo, em 21 de dezembro de 2012.
Outra
corrente avisou que as piores tempestades solares de que se tem
notícia iria ocorrer nessa ocasião. E que, súbita e mortífera
rajada de ventos solares atingiria a Terra, evaporando, em segundos,
os mares, derretendo as rochas, e fazendo 7,6 bilhões de
churrasquinhos humanos. Bah! Quanta bobagem!!!
Era
possível tudo isso acontecer, isolada ou simultaneamente? Sim! Era
provável, porém que ocorresse? Creio que não! Porém... nunca se
sabe. O que nós, humanos, sabemos de fato sobre o universo e suas
leis? Ouso dizer que nada. Temos um conjunto de teorias, passivas de
mudanças face novas descobertas, que tolamente elegemos por dogmas.
Um
fato, ocorrido há pouco, em meu gabinete de trabalho, ilustra a
caráter minha postura acerca dos nossos supostos conhecimentos. Como
estivesse ventando e para evitar que o vento espalhasse meus papéis
na escrivaninha, fechei a vidraça do recinto. O vidro foi
meticulosamente limpo pela empregada, há minutos, e ficou tão
transparente, que é como se nem existisse. Pontos para ela.
Subitamente,
um besouro voador (que o vulgo chama de “joaninha”), que havia
entrado pela janela minutos antes, resolveu sair. Investiu contra a
vidraça e o resultado foi o esperado. Bateu contra ela e foi ao
chão. Tomou fôlego e tornou a tentar sair. Em vão! O resultado foi
o mesmíssimo. Na quarta tentativa do bichinho, resolvi dar-lhe uma
ajudazinha. Abri a vidraça e ele, finalmente, pôde voar livre para
o exterior (certamente um tanto contundido pelos sucessivos choques
contra o vidro).
Somos,
no que diz respeito à compreensão do que nos cerca, como esse
frágil besourinho. Para nós, não há vidro algum barrando nosso
voo em busca de conhecimento. Ele, porém, existe, é concreto e
sucessivamente nos roja ao solo da realidade. O bichinho não
compreendia o que dificultava sua saída, tanto que tentou, e tentou
e tentou investir contra o obstáculo diversas vezes, em vão. Nós,
também, não compreendemos a vastidão do universo. E o que fazemos?
Fantasiamos, a pretexto de fazer “ciência”.
Um
dos livros mais impressionantes que já li, sobre os perigos que
ameaçam a Terra e, por consequência, a vida, tem o sugestivo título
de “Escolha a catástrofe”. Foi escrito pelo cientista e escritor
de ficção científica Isaac Asimov. No Brasil, a obra teve várias
edições, de editoras diferentes, embora não tenha se constituído
em nenhum best-seller. A que li é a da Editora Melhoramentos, com
tradução de Amarílis Miazzi Pereira Lima. O livro tem 334 páginas
e pode fornecer uma infinidade de argumentos aos catastrofistas de
carteirinha (embora estes até os dispensem para suas neuróticas
elucubrações).
Apesar
do título sombrio do livro, Isaac Asimov mostra otimismo quanto à
sobrevivência, não somente a humana, mas da vida, como a
conhecemos. E não só isso, como até derruba alguns mitos a
propósito. Por se tratar de um cientista, sua análise, meticulosa,
é baseada, rigorosamente, em dados científicos, o que não comporta
sequer contestações.
Isaac
Asimov, em seu livro, divide em cinco graus os eventos catastróficos
que ameaçam a vida na Terra. Nas de primeira, analisa a hipótese do
fim do universo, tal como o conhecemos hoje. Trata-se de
possibilidade remota, posto que não impossível. Se (ou quando)
ocorrer, terão passado bilhões, quiçá trilhões de gerações,
caso os homens não se destruam antes.
Nesta
parte do livro, Asimov aborda algumas das mudanças no universo que,
se ocorrerem, tornarão inviável qualquer possibilidade de existir
algum tipo de vida. Por consequência, esta se extinguiria, lógico,
também aqui na Terra.
A
catástrofe de 2º grau é mais particular, restrita às nossas
proximidades. Também não afetaria milhões de gerações do nosso
Planeta. São os desastres localizados, aqueles em que o universo
permaneceria intacto, tal como é hoje, mas o Sol seria destruído,
ou mudaria suas características, de sorte a tornar inviável a
existência de vida na Terra.
As
catástrofes de 3º grau são mais plausíveis e, portanto, possíveis
de ocorrer a qualquer momento, até mesmo sem aviso. São as que
afetam, somente, o nosso Planeta, com o Sistema Solar, a Via Láctea
e o universo permanecendo intactos no seu curso.
Na
catástrofe de 4º grau, somente algumas espécies que vivem na Terra
e, principalmente, a humana, seriam extintas. As demais talvez até
sofram mutações, mas permaneceriam quase intactas (quando não
intactas). São inúmeras as possibilidades que podem levar a
humanidade à extinção, quer por sua própria ação, quer por
consequência de agentes (ou de condições) externas.
Finalmente,
nas catástrofes de 5º grau, Asimov levanta a hipótese de que
nenhum tipo de vida, nem mesmo a humana, se extinga, mas ocorra o
colapso da civilização, tal como a conhecemos. Ou seja, que por
alguma razão qualquer, a humanidade sofra um imenso retrocesso e
retorne à condição de fera bronca, com o império da lei da selva,
do “cada um por si”.
Embora
improvável, essa hipótese não é descartável. Pode vir a ocorrer,
dependendo das circunstâncias. Se você, caro leitor, é pessimista
empedernido, se não acredita na grandeza do espírito humano e
entende que o melhor é que tudo acabe mesmo, para que não haja mais
tanto sofrimento e angústia, escolha a catástrofe da sua
preferência.
Mas
o que nos ameaça, de fato, e com iminência, não é nada disso. É
um buraco negro. Não o que, supostamente, existe no centro da Via
Láctea e que, se de fato existir, no espaço de alguns bilhões de
anos, haverá de sugar, inexoravelmente, todos os bilhões de
estrelas da galáxia (entre elas o sol e seu sistema de planetas, a
Terra no meio), enfim, toda a matéria para o seu interior, não
deixando de fora sequer a luz.
Outro
vórtice, muito mais próximo de nós e, portanto, mais iminente,
paira por sobre nossas cabeças, como a mítica Espada de Damócles.
É o que o psiquiatra José Ângelo Gaiarsa alertou que nos ameaça,
de forma crescente, ao escrever, num dos seus tantos e lúcidos
textos: “Nós estamos caminhando para um buraco negro: não sabemos
amar, não nos ouvimos e estamos de cabeça para baixo em nossos
valores”. Esse sim é o perigo com o qual devemos nos preocupar. Os
demais…
Boa
leitura!
O
Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
Quem viver verá. Em caso contrário, já estará morto mesmo...
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