Sem
backup
*
Por Marcelo Sguassábia
É
consenso no mundo da segurança da informação o fato de que as
empresas produtoras de antivírus contratam hackers para criar vírus
e posteriormente suas vacinas, perpetuando o ciclo de ameaça e
proteção.
O
vírus é criado, espalhado, a imprensa se encarrega de fazer o
alarde mundial e, enquanto isso, a vacina já está pronta para
integrar o pacote da versão 22.4 do
mega-ultra-master-magic-killer-fast-ultimate-power-virus-exterminator.
O mais seguro de todos os tempos, até que chegue a hora de se criar
um outro vírus ainda mais detonador e em seguida seu antídoto
invencível, num ciclo criminoso que torna refém toda a humanidade.
Mas,
dessa vez, a coisa não aconteceu como deveria.
II
– Pois
é, o que a gente mais temia se confirmou. Óbito, há 20 minutos.
– Parece
humor negro ou ironia do destino, mas ele contraiu um vírus raro.
Ainda teve a sorte de durar três meses, o médico garantia que não
passava de dois. Doença degenerativa fulminante, sem remédio nem
vacina.
– É,
letalidade máxima. Acabou com ele e com uma multinacional de 50
bilhões de dólares numa tacada só! É o que se pode chamar de alto
poder de destruição.
– Mas
não é possível que não tenha deixado nada escrito na mesa dele.
Alguma anotação em algum canto, escondida na gaveta, quem sabe
salva em algum insuspeito arquivinho de wordpad?
– Nada
aparente, já vasculhamos.
– Sei
lá, qualquer coisa que seja uma pista de como ele estava concebendo
esse antivírus. Virem tudo de cabeça pra baixo, quebrem todas as
senhas do computador que ele usava, usem descriptografia, tragam
hackers de fora do país se for o caso… ele não comentou nada com
vocês? Nadinha?
– Caladão
do jeito que era? Pois sim… Uma vez ele me disse que guardava tudo
na cachola, por medida de segurança. O cara tinha um HD de 10
terabytes na cabeça.
– Amiguinhos,
eu não quero saber o que fazer e de que jeito precisa ser feito, só
quero que mergulhem nessa caixa de gordura e resolvam a encrenca.
Dinheiro não vai ser problema! O vírus que esse rapaz criou está
derrubando sistema atrás de sistema, o nível de infecção é de
quarenta a cinquenta novas corporações por minuto. Se não
disponibilizarmos a vacina nos dois ou três próximos dias,
estaremos completamente desmoralizados.
– Tá,
e a gente vai fazer o quê? Chamar o cara à força numa sessão
espírita? A porcaria do vírus é criação dele, a chance de
descobrirmos algo de prático em tempo hábil é zero. Mesmo se a
gente conseguisse juntar todos os hackers do mundo, ainda assim a
velocidade de infecção vai travar o planeta antes que se chegue a
qualquer resultado concreto.
– Então,
eu sei que não é o momento apropriado pra ficar falando isso, mas…
caramba, quantas vezes eu já disse nas reuniões de Conselho –
esses malucos precisam trabalhar em dupla, um fica sendo o backup do
outro. Se dá uma caca, tem como recuperar pois há dois
profissionais envolvidos no programa.
– Índice
Nasdaq de hoje. Querem ouvir?
– Diga
de uma vez, quanto perdemos?
– Até
agora, 16h30, -7,2%. Debandada geral de investidores mundo afora.
Viramos mico da noite para o dia.
– E
o técnico canadense que chegou ontem?
– Ia
falar dele agora. Desinfetamos tudo antes que ele começasse a
trabalhar, mas a lei de Murphy funcionou de novo… se infectou com o
vírus biológico.
– Sei,
mas como ele está agora?
– Quadro
de febre, vômito e confusão mental. A coisa começou assim com o
nosso finado colega. É o início do fim, daqui em diante só vai
definhar.
– Tentou
chamar um médico?
– Todos
os hospitais estão com sistemas viralizados, pane generalizada até
nos serviços de emergência. Mesmo as conexões analógicas de
telefonia parecem estar comprometidas.
– Bem-vindos
ao apocalipse, meninos. Orem com fervor. Agora, só confiando na
volta de Jesus.
*
Marcelo
Sguassábia é redator publicitário. Blogs:
WWW.consoantesreticentes.blogspot.com (Crônicas e Contos) e
WWW.letraeme.blogspot.com (portfólio).
Dizem que outros setores da civilização também funcionam assim.
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