Menos
cor por favor
*
Por Marcelo Sguassábia
Luz
ultravioleta revela como eram de verdade as estátuas e construções
da Antiguidade Clássica – originalmente pintadas com cores
berrantes.
– Olha,
seu Augusto, vou falar uma coisa pro senhor… eu posso até estar
jogando contra o patrimônio, mas acho que não vai ficar nada bom
colocar cor na sua estátua. Eu bem que podia ficar quieto, fazer meu
serviço de pintor, pegar meu dinheirinho e ir embora pra casa. Mas,
sendo o senhor Imperador de Roma, me sinto na obrigação de alertar,
compreende? É quase um dever cívico.
– Ninguém
pediu sua opinião. Limite-se a cumprir minhas ordens!
– E
digo mais, com todo respeito que lhe devo: o senhor vai ficar
parecendo aquelas imagens que tem pra vender em Casa do Norte ou loja
de macumba, sabe como é? Escuta o que estou lhe falando, seu
Augusto… o resultado vai ficar sinistro!
– Mas
deixar assim, só no mármore? Nem pensar. Fico muito pálido, sem
expressão. Tenha em mente, meu súdito, que minha intenção é
ganhar a simpatia e admiração do povo romano. Sem cor na estátua,
ficarei parecendo um cadáver, uma representação inexpressiva.
– Não
sei não, Majestade. Parece mais clássico assim. Além do que, se
pintar por cima, tem que ter manutenção periódica para evitar a
descoloração provocada pelo sol e pela chuva. Dois ou três meses
no tempo e fica tudinho desbotado, vai por mim.
– Poupe
seu latim. Não vou mudar de ideia.
– O
mesmo vale para os templos. Convenhamos que é bem jacu esse colorido
todo né, Gustão? Para o meu gosto, deixar no mármore ficaria chic
e atemporal, imune a tendências e estilos. O senhor entende meu
ponto de vista? Eu estou pensando lá na frente, daqui a dois mil
anos. Imagine o que vão pensar no futuro quando descobrirem o mau
gosto que a gente tem hoje?! O seu bom e glorioso nome corre o sério
risco de ficar manchado.
– Chega!
– Mas
se o senhor insiste em pintar, sugiro tinta branca, só para proteger
a pedra. Seu Augusto, vou dar um exemplo para o senhor compreender
melhor o que eu digo: imagina um cemitério com as estátuas todas
coloridas… ia parecer concentração de escola de samba. Não orna,
ficaria uma tremenda parafernália.
– Guardas!
Guardas!!!
– Tá
bom, Imperador. Vou fazer um teste num pedacinho da sua estátua,
para o senhor comparar com o original só no mármore. Vai ficar mais
fácil entender na prática o que estou dizendo.
– Vá
lá… faça logo esse teste, então.
– Alea
jacta est!
*
Marcelo
Sguassábia é redator publicitário. Blogs:
WWW.consoantesreticentes.blogspot.com (Crônicas e Contos) e
WWW.letraeme.blogspot.com (portfólio).
A cada dia saem engraçados coelhos da sua cartola sem fundo. Para fazer uma graça fundada e com fundos.Palmas para as suas mais estranhas ideias.
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