Boneca
de pano e minha opinião sobre
literatura.
*
Por Edir Araújo
Sou
um autor trágico, haja vista meu primeiro livro publicado há quatro
anos, "A Passagem dos Cometas". "Boneca de Pano"
segue a mesma linha, drama trágico, cujo enredo me obrigou a
incorporar uma mulher, "encarnar", vamos dizer assim, numa
mulher. Penetrar no universo feminino. Através de Samantha eu faço
uma soturna ilustração de todo sacrifício e amargura por que
passam as vítimas de estupro.
Uso
uma estratégia, comum em meus romances, inserindo anedotas, algumas
picantes, cuja intenção é abrir uma breve lacuna para distrair o
leitor. Também chamado "digressão", cujo fim é desviar
do assunto tratado. Recurso literário muito utilizado por Machado de
Assis para detalhar, ilustrar ou criticar um assunto. Em "Boneca
de Pano" é uma quebra sutil, com a intenção de desanuviar a
aura pesada que paira sobre a leitura. Sua intenção é atenuar o
ranço de morbidez que predomina seu texto ao tratar de um tema tão
impactante como é o estupro e a pedofilia, causando nos leitores um
choque emocional e moral. Um livro que vai quebrar a sua rotina de
leitura.
O
tema é universal, instigante e sempre atualíssimo. Neste livro o
autor teve que "incorporar" uma mulher: Samantha. Penetrar
no universo feminino. Destarte, foi uma experiência muito
importante. Poucos autores têm essa capacidade. Este é o meu quarto
livro e essa qualidade torna o livro "Boneca de Pano"
realmente especial. Um livro de extremos, sensações extremas, que
se manifestam intensamente. Tudo é excessivo, ardente, forte,
profundo. Atingindo todas as dimensões do espírito humano.
Palavras, setas disparadas em várias direções, mapeando sem meio
termo todos os extremos da dor, da solidão, do sexo, do vício, da
crueldade, da sordidez, da decadência moral, da indignidade humana,
etc. Uma incansável busca pelo tempo, perdido, roubado, e que chega
tardiamente, para consolar o coração daquela inocente criatura que
foi lançada ao poço de podridão, cuja superação nos causa
perplexidade, profundo respeito e admiração.
Estou
ciente que meu livro “Boneca de Pano” pode causar certo espanto,
e até mesmo escandalizar. Um livro que, pela verossimilhança, pode
também causar certo mal estar. Um leitor, após ler “Boneca de
Pano” me disse que tenho um perfil perverso, um comportamento
libertino, ou de um psicopata, a julgar pelo teor do texto, cruel,
depravado e promíscuo. Diante disso concluí que o conceito de
sexualidade hoje não parece muito distante do perpetrado por Marquês
de Sade em seus romances libertinos há mais de 200 anos. E isso é
realmente incrível.
Acho
importante salientar que “Boneca de Pano” não é uma literatura
“de consumo”. Independe da aceitação do público. É
direcionada a um público específico. Não é uma literatura com
foco exclusivamente no mercado, que segue fórmulas. Na minha
concepção, arte é tudo aquilo que desperta emoção, mesmo que
cause incômodo ou desconforto. Acho que o autor independente, sem
vínculos com editoras (como eu) é notadamente rebelde, “do
contra”, não segue regras preestabelecidas, seu lema é quebrar as
regras e paradigmas. Existe muita coisa mal escrita por aí, muitos
livros, assim circulando, mas não deixa de ser literatura.
Sou
muito seletivo quanto aos livros que leio, fujo de livros meramente
comercializáveis, como Paulo Coelho, por exemplo, isto é literatura
de consumo, mas ele está pouco se lixando pra isso, ele é bem
assessorado, o negócio é vender, e muito.
Não escrevo para
vender, talvez para me tornar um pouco popular, talvez reconhecido,
nem que seja num círculo restrito. Meus livros são para um público
seleto.
Alan
Poe, Clarice Lispector, e outros, não escreviam preocupados em
vender, mas com a primazia que redunda nos grandes clássicos.
Não
almejo que meus livros caiam nas graças do grande público. “50
tons de cinza” é literatura? Sim, claro. Só que eu nunca li.
Nunca tive interesse em ler. O que li de sinopses sobre o livro já
me deu uma bagagem enorme, abrangente, a respeito do enredo. Isso é
alta literatura? Baixa literatura? Não importa. É vendável, isso
importa. E como vendeu e vende até hoje.
Enfim,
acho que para vender vale tudo, principalmente apelar para os
requintes do mau gosto. Desde que agrade público e crítica, e
principalmente as editoras.
Sigo
espalhando meus livros por aí afora. Quem sabe caiam nas mãos de
alguém que se identifique com o texto, que aprecie de verdade, que
valorize.
*
Edir Araujo é poeta e escritor, autor dos livros A PASSAGEM DOS
COMETAS, GRITOS E GEMIDOS e
BONECA DE PANO.
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