Nosso
Português Brasileiro
*
Por Mara Narciso
Assim
como não bate o carro quem não dirige, não erra o Português quem
não escreve. Poucos redigem uma página inteira sem erros, sejam
gramaticais, sejam ortográficos. Outros se confundem na lógica, nos
conceitos, ou no uso de palavras, algumas vezes inexatas, que faladas
soam mal, e por escrito deixam patente o engano.
Todos
os aspectos da linguagem escrita são desafiadores. Passar a vida
lendo, observando, detalhando, consultando o dicionário, reduz os
erros, mas não os abolem. E quanto mais a pessoa escreve, mais
exigente se torna, mais enganos vê que cometeu, especialmente depois
do texto publicado, e, principalmente anos depois. São
indispensáveis os corretores, revisores, editores. Para meu colega
de jornalismo Girleno Alencar, “não existe texto perfeito”. João
Guimarães Rosa, numa entrevista, relatou ler um texto cem vezes
antes de considerá-lo pronto. Então, o que dizer dos simples
escritores?
A
prática ajuda, enquanto a pressa destrói. Quem se arvora em sua
sapiência, também apresentará erros. Recuar e aceitar críticas,
não faz errar menos. O erro público machuca e abala o amor-próprio.
E a pergunta: como não vi isso, lendo tantas vezes? Conferir a
informação é indispensável. Rever a coerência do texto, e anotar
se não há discordância de ideias, ainda que sutil. Observar se o
pensamento saiu completo ou se ficou faltando alguma coisa na frase.
Mudanças de última hora, sem os devidos critérios e revisões são
caminhos curtos para o erro, especialmente de concordância.
Cometer
um equívoco na redação não é banal. Dói fundo a visão de
um erro grosseiro, que poderia ter sido evitado, caso a atenção
fosse maior. O desconhecimento é a principal causa da escrita
errada, dos significados equivocados, das palavras mal colocadas, da
pontuação inadequada. Um texto passável pode receber nota ruim
dada por um revisor exigente, que chega rabiscando tudo, com grifo
amarelo, trocando palavras, questionando conceitos, especialmente se
as regras da ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas não
forem seguidas num trabalho acadêmico. Liberalidades podem ser
tomadas como estilo, mas os excessos são desacertos puros e simples.
Na
dúvida da conjugação de um verbo, troque de verbo, se não sabe
como escrever a palavra, abandone-a. Sem contar os inúmeros acordos
ortográficos. O mais recente entrou em vigor em 1º de janeiro de
2009, necessário para formalizar e unificar a Língua Portuguesa
falada em Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique,
Timor-Leste, Portugal e São Tomé e Príncipe. Há lógica, porém,
certos detalhes sugerem que nem mesmo quem participou das decisões
sabe por que assim o fez. As exceções são mais amplas que as
regras, e há casos em que nem mesmo há regra. Em relação às
normas para o uso e desuso do hífen, só mesmo decorando.
Quem
escreve com o coração e quer acertar, relê muitas vezes e troca
vocábulos a cada leitura. Escrever bem é cortar palavras, e manuais
de redação, ainda que direcionem o estilo e até os termos, fazem o
veículo de comunicação linear, como se tivesse sido escrito por
uma só pessoa, e sua leitura fica fluida. Houve um tempo em que
havia uma revista, de publicação semanal, que era informativa e
agradável. No entanto, tornou-se um panfleto, e, quando engessou o
pensamento dos jornalistas, deixou de ser interessante para mentes
indomadas.
Revisar
de maneira minuciosa, deixar o texto dormir e relê-lo no dia
seguinte tornam as coisas mais claras. Uma leitura sem compromisso,
feita por alguém com bons conhecimentos gerais, pode ser crucial
para encontrar falhas.
Português
é uma língua difícil, complicada, quase impossível, haja vista a
dificuldade de se falar corretamente em público de maneira
improvisada. Algumas matérias jornalísticas mostram pessoas com o
vocabulário restrito. Capas de jornais dão vexame em certas
chamadas. Olavo Bilac imortalizou seu verso dizendo sobre a “Língua
Portuguesa”: “Última flor do Lácio, inculta e bela”, se
referindo ao Português do Lácio, região central da Itália, onde
soldados falavam algo derivado do Latim vulgar. Uma língua viva,
como as demais, que deixa os brasileiros perdidos na norma culta,
quando a intenção é redigir certo.
*
Médica endocrinologista, jornalista profissional, membro da Academia
Feminina de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico, ambos de
Montes Claros e autora do livro “Segurando a Hiperatividade”
Nenhum comentário:
Postar um comentário