O
amor nas mãos de Pandora
*
Por Jaime Vaz Brasil
E
se nas mãos de Pandora
dormissem os conteúdos
dormissem os conteúdos
que
da caixa se soltaram
e nos prenderam a tudo
e nos prenderam a tudo
tudo
o que possa ser visto,
sentido ou imaginado
sentido ou imaginado
na
cor dos males do mundo,
na corrente dos pecados?
na corrente dos pecados?
O
que será de todos
nós, pecadores, agora
nós, pecadores, agora
e
na hora da colheita
das flores do ir embora
das flores do ir embora
se
no colo de outra virgem
nascesse um novo messias
nascesse um novo messias
pregando
em nome do Pai
perversões e rebeldias
perversões e rebeldias
e
que do céu derramasse
um girassol, um sinal
um girassol, um sinal
e
nos fizesse viver
sem ter juízo, afinal?
sem ter juízo, afinal?
O
que seria de todos
nós, livres de culpa e dolo,
nós, livres de culpa e dolo,
sem
confissões nem martírios,
seitas, ritos e consolos?
seitas, ritos e consolos?
No
coração dos humanos
eu, em verdade, vos digo
eu, em verdade, vos digo
só
um problema haveria,
qual um suspenso castigo:
qual um suspenso castigo:
se
o próprio Deus nos mandasse
alguém falar em seu nome
alguém falar em seu nome
autorizando
o pecado,
o amor morria de fome.
O amor em pouso de ave
o amor morria de fome.
O amor em pouso de ave
Eis
que eu te queria plena,
mas não com ares de entrega.
mas não com ares de entrega.
(Antes
, o olho invasivo
da paixão aguda e cega.)
da paixão aguda e cega.)
Eis
que eu te queria inteira
mas não assim, repentina.
mas não assim, repentina.
(Antes,
o corpo que aos poucos
é entregue a quem se destina.)
é entregue a quem se destina.)
Eu
te queria fechada
sem janelas e postigo.
sem janelas e postigo.
(Mas
chave pronta em segredo
ao que não penso ou não digo.)
ao que não penso ou não digo.)
Eu
te queria nos ventos
só por ver-te, me consolo.
só por ver-te, me consolo.
Tu,
o meu pássaro doido.
Eu, tua sombra no solo.
Eu, tua sombra no solo.
Eis
que eu queria calma
mas não constante ou tão quieta.
mas não constante ou tão quieta.
(Antes,
o denso imprevisto
de uma tela incompleta.)
de uma tela incompleta.)
Eis
que eu te queria louca
mas não assim, em conflito.
mas não assim, em conflito.
(Antes,
linha que me solta
preso ao timbre do teu grito.)
preso ao timbre do teu grito.)
Eu
não queria um amor
de sangue em vidro partido.
de sangue em vidro partido.
(Mas
alma em pouso de ave
ao colo dos meus sentidos.)
ao colo dos meus sentidos.)
Eu
aprendi que o teu nome
me liberta e me vigia.
me liberta e me vigia.
Por
isso te quero minha.
Para sempre. Ou por um dia.
Para sempre. Ou por um dia.
*
Poeta gaúcho
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