O ladrão de pistaches
* Por Sílvio Lancellotti
Apaixonou-se pelos pistaches à primeira mordiscada. Tinha uns catorze, quinze anos de idade, quando saiu da escola mais cedo, doença de um mestre, e resolveu visitar o pai, que trabalhava pertinho. Era uma sexta-feira, data em que o velho costumava se reunir com os colegas de repartição em um belo bar das vizinhanças, defronte a Biblioteca Municipal. Imaginava que, feliz pela boa surpresa, o pai lhe oferecesse o direito de tomar o seu primeiro drinque.
De fato, mereceu uma meia-dose de Campari com soda-limonada. E, na escolta, um pratinho repleto de pistaches. Fascinou-se, imediatamente, com a crocância indescritível das sementes. O velho percebeu o seu prazer enorme. E, na semana seguinte, o convidou ao seu segundo drinque, no mesmo bar.
A rotina se estendeu por semanas. Nem sempre, porém, o pai dispunha do dinheiro suficiente para os pistaches, raros, importados, muito caros. Então, numa ocasião em que o Campari lhe propiciou a ousadia, mandou a questão:
- Por quê você não leva alguns pistaches para casa?
O pai se comoveu com a ofensiva. E, numa circunstância de seu bolso mais fornido, comprou uma latinha de uns 250 gramas. Abriu a latinha antes do jantar, contou as sementes e as dividiu, fraternalmente, entre os três filhos. Quinze minutos depois, quando a mãe surgiu, havia somente as casquinhas.
Tempos após, um cunhado do pai, importador de iguarias, sabedor da mania do sobrinho, presenteou a família com uma dúzia de latões de quilo. O pai acomodou a coleção na despensa e, sem mais cerimônias, notificou:
- Vocês só pegam os pistaches quando eu autorizar.
Ele, todavia, não resistiu. Noite após noite, quando o velho e a mãe já se acomodavam em seu dormitório, descia a escadinha do seu sobrado, invadia a despensa e surrupiava uma mancheia. Para que o pai não desconfiasse do seu torpe furto, colocava as casquinhas sobrantes por debaixo dos mimos inteiros. Obviamente, no entanto, um dia o velho teria de descobrir a safadeza. Com a sua sabedoria de costume, nem precisou investigar quem seria o ladrão dos pistaches. E pespegou-lhe uma boa sova, no bumbum, com um talabarte.
* Diplomou-se em Arquitetura. Trabalhou na revista “Veja” de 1967 até 1976, onde se tornou editor de “Artes & Espetáculos”. Passou por “Vogue”, agências de publicidade, foi redator-chefe de “Istoé”, colunista da “Folha” e do “Estadão”, fez programas de gastronomia em várias emissoras de TV, virou comentarista de esportes da Band, Manchete e Record, até se fixar, em 2003, na ESPN. Trabalha, além da ESPN, na Reuters, na “Flash”, no portal Ig e na “Viva São Paulo” e é sócio da filha e do genro na Lancellotti Pizza Delivery – site de Internet www.lancellotti.com.br.
* Por Sílvio Lancellotti
Apaixonou-se pelos pistaches à primeira mordiscada. Tinha uns catorze, quinze anos de idade, quando saiu da escola mais cedo, doença de um mestre, e resolveu visitar o pai, que trabalhava pertinho. Era uma sexta-feira, data em que o velho costumava se reunir com os colegas de repartição em um belo bar das vizinhanças, defronte a Biblioteca Municipal. Imaginava que, feliz pela boa surpresa, o pai lhe oferecesse o direito de tomar o seu primeiro drinque.
De fato, mereceu uma meia-dose de Campari com soda-limonada. E, na escolta, um pratinho repleto de pistaches. Fascinou-se, imediatamente, com a crocância indescritível das sementes. O velho percebeu o seu prazer enorme. E, na semana seguinte, o convidou ao seu segundo drinque, no mesmo bar.
A rotina se estendeu por semanas. Nem sempre, porém, o pai dispunha do dinheiro suficiente para os pistaches, raros, importados, muito caros. Então, numa ocasião em que o Campari lhe propiciou a ousadia, mandou a questão:
- Por quê você não leva alguns pistaches para casa?
O pai se comoveu com a ofensiva. E, numa circunstância de seu bolso mais fornido, comprou uma latinha de uns 250 gramas. Abriu a latinha antes do jantar, contou as sementes e as dividiu, fraternalmente, entre os três filhos. Quinze minutos depois, quando a mãe surgiu, havia somente as casquinhas.
Tempos após, um cunhado do pai, importador de iguarias, sabedor da mania do sobrinho, presenteou a família com uma dúzia de latões de quilo. O pai acomodou a coleção na despensa e, sem mais cerimônias, notificou:
- Vocês só pegam os pistaches quando eu autorizar.
Ele, todavia, não resistiu. Noite após noite, quando o velho e a mãe já se acomodavam em seu dormitório, descia a escadinha do seu sobrado, invadia a despensa e surrupiava uma mancheia. Para que o pai não desconfiasse do seu torpe furto, colocava as casquinhas sobrantes por debaixo dos mimos inteiros. Obviamente, no entanto, um dia o velho teria de descobrir a safadeza. Com a sua sabedoria de costume, nem precisou investigar quem seria o ladrão dos pistaches. E pespegou-lhe uma boa sova, no bumbum, com um talabarte.
* Diplomou-se em Arquitetura. Trabalhou na revista “Veja” de 1967 até 1976, onde se tornou editor de “Artes & Espetáculos”. Passou por “Vogue”, agências de publicidade, foi redator-chefe de “Istoé”, colunista da “Folha” e do “Estadão”, fez programas de gastronomia em várias emissoras de TV, virou comentarista de esportes da Band, Manchete e Record, até se fixar, em 2003, na ESPN. Trabalha, além da ESPN, na Reuters, na “Flash”, no portal Ig e na “Viva São Paulo” e é sócio da filha e do genro na Lancellotti Pizza Delivery – site de Internet www.lancellotti.com.br.
Os pistaches são mesmo uma
ResponderExcluirtentação.
Texto delicioso