Agora é hora, ôe!
* Por Marcelo Sguassábia
Ilustração: Thiago Cayres
Quem poderia imaginar que, a essa altura da vida, o “Perde Tudo” do “Roda a Roda” ia cair como uma bigorna de desenho animado em cima de mim, este pobre servo de Davi? Má ôe, presente de 80 anos, é pegadinha? Heim???
Não dobro a espinha, um judeu da minha ascendência jamais será um decaído sem salvação. Recomeço do nada. Do nada uma ova, tiro proveito da fama que fiz. Volto pra minha banca de capinhas de título de eleitor e de canetas de tinta aguada. Tirava mais dinheiro sozinho que todos os camelôs da Praça da República juntos, apregoando em uníssono canetas muito melhores que as minhas. Pronto, ganho um monte de dinheiro pra mim mas resisto à tentação de ficar abrindo empresas com o tanto que me sobrar. Quando muito abro um novo Baú, mas antes invento outro recipiente. Mais moderno e cibernético. Tem gente que nem sabe mais o que é baú, isso é coisa onde se guardava enxoval de sinhazinha. Acorda, Senor. São novos tempos, funde uma seita, venda a salvação eterna ao invés de carros, lambretas, capas de botijão de gás e bonecas falantes em sorteios semanais – se o freguês estiver rigorosamente em dia com as mensalidades. Venda o que lhe cair às mãos, venda o glacê do bolo e as 80 velinhas como relíquias da grande festa via satélite. Anuncie um striptease seu, a começar pela peruca, no horário mais nobre do SBT e comercialize as cotas de patrocínio a peso de ouro. Pois barras de ouro valem mais do que dinheiro.
Não, não. Esquece. Me aposento de vez e deixo o Portiolli no meu lugar, só fico lá em casa mexendo na grade. Mas grade pra mexer em casa só se for a do canil do cachorro, já que a TV está praticamente vendida. A emissora e os aparelhos que tenho na mansão do Morumbi, incluindo a 14 polegadas do quarto da empregada. Preciso fazer dinheiro rápido, ôe. Só espero que o bispo mantenha a oferta e assine o contrato da joint venture para implantar no Mercosul a Igreja do Santo Silvio. Eu entro com a imagem e ele com todo o escopo logístico e de fomento às franquias. Batismos por atacado em piscininhas de lona, dízimos que retornam em mercadorias à sua escolha e títulos de capetalizalização comercializados nos cultos espalhados a cada oito quarteirões. Mas olha eu aí divagando e deixando pra lá a banca das canetinhas. Marrrr volta lá pro seu lugar, Silvio, sai pra lá, sai pra lá, ôe. Foi desse jeito, criando holdings de mil braços, que você se enfiou em camisa de onze varas.
Senor, o que é isso, Senor, você pode mais. Você opera milagres, é a própria porta da esperança. Um extenso portfólio de produtos para meus telespectadores e colegas de trabalho. Gotículas de saliva silviosantescas para cura de gagos. Bolsos de ternos que guardavam os aviõezinhos para o auditório, vendidos no Mercado Livre como se fossem indulgências da Inquisição. Kits do Pequeno Silvio Santos para o Dia das Crianças. Autógrafos originais, com firma reconhecida em cartório, cuja concessão é do meu genro, casado com a minha filha número quatro. Chats pagos pra falar comigo a qualquer hora do dia ou da noite. Travesseiros e almofadas com a minha estampa, bonecos de pancada para academias de boxe, para quem não é lá muito afeito à minha pessoa. Silvio, agora para. Para ou continua? Heiiiiiimmmmmm??? Má ôe! Ai, ai, ai, viu.
* Redator publicitário há quase 30 anos, cronista de várias revistas eletrônicas, entre as quais a “Paradoxo”
* Por Marcelo Sguassábia
Ilustração: Thiago Cayres
Quem poderia imaginar que, a essa altura da vida, o “Perde Tudo” do “Roda a Roda” ia cair como uma bigorna de desenho animado em cima de mim, este pobre servo de Davi? Má ôe, presente de 80 anos, é pegadinha? Heim???
Não dobro a espinha, um judeu da minha ascendência jamais será um decaído sem salvação. Recomeço do nada. Do nada uma ova, tiro proveito da fama que fiz. Volto pra minha banca de capinhas de título de eleitor e de canetas de tinta aguada. Tirava mais dinheiro sozinho que todos os camelôs da Praça da República juntos, apregoando em uníssono canetas muito melhores que as minhas. Pronto, ganho um monte de dinheiro pra mim mas resisto à tentação de ficar abrindo empresas com o tanto que me sobrar. Quando muito abro um novo Baú, mas antes invento outro recipiente. Mais moderno e cibernético. Tem gente que nem sabe mais o que é baú, isso é coisa onde se guardava enxoval de sinhazinha. Acorda, Senor. São novos tempos, funde uma seita, venda a salvação eterna ao invés de carros, lambretas, capas de botijão de gás e bonecas falantes em sorteios semanais – se o freguês estiver rigorosamente em dia com as mensalidades. Venda o que lhe cair às mãos, venda o glacê do bolo e as 80 velinhas como relíquias da grande festa via satélite. Anuncie um striptease seu, a começar pela peruca, no horário mais nobre do SBT e comercialize as cotas de patrocínio a peso de ouro. Pois barras de ouro valem mais do que dinheiro.
Não, não. Esquece. Me aposento de vez e deixo o Portiolli no meu lugar, só fico lá em casa mexendo na grade. Mas grade pra mexer em casa só se for a do canil do cachorro, já que a TV está praticamente vendida. A emissora e os aparelhos que tenho na mansão do Morumbi, incluindo a 14 polegadas do quarto da empregada. Preciso fazer dinheiro rápido, ôe. Só espero que o bispo mantenha a oferta e assine o contrato da joint venture para implantar no Mercosul a Igreja do Santo Silvio. Eu entro com a imagem e ele com todo o escopo logístico e de fomento às franquias. Batismos por atacado em piscininhas de lona, dízimos que retornam em mercadorias à sua escolha e títulos de capetalizalização comercializados nos cultos espalhados a cada oito quarteirões. Mas olha eu aí divagando e deixando pra lá a banca das canetinhas. Marrrr volta lá pro seu lugar, Silvio, sai pra lá, sai pra lá, ôe. Foi desse jeito, criando holdings de mil braços, que você se enfiou em camisa de onze varas.
Senor, o que é isso, Senor, você pode mais. Você opera milagres, é a própria porta da esperança. Um extenso portfólio de produtos para meus telespectadores e colegas de trabalho. Gotículas de saliva silviosantescas para cura de gagos. Bolsos de ternos que guardavam os aviõezinhos para o auditório, vendidos no Mercado Livre como se fossem indulgências da Inquisição. Kits do Pequeno Silvio Santos para o Dia das Crianças. Autógrafos originais, com firma reconhecida em cartório, cuja concessão é do meu genro, casado com a minha filha número quatro. Chats pagos pra falar comigo a qualquer hora do dia ou da noite. Travesseiros e almofadas com a minha estampa, bonecos de pancada para academias de boxe, para quem não é lá muito afeito à minha pessoa. Silvio, agora para. Para ou continua? Heiiiiiimmmmmm??? Má ôe! Ai, ai, ai, viu.
* Redator publicitário há quase 30 anos, cronista de várias revistas eletrônicas, entre as quais a “Paradoxo”
Acabou lembrando-se e colocando todos os cacoetes de SS. É ver o apresentador. Além de uma fala verossímel, envolveu o leitor.
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