sexta-feira, 31 de dezembro de 2010




Um ano histórico: bem-vindo, 2011!

* Por Lêda Selma

Nunca na História deste País”, um ano chega com tanta expectativa como 2011. Não, não, preciso rebobinar o tempo! A História deste País já viu, sim, algo parecido: 2003 surgiu ciceroneado por rastros de luz, emanados da eleição de Lula a Presidente da República. Um homem do povo, ex-operário, de pouco estudo, com um português avariado por regências e concordâncias verbais e nominais desconcertantes, um contraste, aparentemente constrangedor, em relação a seus três últimos antecessores, figuras traquejadas, empinadas, sorboneados e poliglotas, sempre de carona com seus ternos, camisas e gravatas de grifes italianas, inglesas e francesas. Todos, de fino trato e ilustres em seus círculos de convivência, quer nas esferas social e política, quer cultural e econômica. O primeiro, imortal, fez um governo malfadado. O outro, de empáfias mil, foi deposto pelo povo. E o mais falastrão, devorado pela impopularidade.
Parênteses: mamãe contava que, lá pelos idos de 1948, certo moço, de uma cidadezinha baiana, candidato a sacristão, foi desaprovado pelo padre: era analfabeto. Frustrado e com a humilhação a lhe contundir os brios, pois não pôde desempenhar o tão sonhado ofício, vendeu o pouco que tinha, e partiu, sem destino, à cata de alguma ocupação. Nem tardou tanto, achou os dois: o destino e a ocupação. Tempos depois, voltou abonado, no trote de um belo cavalo de raça, a bordo de um terno branco de linho 120, chapéu Ramenzoni 3 X, cabelos lustrados de brilhantina e pele recendendo Seiva de Alfazema. Uma pose de dar inveja. As línguas viperinas, de palmo e meio, logo propalaram a riqueza do retornante. Alguém, ironicamente, comentou: “Sem saber ler e escrever ele se enricou desse jeito, imagine se soubesse...”. Ao que outro concluiu: “Se soubesse, não teria passado de sacristão do padre!”. Nenhuma apologia ao analfabetismo, naturalmente! Fecho os parênteses.
Assim, 2003 começou apoteótico em emoções, comoções e prognósticos variados. Sonhos espocaram alegremente, esperanças acenderam-se aos borbotões, projetos de vida ressuscitaram, e um nordestino simples, barbudo, rouquenho, carente de um dedo e com a língua presa, apesar de solta (vá entender...), tornava-se o personagem maior de um Brasil que despontava para o futuro, sob certas desconfianças e milhares de esperanças.
Os quatro anos multiplicaram-se em oito, com a reeleição. E o Brasil cresceu, conquistou prestígio internacional e se fez grande e soberano aos olhos também do mundo. E milhares de brasileiros relegados à pobreza, à miserabilidade, ao abandono e à exclusão, marginalizados até pela própria vida, descobriram-se cidadãos, com direito à dignidade que o emprego formal, a casa própria, a comida na mesa, o lazer, a escola e a universidade lhes propiciaram. A economia em ascensão constante, a comunicação simples e sincera com as massas, a identidade com os desfavorecidos ajudaram o governo Lula a se fortalecer e a conquistar credibilidade e respeito lá fora. Ah! também contrastando com seus últimos antecessores, o ex-operário, como “nunca na História deste País”, deixou o poder com índice recorde de aprovação: 87%. Baita desafio, hem, Dilma?!
Pela segunda vez na História deste País, um ano já irrompe histórico e comboiado por muitas expectativas e emoções. Desta feita, uma mulher comandará o destino de quase duzentos milhões de brasileiros. Com euforia, 2011 abre-lhe passagem, desafiando-a a assumir o leme, com serenidade, discernimento e ousadia, como timoneira de um povo que já não se alimenta só de esperança, que já não se satisfaz com migalhas restadas de classes superiores, um povo que, pela cidadania, aprendeu a ocupar seu espaço e a ser verdadeiramente feliz. Que Deus a proteja, presidente (ou presidenta) Dilma Rousseff, e ajude-a a combater as sementes e as escaras da corrupção, da pobreza e da exclusão social!
A todos, um 2011 promissor, luminoso e abençoado!

• Poetisa e cronista, licenciada em Letras Vernáculas, imortal da Academia Goiana de Letras, baiana de Urandi, autora de “Das sendas travessia”, “Erro Médico”, “A dor da gente”, “Pois é filho”, “Fuligens do sonho”, “Migrações das Horas”, “Nem te conto”, “À deriva” e “Hum sei não!”, entre outros.

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