Haja saco!
* Por André Falavigna
O pior resultado da derrota do Brasil na Copa do Mundo não é, em nenhuma hipótese, a frustração de torcedores que queriam que o Brasil ganhasse a Copa. Essa é uma conseqüência naturalmente suportada, cujos piores efeitos são, em pessoas saudáveis, duas ou três semanas de auto-ilusão acerca das possibilidades de “nunca mais se torcer pra essa porra de time”. Isso passa. Outras coisas não passam. Eu até tenho uma idéia bastante precisa, fundamentada e formulada para explicar o porquê de não passarem. Só que, antes de expor uma coisa tão complexa, eu vou desopilar. Vou desopilar falando quais são essas coisas que não passam e que são piores do que torcer para um time ganhar um torneio que ele perde.
Na realidade, são coisinhas que estavam mais ou menos mortinhas, mas que agora ganharão o habitual impulso que ganham toda a vez que o Brasil não sai campeão de uma Copa. Para algumas figurinhas mais chatinhas, essas coisinhas já são até o próprio modo de vida. A gente perdoa. Duro vai ser ver neófitos entoando o coro do “monopólio do futebol”. O mais triste é que, normalmente, o coro é formado por gente que deve o pão nosso de cada dia primeiro ao futebol, e depois a Deus. Eu já vou avisando: graças à popularidade do futebol no país, há espaço jornalístico para se falar sobre bocha aquática artística sobre o gelo. Portanto, antes de reclamar do fato de a imprensa dar tanta atenção ao futebol, lembre-se: ela só faz isso porque compensa. É bem verdade que todos os esforços já feitos para que deixe de compensar são também oriundos da mesma imprensa, mas, felizmente, a coisa simplesmente não pega. Se você for jornalista esportivo, sobretudo se cobrir futebol, ponha a mão na consciência antes de dizer que o problema é a atenção excessiva que damos ao futebol. Não fosse essa atenção, você talvez nem fosse jornalista. Ou pior: tivesse que cobrir vôlei. Só jornalistas são-paulinos ou proto-são-paulinos podem gostar de uma coisa assim. Aliás, o Kaká é o perfeito menino do vôlei. Só que se o Bernardinho gritar com ele como gritava com as meninas do time feminino (não confundir com as do masculino, com as quais ele manera – coisa estranha), ele chora. Mas esse é outro assunto.
Não é só isso. Futebol é uma coisa suja. Hummm. Jornalismo também, só que é menos divertido. Mais ainda: dentre as coisas sujas divertidas, o futebol só é menos divertido do que o sexo anal. Veja lá você em que posição desse ranking deve parar a crítica esportiva. Perde até para o duplo twist carpado retal que só aquela moça da ginástica olímpica consegue dar. Acho que se chama Gustavo Kuerten, ou coisa que o valha. Dá uma audiência louca, toda quarta-feira e domingo.
E tem mais: uma eventual pole position do Felipe Massa NÃO vai lavar a alma de ninguém. Inclusive porque o automobilismo, como de resto o esporte profissional, como de resto quase toda a atividade profissional, é uma coisa suja, uma sujeirada só, uma porcaria repleta das “maiores armações”. E todo mundo sabe que a única graça de uma corrida de carros são as batidas seguidas de óbito. Quando não há batidas seguidas de óbito, a gente fica com a impressão de que é coisa de viado. Eu pelo menos fico.
E tem mais ainda: as Olimpíadas estão aí, e apesar de a televisão brasileira achar que elas são uma série de campeonatos de vôlei, ginástica e salto ornamental, elas são bem legais de assistir e têm até um campeonato de futebol (aliás, dois campeonatos), e uma porção de lutas de boxe. Mesmo assim, elas não “fazem a gente se afastar um pouco dessa coisa suja de só futebol, só futebol”, e, por incrível que pareça, são divertidas sem que, para isso, alguém tenha que falar mal de futebol. Mesmo porque a cota de sujeira de uma única Olimpíada dá para supernutrir umas três gerações de jornalistas-esportivos-chatos-de-galocha.
Contenham-se, pelo amor de Deus. Alguns dos melhores cronistas deste país saíram-se muito mal com o enterro do futebol brasileiro no final dos anos 80. A coisa reapareceu como que um zumbi e todo mundo teve que fingir que não tinha dito nada. O futebol do Brasil não é decadente, o vôlei não vai superar o futebol em popularidade (mesmo que se produza, em laboratório, essa sensação, ela ainda é só uma sensação – a exemplo da idéia de progresso contínuo da História e da Ciência Irrespondível), o público continuará rejeitando as lésbicas nas novelas das nove e, por fim mas não somente, se houver um plebiscito sobre o aborto, o aborto não passa. E, sim, o São Paulo não vai ganhar todos os campeonatos daqui até o dia do Juízo Final. Nem tudo está perdido, afinal.
* André Falavigna é escritor, tendo publicado dezenas de contos e crônicas (sobretudo futebolísticas) na Web. Possui um blog pessoal no qual lança, periodicamente, capítulos de um romance. Colabora com diversas publicações eletrônicas.
* Por André Falavigna
O pior resultado da derrota do Brasil na Copa do Mundo não é, em nenhuma hipótese, a frustração de torcedores que queriam que o Brasil ganhasse a Copa. Essa é uma conseqüência naturalmente suportada, cujos piores efeitos são, em pessoas saudáveis, duas ou três semanas de auto-ilusão acerca das possibilidades de “nunca mais se torcer pra essa porra de time”. Isso passa. Outras coisas não passam. Eu até tenho uma idéia bastante precisa, fundamentada e formulada para explicar o porquê de não passarem. Só que, antes de expor uma coisa tão complexa, eu vou desopilar. Vou desopilar falando quais são essas coisas que não passam e que são piores do que torcer para um time ganhar um torneio que ele perde.
Na realidade, são coisinhas que estavam mais ou menos mortinhas, mas que agora ganharão o habitual impulso que ganham toda a vez que o Brasil não sai campeão de uma Copa. Para algumas figurinhas mais chatinhas, essas coisinhas já são até o próprio modo de vida. A gente perdoa. Duro vai ser ver neófitos entoando o coro do “monopólio do futebol”. O mais triste é que, normalmente, o coro é formado por gente que deve o pão nosso de cada dia primeiro ao futebol, e depois a Deus. Eu já vou avisando: graças à popularidade do futebol no país, há espaço jornalístico para se falar sobre bocha aquática artística sobre o gelo. Portanto, antes de reclamar do fato de a imprensa dar tanta atenção ao futebol, lembre-se: ela só faz isso porque compensa. É bem verdade que todos os esforços já feitos para que deixe de compensar são também oriundos da mesma imprensa, mas, felizmente, a coisa simplesmente não pega. Se você for jornalista esportivo, sobretudo se cobrir futebol, ponha a mão na consciência antes de dizer que o problema é a atenção excessiva que damos ao futebol. Não fosse essa atenção, você talvez nem fosse jornalista. Ou pior: tivesse que cobrir vôlei. Só jornalistas são-paulinos ou proto-são-paulinos podem gostar de uma coisa assim. Aliás, o Kaká é o perfeito menino do vôlei. Só que se o Bernardinho gritar com ele como gritava com as meninas do time feminino (não confundir com as do masculino, com as quais ele manera – coisa estranha), ele chora. Mas esse é outro assunto.
Não é só isso. Futebol é uma coisa suja. Hummm. Jornalismo também, só que é menos divertido. Mais ainda: dentre as coisas sujas divertidas, o futebol só é menos divertido do que o sexo anal. Veja lá você em que posição desse ranking deve parar a crítica esportiva. Perde até para o duplo twist carpado retal que só aquela moça da ginástica olímpica consegue dar. Acho que se chama Gustavo Kuerten, ou coisa que o valha. Dá uma audiência louca, toda quarta-feira e domingo.
E tem mais: uma eventual pole position do Felipe Massa NÃO vai lavar a alma de ninguém. Inclusive porque o automobilismo, como de resto o esporte profissional, como de resto quase toda a atividade profissional, é uma coisa suja, uma sujeirada só, uma porcaria repleta das “maiores armações”. E todo mundo sabe que a única graça de uma corrida de carros são as batidas seguidas de óbito. Quando não há batidas seguidas de óbito, a gente fica com a impressão de que é coisa de viado. Eu pelo menos fico.
E tem mais ainda: as Olimpíadas estão aí, e apesar de a televisão brasileira achar que elas são uma série de campeonatos de vôlei, ginástica e salto ornamental, elas são bem legais de assistir e têm até um campeonato de futebol (aliás, dois campeonatos), e uma porção de lutas de boxe. Mesmo assim, elas não “fazem a gente se afastar um pouco dessa coisa suja de só futebol, só futebol”, e, por incrível que pareça, são divertidas sem que, para isso, alguém tenha que falar mal de futebol. Mesmo porque a cota de sujeira de uma única Olimpíada dá para supernutrir umas três gerações de jornalistas-esportivos-chatos-de-galocha.
Contenham-se, pelo amor de Deus. Alguns dos melhores cronistas deste país saíram-se muito mal com o enterro do futebol brasileiro no final dos anos 80. A coisa reapareceu como que um zumbi e todo mundo teve que fingir que não tinha dito nada. O futebol do Brasil não é decadente, o vôlei não vai superar o futebol em popularidade (mesmo que se produza, em laboratório, essa sensação, ela ainda é só uma sensação – a exemplo da idéia de progresso contínuo da História e da Ciência Irrespondível), o público continuará rejeitando as lésbicas nas novelas das nove e, por fim mas não somente, se houver um plebiscito sobre o aborto, o aborto não passa. E, sim, o São Paulo não vai ganhar todos os campeonatos daqui até o dia do Juízo Final. Nem tudo está perdido, afinal.
* André Falavigna é escritor, tendo publicado dezenas de contos e crônicas (sobretudo futebolísticas) na Web. Possui um blog pessoal no qual lança, periodicamente, capítulos de um romance. Colabora com diversas publicações eletrônicas.
Humor glutão, imenso, hiperbólico, e essa última característica não tem nada a ver com futebol.
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