Mezza
maracutaia, mezza safadeza
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Por Marcelo Sguassábia
Bom
dia, Doutor Aristenes
Escalei
o estagiário de nossa banca de advocacia para elencar algumas
possíveis alegações de defesa para o caso do nosso cliente,
Rodrigo Lurdes, filmado em flagrante com mala de dinheiro saindo da
pizzaria em São Paulo. Trata-se de demanda difícil e a bem dizer
indefensável, mas como o primeiro time do nosso escritório só
poderá se envolver com a causa a partir da semana que vem, imaginei
que nosso talentoso estagiário já poderia ir adiantando alguma
coisa.
Seguem
os apontamentos do rapaz, para sua análise.
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Alegação de defesa 1
O
montante de 500 mil reais dentro da mala se trataria de dinheiro
falso, ainda que aparentemente idêntico ao verdadeiro. Nossa tese se
embasaria no “fato” (versão construída) de Rodrigo Lurdes ser,
concomitantemente à atividade parlamentar, um fornecedor da
indústria de brinquedos, e que estaria levando amostras de dinheiro
sem valor para aprovação do dono da empresa, que estaria lançando
o “Novo Banco Imobiliário”. Como as crianças de hoje não mais
se deixam seduzir por qualquer porcaria mal-acabada, a semelhança
com o papel moeda legítimo seria resultado da excelência
profissional de nosso cliente, na intenção de satisfazer as
exigências qualitativas da indústria e do consumidor em relação
ao produto fornecido.
Evidentemente, o juiz do caso submeteria o
dinheiro da mala a uma análise pericial. É claro que esta apontaria
o dinheiro como real, mas a defesa recorreria, de instância a
instância, baseada no argumento da alta tecnologia empregada pelo
pretenso fornecedor, tornando o fake indistinto do original.
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Alegação de defesa 2
O
dono da pizzaria seria sócio ou testa de ferro de Rodrigo Lurdes.
Nosso cliente estaria lá para retirar o faturamento acumulado de
dois anos, mantido em espécie no estabelecimento. Ainda que pouco
usual, o procedimento não pode ser considerado ilícito.
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Alegação de defesa 3
Argumentamos
que Rodrigo Lurdes é proprietário da pizzaria, e que acreditaria
estar carregando uma mala cheia de molho Pomarolla vencido para
devolução ao supermercado onde supostamente foi adquirido.
Entretanto, antes que saísse para a rua, ainda dentro da pizzaria, a
mala com Pomarolla teria sido criminosamente substituída pela
recheada com dinheiro. A defesa sustentaria a tese de que a troca foi
provavelmente realizada por membros do Partido dos Batalhadores, com
o intuito de incriminar Lurdes.
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Alegação de defesa 4
Rodrigo
Lurdes seria um recém-convertido à bancada evangélica do
Congresso. A pizzaria, na verdade, escamotearia um templo da seita
“Lurdes dos Inválidos”. O dinheiro no interior da mala
corresponderia às oferendas recolhidas no dia ou acumuladas no mês.
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Marcelo
Sguassábia é redator publicitário. Blogs:
WWW.consoantesreticentes.blogspot.com (Crônicas e Contos) e
WWW.letraeme.blogspot.com (portfólio).
Todas as argumentações são palatáveis, tal qual a pizza do lugar.
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