Você, o centro do mundo
*
Por Rosana Hermann
Se eu não detestasse tanto
essa ladainha de ‘guerra dos sexos’ eu diria que os homens são
muito mais vaidosos do que as mulheres em todos os sentidos e que são
eles que mais praticam este esporte, o da projeção do próprio ego
em tempo integral. Mas vou deixar a competição do mundo feminino
contra o masculino para os programas infantilóides de tv e fazer uma
análise assexuada destas ocorrências. Não é específico do mundo
dos machos, é uma característica das personalidades egocêntricas
em geral. Fato é que tem gente que não pode ver, ler, ouvir uma
única notícia no rádio, na tv, jornal ou Internet sem
imediatamente fazer a conjectura-chavão: “se fosse eu...!”.
Acompanhar um telejornal ao
lado dessas pessoas é praticamente uma tortura. Tudo orbita em torno
delas. Se ela fosse o Lula mandaria tal ministro pra rua, se fosse o
juiz condenaria o réu, se fosse a cantora não teria ido buscar o
prêmio. Se fosse a apresentadora jamais iria à festa sem calcinha
e, claro, se fosse o namorado dela, teria terminado tudo. Se fosse o
diretor do filme teria mudado o final. Se fosse o editor do jornal
não permitiria tantos anúncios. Se ela fosse o prefeito daria um
jeito nas inundações. Aliás, se ela fosse São Pedro nem estaria
mandando chuva agora.
Esse tipo de personalidade é
mais comum do que imaginamos e tem também suas nuances. Quando a
pessoa que se projeta em tudo percebe que todos numa sala já notaram
que se ela fosse qualquer outro ser, faria tudo muito melhor, ela dá
um passo atrás e altera um pouco o método. E deixa de conjecturar
sobre o que faria se fosse a outra para contar de fato tudo o que de
melhor ela já fez. E aí começa a cantilena de auto-elogios e
auto-enaltecimento. No tempo da faculdade ele era o mais bacana, o
melhor do quarteirão, o chefe mais sensato, o funcionário mais
eficiente. Enfim, ele sempre foi o melhor no passado e, claro, teria
sido melhor no lugar de qualquer outra pessoa.
O que acontece com esses seres
humanos? Eles acreditam mesmo que são melhores do que todos? Não,
eles sabem que não são. E na verdade, sentem-se inferiores a todos
os outros, idéia que os apavora. São medrosos, inseguros e tudo o
que dizem tem por objetivo aplacar ou disfarçar esta insegurança.
Esses reis do blá blá blá, teóricos da vida, falam muito mais do
que realizam, imaginam muito mais do que agem e vestem-se com o manto
da perfeição apenas para que não desnudemos suas fraquezas. São
pessoas carentes, que se sentem injustiçadas, inferiorizadas e em
cada oportunidade vêem uma chance de chamar a atenção para si.
Quando você perceber alguém
assim a sua volta, não o odeie, não o trate mal. Veja nele apenas
alguém lutando contra seu pavor pela mediocridade. E se algum dia
você descobrir em si próprio uma tendência a fazer o mesmo, não
sinta auto-piedade. Somos todos inseguros, vaidosos, tentando ser
mais do que somos, lutando contra a dolorosa consciência da nossa
própria finitude, sofrendo de mansinho por saber que o mundo vai
continuar exatamente como sempre foi depois que a gente se for,
exatamente como sempre existiu antes de chegarmos aqui.
*Rosana Hermann é Mestre
em Física Nuclear pela USP de formação, escriba de profissão,
humorista por vocação, blogueira por opção e, mediante pagamento,
apresentadora de televisão.
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