Guerra
deflagrada
*
Por Mara Narciso
O
escritor gaúcho, radicado em Campinas, Pedro João Bondaczuk
considera a produção literária um ato solitário, que exige
concentração e método. Muitas vezes é angustiante, porque, quanto
mais escreve, mais exigente se torna o escritor, fazendo exaustivas
revisões, lapidando o texto, burilando o escrito sem acreditar que
esteja pronto. Escrever é uma necessidade, não sendo um prazer
naqueles trabalhos obrigatórios, com prazos. Ler exige concentração
e escrever exige doação. É recomendável não entediar o
leitor/ouvinte, porém, quando o conteúdo é maior, a dispersão
acontece. Como vencer esse limitante humano? Quem fala deve alternar
o tom de voz e quem ouve deve procurar prestar atenção.
“Estava
mais angustiado, que um goleiro na hora do gol”, explicitou
Belchior, referindo-se à bola lá dentro e ao placar negativo. Para
alguns momentos de total abandono essa metáfora cai bem. A vida tem
barreiras pessoais que ninguém poderá ajudar. É imperativo escalar
com a força e a coragem. O que terá de ser feito agora, já deverá
estar preparado, e poderá ser uma eleição, uma prova para carteira
de motorista, uma apresentação de TCC – trabalho de Conclusão de
Curso, uma dissertação, uma tese, uma estreia
num show ou teatro ou a leitura de um discurso. Quando a única
alternativa é avançar, o recuo não será mais possível. O avião
está no ar, e, pelas portas abertas você saltou de paraquedas. Ele
abrirá?
A
existência é feita de desafios, recuos, avanços, perdas e ganhos,
e há momentos limites, de vida ou morte. Para quê inventou? Agora
aguenta. No dia a dia, quando lutas e vitórias se alternam,
estaremos aptos para uma possível derrota? Como seguiremos após
essa perda? Quando nos reergueremos para enfrentar outro embate?
Há
quem se divirta com disputas. Algumas pessoas carregam um estilo de
guerra permanentemente conflagrada. Estão guerreando o tempo todo,
medindo forças, e lançando farpas. É um comportamento frequente,
sendo obrigatório analisá-lo a intervalos, considerando a
intensidade. É um tempo para se portar escudo ou colete a prova de
balas, porque os adversários não colocam as armas no chão.
Palavras
como disputa, embate, inquirir, debater, bater, estapear, são verbos
que, para serem bem conjugados exigem inteligência, raciocínio
rápido, controle, poder de cortar o pensamento do outro para fazê-lo
perder a compostura. Esse comportamento verbal, tido como o
suprassumo da esperteza oral seduz, atrai ou afugenta? Quanto maior o
desconforto que causar, mais habilidoso será considerado o
entrevistador ou o entrevistado, imaginando que na televisão, quem
pergunta não tem interesse nas respostas. Quer mesmo é desconcertar
o entrevistado, levá-lo a se contradizer, ficar desconfortável,
constrangido, quando não de cair no ridículo. O inquiridor tem
lado, partido e candidato.
Nas
redes sociais tornaram-se moda os linchamentos públicos. Por
escrito, fica mais cortante. As letras-navalhas cumprem o seu papel
dilacerador. A intenção é mutilar, destruir, aniquilar. Quem não
tem competência, que não se estabeleça no debate. Estar em
evidência é o clímax do dia para alguns, mas existem estilos
reservados, discretos e contidos. Essas pessoas não são boas
debatedoras, mas vencerão noutros campos.
Estar
diante de um microfone, para ler um discurso, falando para uma
plateia desatenta, com folhas em profusão, nenhum anteparo para
ocultar o corpo, nem algo para pousar as mãos ou os papéis, pode
levar a estranhas sensações: desamparo, insegurança, descarga de
adrenalina, boca seca, ou, pelo contrário, achar a confiança em si
mesmo: agora é a minha vez. Guerra conflagrada, apenas com os
próprios pensamentos, sentimentos e hormônios, num incêndio
interno de confusão e agitação. Buscar nos recursos mentais o
jeito certo de pensar, e ao encontrar a serenidade, executar a
tarefa. Não duvidem: as nossas guerras internas são os nossos
mais ferozes inimigos.
*
Médica endocrinologista, jornalista profissional, membro da Academia
Feminina de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico, ambos de
Montes Claros e autora do livro “Segurando a Hiperatividade”
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