domingo, 9 de setembro de 2018

Os solfejos do Teatro Carlos Gomes - Tânia Haskell


Os solfejos do Teatro Carlos Gomes


* Por Tânia Haskell


Uma das coisas que mais gostava de fazer nos dias que antecediam as festas de Natal, por volta dos meus 20 a 30 anos quando ainda morava em Blumenau, era assistir a todos os programas de Natal do Teatro Carlos Gomes. Era um mês de grandes apresentações, todas envoltas naquela mágica atmosfera de euforia mista de alegria que a época revivia.
 
Sempre adorei aquele Teatro, imponente, cheio de histórias, cheirando a arte e cortinas de palco, com seu constante entra-e-sai de alunos do conservatório de música, som de instrumentos sendo afinados nos ensaios das orquestras, bailarininhas saltitando aqui e ali, artistas famosos cruzando com a gente nos corredores, aquele barzinho onde embalava animados papos com muitos gin-soda rodeada dos mais exotéricos e ripongas amigos, todos envolvidos de alguma forma com aquele prédio suntuoso, construído na época da 2ª Guerra e segundo conta a "lenda", feito para receber, hospedar e esconder o Führer (vou pesquisar mais sobre isso…) em sua "provável" fuga para o Brasil. A seguir, uma pequena história que envolve o teatro.


Pequena "lenda urbana".


Por Carlos Braga Mueller A imponência do prédio que abriga a Sociedade Dramático-Musical Carlos Gomes sempre foi alvo de muitos comentários, principalmente daqueles que atribuem a construção do prédio, na década de 30, aos marcos alemães, supostamente vindos do 3º Reich.

- O livro “O Punhal Nazista no Coração do Brasil”, do Coronel Antônio Lara Ribas, editado nos anos 40 pela Delegacia de Ordem Política e Social de Santa Catarina, órgão que combatia o nazi-fascismo local, cita diversas sociedades e clubes catarinenses que teriam recebido doação em dinheiro da Alemanha.

Entre elas não consta o nome da Sociedade Teatral Frohsinn”, que durante a segunda guerra. passou a chamar-se Carlos Gomes.
Mas as lendas urbanas perseguem até hoje o Teatro.

- Primeira delas: a fachada seria uma réplica do quepe militar de Hitler. Não há como negar. Basta olhar para se ter esta impressão. O quepe do Fuehrer, ou seja, lá de que general for, pode sim ter inspirado qualquer arquiteto, sem que tivesse havido conotação política no projeto.

Conversando com um cidadão, cujo avô trabalhou nas obras do Teatro Carlos Gomes, ele me disse que o avô contava que de vez em quando arquitetos vinham da Alemanha acompanhar a construção. Teria isto algum significado político? Ou seria apenas um intercâmbio técnico-cultural?

As lendas diziam também que o prédio seria a Sede do 3º Reich na América Latina, se Hitler ganhasse a guerra!

Hitler perdeu. Ficou a lenda!
- Outra questão levantada sobre o prédio do Teatro é a possível existência de um túnel, que ligaria os seus porões a uma saída de emergência.

De alguns anos para cá, muitas reformas foram feitas e nada, absolutamente nada foi encontrado que denotasse escavação ou indícios de um túnel ou coisa parecida. É bem verdade que existem paredes no prédio com espessura de mais de meio metro. Mas, segundo consta, tudo de acordo com o projeto original. É bom lembrar um outro fato que, misturado a esta lenda, pode explicar alguma coisa.

Onde hoje existe a Rua Namy Deeke (transversal que liga a Rua XV à 7 de Setembro), corria um ribeirão.

Com a necessidade de se urbanizar o centro, o ribeirão foi canalizado desde o morro da Rua 7 até o Rio Itajaí Açu. Como o terreno do Teatro Carlos Gomes ficava ao lado do antigo Ribeirão, hoje Rua Namy Deeke, muita gente, que acompanhava a construção da tubulação, que naquele tempo era feita de aço, erguia os olhos e via o Teatro. Tinha tudo para dar a impressão que do Teatro saía um túnel em direção ao Rio Itajaí Açu.
E a lenda vai mais adiante: na barranca um barco veloz estaria sempre a postos, para levar Hitler até um local mais navegável do Rio, onde um submarino aguardava o Fuehrer, para levá-lo são e salvo a outro território do Reino.

Indo mais adiante, subindo o Rio Itajaí Açu, chegando a Ibirama, nos vêm à lembrança outra lenda: Hitler teria autorizado homens de sua confiança, egressos da antiga Companhia Hanseática de Hamburgo, que colonizou Ibirama, a encontrar uma grande área de terras para ali instalar-se no Brasil.

Em 1934, o dirigível Graf Zepellin sobrevoou Blumenau e depois se dirigiu para Hammônia, hoje Ibirama.

A justificativa dada pela Companhia Zepellin foi a de que o comandante da aeronave, Dr. Hugo Eckner, tinha parentes na região e foi até lá para saudá-los.

Dizem as lendas, que Eckner não deu muita importância à missão de mapear algum território para Hitler.

Ficou público e notório o desentendimento que marcou as relações do Fuehrer com o Conde Zepellin até o final da guerra.
Em 1936, Hitler abriu com pompas as Olimpíadas na Alemanha. E exigiu que os dois maiores dirigíveis da Nação, o Graf Zepellin e o Hindenburg, sobrevoassem juntos Berlim, uma verdadeira apoteose do nacional-socialismo alemão.

Pois para conseguir este feito teve que ameaçar o Conde de que, ou os dois dirigíveis voavam em dupla ou a empresa passaria ao controle do Estado! Voaram.

Outra briga entre Zepellin e Hitler foi a colocação da cruz suástica no bojo das aeronaves. Só a muito custo a empresa Zepellin concordou em colocar a suástica nas caudas dos dirigíveis, e mesmo assim bem pequenas. Hitler queria que elas tomassem todo o bojo lateral, mas não conseguiu o intento.

Voltando à Blumenau da minha juventude... Quando chegava dezembro, organizavam-se várias audições com artistas do local, de fora ou mesmo de alunos e professores da Escola de Música, da qual aliás, digo com todo orgulho, fiz parte por alguns anos, do coral e das aulas de piano, com professores como Jorge Radtke, Domingos e Reginaldo Nascimento, embora nunca quisesse me apresentar ... Foi graças à meia bolsa de estudos que a Cia Hering me forneceu, que pude entrar no mundo encantado da música, das artes, e o contato pela 1ª vez com os arpejos e solfejos de aulas de teoria musical, com os acordes de um piano Steinway (joia do Teatro), com as belezas intrincadas nas tramas vocálicas dos corais de Bach e Haendel, enfim, com partituras, música erudita, instrumentos, palco, arte.

Num final de semana havia apresentação do "Quebra Nozes" com o corpo de baile da consagrada escola de dança do teatro, o Pró-Dança, no outro, era a vez das imperdíveis audições de encerramento dos alunos. Num outro havia encenação de peças Natalinas e o "gran-finale", para fechar os festejos com chave de ouro, era com a Orquestra de Câmara de Blumenau e o coral "Ars Sacra" (do qual participei) do próprio teatro. Saíamos desses concertos flutuando numa aura de Natal. Havia sempre casa lotada, todos usando suas melhores roupas, a nata da sociedade blumenauense marcando presença, e toda sorte de pessoas influentes como escritores, músicos e políticos, todos amigos ou conhecidos pois de alguma forma incentivavam a arte que se respirava naqueles corredores de sonho, e todo ano era a mesma coisa, sempre aquela apoteose de arte misturada com clima de festa, cordialidade, desfrute. Nas coxias, nos camarotes, no palco, na plateia, todos eram iguais e felizes perante aqueles momentos impregnados de beleza e luz. Era como participar de uma missa dominical, onde acabado o culto, todos saíam sorridentes, se cumprimentando, desejando sinceramente o melhor que seus corações poderiam desejar. Na saída, todos corríamos para os camarins para cumprimentar e agradecer aos artistas que nos abrilhantavam com tamanha magia.

Tive o privilégio de assistir grandes obras ali, desde "O Messias" de Haendel ao "Oratório de Natal" de Bach, concertos de Natal diversos, cujos acordes ainda frescos em minha memória, me trazem todo o peso da nostalgia que remontam essa fase deslumbrante da minha vida. 


* Escritora de Blumenau/SC.

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