terça-feira, 12 de julho de 2016

Girar e rodopiar...


* Por Maria Eugênia Amaral


Há quem observe estrelas, planetas e satélites. Por vezes quero vê-los, mas sou mais ligada a coisas terrenas, desde as menos descomunais até as bem pequenininhas. Nunca olhei em um telescópio, mas microscópios já usei vários. Quando menina, com uns sete anos, levaram-me a uma universidade e, em um laboratório de pesquisa, vi a vida como sempre me pareceu ser: repleta de movimento. Só que o movimento que me mostraram, incessante e surpreendente, vinha de uma planta! Uma pequena folha de Elodea ― planta aquática muito utilizada em aquários ― foi colhida da água em minha frente, colocada em uma lâmina de vidro e posicionada sob o microscópio, onde, sem truques nem mágica, aquela folhinha converteu-se em um piso de tijolinhos transparentes em que milhares de bolinhas verdes rodopiavam sem cessar. Incrédula, pedi para ver outra folha, que eu mesma arranquei. E o balé se repetiu. Havia vida naquela planta estática, que até então parecia obedecer só ao movimento da água. E era uma vida bem agitada. Nem preciso dizer que nunca mais olhei para gramas, arbustos, árvores e flores, com o mesmo olhar. (Ao voltar para casa, cheguei a fazer um funeral para uma violeta morta...)

Fui crescendo e percebi que a vida gosta de agitos. A ausência de movimento é morte. Tudo no universo gira, como se dançasse uma valsa, ou rodopia em espiral, como que trançando fitas em um poste de festa de São João. Os biólogos, os físicos e os astrônomos já nos mostraram que, do micro ao macro, sempre existe algo que se move: elétrons ao redor do núcleo atômico, luas em torno de seus planetas e planetas dando voltas em estrelas. Alguns movimentos, como a luz e o som, são perceptíveis a nossos sentidos; outros não. São giros, oscilações, órbitas, pulsos, ondas: uma infinidade de termos para diferentes estilos de dança.

Mas me parece que nenhum movimento tem mais ritmo que a vida. Até nosso coração, quando bate descompassado, entra em arritmia. E no meio de tanto encantamento ainda existem pessoas (e, assustadoramente, cada vez mais) que, ditas racionais, não respeitam a vida. São as que deixam barragens de lama romperem e matam por omissão; as que treinam para serem defensoras de determinada fé e matam por opção (para ganhar o paraíso!). Acho que esses assassinos, fanáticos religiosos ou não, nunca brincaram de roda. Tristes crianças adultas que só sabem brincar de descaso e ódio: as únicas brincadeiras que conheço que não têm riso, giro e nem rodopio; só descompasso, arritmia. E assim terminam, levando consigo a impressão de que viveram um dia.

[FONTE DA IMAGEM: Escultura de Sandra Guinle. “Ciranda mista”, 2003]


* Escritora

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