O estopim que faltava
* Por
Gilberto Abrão
O que estava sendo
feito às escondidas, agora é feito às escancaras. A Arábia Saudita não mais
esconde o seu relacionamento amistoso com Israel. Encontros entre as altas
cúpulas dos dois regimes estão sendo fotografados e publicados pela imprensa
mundial. Um dos príncipes sauditas, muito conhecido no jet set internacional,
declarou sem nenhum pejo, que se houver um novo ataque de Israel aos palestinos
de Gaza, o regime saudita não hesitará em se posicionar a favor de Israel.
Numa análise mais
aprofundada, se a Arábia Saudita está envolvida até o pescoço na Guerra da
Síria, financiando e arregimentando os terroristas que para lá vão, ela está a
prestar um grande benefício aos sionistas enfraquecendo o exército sírio e
destruindo toda a infraestrutura do país. A Síria vai precisar de mais trinta
anos, com a ajuda de países amigos, para se recuperar e voltar a ser o que era
antes dessa guerra multinacional contra ela.
Por outro lado, a
guerra no Iêmen liderada pela Arábia Saudita, já destruiu grande parte do país
e matou centenas de milhares de civis. O motivo dessa guerra não é outro senão
impedir que o Iêmen faça uma aliança com o Irã e fuja do controle saudita. Os
sauditas consideram o Iêmen o seu quintal. Levando-se em conta que o Irã faz
parte do eixo de resistência a Israel, juntamente com a Síria, o grupo
guerrilheiro libanês Hezbollah e a resistência palestina, Israel está feliz da
vida com essa guerra. Aliás, há até pilotos israelenses bombardeando Sanaa, a
capital iemenita. Mas por quê? Uma coisa que os sionistas certamente não
desejariam seria o domínio iraniano do Bab al Mandeb, a porta de entrada ao Mar
Vermelho para os navios que saem ou entram em Israel. Portanto, Israel bate
palmas para as agressões e massacres sauditas no Iêmen.
Tão feliz está Israel
com o desempenho da Arábia Saudita, que, para criar ainda mais cisão no mundo
muçulmano, autodenominou-se o “defensor dos sunitas” (sic). Foi uma jogada de
mestre, sem dúvida. Israel explorou muito bem o ódio que os sauditas têm à
República Islâmica do Irã que é xiita. O regime saudita é dominado pela seita
wahabitas (o ramo radical do sunismo) que é a fonte ideológica do grupo
terrorista Estado Islâmico e afins, e que considera os muçulmanos xiitas como
apóstatas.
Na reunião da Liga
Árabe ocorrida no dia 11 de março, a Arábia Saudita induziu os membros da liga
a considerarem o Hezbollah uma organização terrorista. Com exceção da Síria
(não representada), Líbano, Iraque e Argélia, os demais – inclusive a
representação da Autoridade Palestina – seguiram o regime saudita.
Compreende-se a razão. Todos eles estão a precisar de uma graninha e, portanto,
não viram nada demais em vender suas consciências por um punhado de
petrodólares. Os povos desses países, entretanto, são, na sua esmagadora
maioria, contra essa resolução da Liga Árabe. Os governos, portanto, não
representam a vontade dos povos.
Para gáudio de Israel,
agora o regime saudita está pensando seriamente em atacar o Hezbollah no sul do
Líbano, fomentando milícias sunitas dentro do país. Vai fazer o serviço sujo
para Israel que não conseguiu tirar a resistência muçulmana (Hezbollah) do sul
do Líbano em 2006. Entretanto, muito menos se espera dos sauditas. Eles não têm
a expertise de guerra que Israel tem e muito menos o equipamento bélico de
última geração que o Estado Sionista possui.
Mas pelo menos, segundo os cálculos dos israelenses, os sauditas vão
manter o Hezbollah ocupado e vão desgastá-lo. Os israelenses (ou seja, “os
defensores dos sunitas”, como eles se autoproclamam) estão dançando de alegria.
Mas será que o Irã e o
novo aliado do Hezbollah, a Rússia, ficariam de braços cruzados? Não seria esse
o estopim que faltava?
*
Jornalista
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