sexta-feira, 15 de julho de 2016

Platão foi educador por excelência


"A educação deve possibilitar ao corpo e à alma toda a perfeição e a beleza que podem ter". Foi dessa maneira que Platão estabeleceu, de forma direta, sumamente objetiva, sem subterfúgios e nem solilóquios, em poucas palavras, a real finalidade desse processo, tão comentado e teorizado, mas tão pouco compreendido, posto que essencial para a formação humana. Ele via no filósofo não um teorizador, a lidar com complexas idéias abstratas, como muitos entendiam (e ainda hoje entendem), mas, sobretudo, um “educador”. Todavia em sentido amplo, holístico, completo, envolvendo a integralidade humana. Ou seja, levando em conta, simultaneamente, corpo e mente (que chamou de “alma”), já que um não existe sem o outro.

Para Platão, educação era algo muito além do que é compreendido hoje, universalmente (salvo raríssimas exceções). Ou seja, como mera forma de “adestramento” das pessoas para exercerem as diversas profissões que exijam conhecimentos específicos, como sempre entenderam e ainda entendem os responsáveis por políticas educacionais mundo afora. Fiel a essa sua visão, ele criou, em uma área nobre que havia recebido por herança, uma de suas principais obras, que só rivaliza em importância com suas idéias filosóficas, que foi a Academia. Ouso afirmar que se tratou da primeira escola superior da história. E foi tão preciosa, que lhe sobreviveu, e muitíssimo. Durou quase um milênio!!! Ademais nunca foi nem remotamente igualada em excelência, quer em seus métodos, quer em seu objetivo: o de “possibilitar ao corpo e à alma toda perfeição e beleza que podem ter”.           

O filósofo e escritor norueguês Jostein Gaarder destaca, em seu best-seller mundial “O mundo de Sofia”, qual era a principal característica dessa instituição, que a diferenciava de todas as outras, tanto as que vieram antes, quanto as criadas depois dela: “ Na Academia de Platão ensinava-se filosofia, matemática e ginástica. ‘Ensinar’’ talvez não seja o verbo mais adequado. Na Academia de Platão o que mais importava também era o diálogo vivo. Não foi por acaso que Platão escreveu seus textos em forma de diálogos”. Não havia, pois, como nas escolas tradicionais, a figura de um “professor”, em contraposição a alunos. “Todos” participavam – cada qual de acordo com as informações que dispunha – da busca do conhecimento. Pelo menos durante o tempo em que Platão comandou a Academia, esta não dispunha de qualquer doutrina especial para ensinar. Em vez disso, o filósofo (e provavelmente outros associados a ele) passavam problemas a serem estudados e resolvidos conjuntamente.

A filósofa gaucha Neiva da Silva Martinelli observa: “ (...) A filosofia é realizada na Academia... pela oralidade, a vida comunitária é regida pelos discursos e diálogos, pela educação da alma. O método socrático e a matemática (fonte em Pitágoras) são ciências necessárias à formação do filósofo, sendo que a matemática revela ordem, harmonia, fornecendo uma visão de perfeição do mundo inteligível”. Em outro trecho de seu excelente ensaio a propósito dessa modelar escola, ela destaca: “A Academia objetivava formar novos homens, no sentido transformador do amor ao bem, num ato de sublimação, visando o tornar-se virtuoso pela ação. O filósofo é aquele que escreve na alma. E o verdadeiro conhecimento é universal, refletido em si mesmo e de si toma consciência. Por isso nos diálogos há o comum acordo, onde se superam os pontos de vista individuais. Entretanto havia a liberdade de pensamento, de expressão. O fundamento da escola era o ato do diálogo, visto e tido como um modo de vida, pois o mesmo conduz à transformação do ser humano”. E não conduz?!

Neiva da Silva Martinelli lembra, ainda: “Platão diferencia os dois tipos de escrita que podem ser impressas: a escrita gravada na alma dos homens, e a escrita nos rolos de papel. E ele considera filósofo aquele que tenta escrever na alma dos homens. Por isso, atribuía grande importância à oralidade. Os escritos em papel são passíveis de diferentes interpretações, e capazes de despertarem os mais variados sentimentos. Uma palavra escrita que está simplesmente impressa em papel aparente, corresponderia, a uma cópia da cópia. Por isso, a alma tem tanta dificuldade de reconhecer, de lembrar-se do verdadeiro conhecimento”.

A Academia não fazia distinção de sexos. Ou seja, homens e mulheres recebiam a mesmíssima educação, inclusive a física. Ademais, pelo menos na gestão de Platão, era gratuita. Não cobrava mensalidade de ninguém. O professor Márcio Ferrari enfatiza, com rigorosa pertinência: “Platão acreditava que, por meio do conhecimento, seria possível controlar os instintos, a ganância e a violência. O acesso aos valores da civilização, portanto, funcionaria como antídoto para todo o mal cometido pelos seres humanos contra seus semelhantes. Hoje poucos concordam com isso; a causa principal foram as atrocidades cometidas pelos regimes totalitários do século 20, que prosperaram até em países cultos e desenvolvidos, como a Alemanha. Por outro lado, não há educação consistente sem valores éticos. Você já refletiu sobre essas questões? Até que ponto considera a educação um instrumento para a formação de homens sábios e virtuosos?”. Sim, leitor, até que ponto?

Boa leitura.

O Editor.

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