quarta-feira, 20 de julho de 2016

Luz interior


A comunicação – quando exercitada com amor, e com o genuíno desejo de, não apenas penetrar na mente das pessoas e sondar seus desejos, angústias e necessidades, mas, principalmente, lhes apontar caminhos para a solução dos seus problemas – é, mais do que um dom: é uma arte. Trata-se, porém, de imensa responsabilidade, principalmente quando o veículo utilizado é o texto e quando seu alvo é o público em geral, e não alguém específico.

Nunca se sabe em quais mãos a crônica, o artigo, o ensaio (ou seja lá que tipo de escrita que for) vão cair. Desconhece-se, por exemplo, o estado de espírito desse leitor no momento da leitura, sua condição de saúde (física, mental e/ou psicológica), se está feliz; se, ao contrário, sofre por alguma razão qualquer (perda de um ente querido, demissão no emprego, doença própria ou de alguém da família etc.etc.etc.); se é ou não influenciável pelo que ouve ou que lê e assim por diante. Mesmo assim, apesar de todos esses cuidados, às vezes, por imperícia (e juro que não por má-fé), acabo por ser causador de ainda mais sofrimento a alguém que já esteja sofrendo. Imaginem se não me cercasse de tanta cautela!

Podemos, com o nosso texto, tanto consolar, animar e incutir otimismo e vontade de vencer em quem nos lê, quanto levá-lo ao desânimo, à depressão, ao desespero e, em casos extremos, até ao suicídio. E raramente temos ciência dos efeitos e do resultado do que escrevemos.

Por isso, sempre que me preparo para este ato de comunicação, penso, em primeiro lugar, nessa possibilidade. Analiso se o tema é construtivo, se a colocação é adequada e se a exposição das idéias está clara, sem qualquer ambigüidade. Caso não sejam, apago o que eventualmente já esteja escrito e parto para outro tema, cercado das mesmíssimas cautelas. Se, pelo contrário, sentir que satisfiz todas as condições auto-impostas, dou a crônica (que é o gênero de que mais me utilizo para comunicação com o público) por concluída.

Não raro, mesmo com todos esses cuidados, não me sinto seguro do que escrevi. Procuro em minha biblioteca algum livro sobre o assunto para me esclarecer melhor. E refaço o texto, mesmo que já esteja atrasado na sua entrega ao editor. Quando o concluo de novo, peço a alguém da minha plena confiança que o leia, com o olhar mais crítico possível, e que me aponte todos os defeitos que encontrou. Se o assunto, ou a sua abordagem, forem por demais polêmicos, busco mais de uma opinião (já houve casos de pedi-la a até dez pessoas), antes de me dar por satisfeito e encaminhar o texto em questão para divulgação em sites e jornais, ou de expô-lo em meus blogs.

O que procuro, ao escrever, é uma certa luz interior, que me desperte empatia com os semelhantes. É colocar no texto todos os princípios que me foram incutidos por meus pais, por meus mestres e pelos milhares de escritores que li e que me tornaram no que sou. Na maioria das vezes, tenho conseguido isso, a julgar pelos comentários sobre minhas crônicas, feitos na internet ou nas cartas e nos e-mails que recebo. Às vezes, porém...Dou magníficos escorregões e recebo ásperas reprimendas públicas, por esses mesmos meios.

Essas críticas, apesar de machucarem o ego, são preciosíssimas, até aquelas mal-educadas e com palavras chulas, feitas com o objetivo deliberado de me ridicularizar. Procuro aceitá-las com humildade e evito polemizar. É verdade que às vezes a vaidade fala mais alto e dou respostas um tanto quanto atravessadas para os mais atrevidos. Tolice minha, claro!

Na minha atividade de comunicador, busco pautar minhas ações por estas palavras, ditas por um dos seres humanos mais preciosos e altruístas que já existiram, o Dr. Albert Schweitzer – que dedicou mais de 60 anos de sua longa e produtiva vida (morreu com 92 anos de idade) a curar leprosos em um tosco hospital em plena selva africana –: “Quando existe dentro de alguém a luz interior, ela transparece e se irradia. Então nos reconhecemos mutuamente, mesmo na escuridão, enquanto caminhamos lado a lado”.

Li essa citação há muito tempo, há 51 anos, na edição de 2 de outubro de 1965 da revista “O Cruzeiro”, que há muito já não existe. O Prêmio Nobel da Paz de 1952 disse essas palavras a respeito da esposa, Helena Breslau, que o acompanhou até o último momento nesse seu sublime sacerdócio. E elas foram citadas pela repórter Leda Barreto, na matéria “Schweitzer, morre um feiticeiro branco”, publicada pela referida revista.

É essa luz interior que busco todos os dias, quando me preparo para escrever, o que faço, pontualmente, há mais de quatro décadas, profissionalmente ou não. Não sei se já consegui estabelecer, em alguma ocasião, essa empatia com o leitor, mas continuo tentando. Para isso, cultivo o mais que posso o otimismo e valores positivos, mesmo quando as circunstâncias me aprontam das suas.

Não tenho o direito de ser pessimista, amargo ou desanimado e muito menos de difundir esses sentimentos através dos meus textos! E isto até por um motivo egoísta, para a preservação da minha saúde, pois como constatou o filósofo norte-americano Will Durant, em seu clássico “Filosofia da Vida”: “A fé, a esperança e o amor parecem expandir-se em cada célula do nosso corpo; a dúvida, o medo e o ódio contraem-nos os tecidos, como se fossem venenos – e fisicamente são venenos”. Como não quero me envenenar e muito menos envenenar meus leitores... procuro seguir a trilha do bom-senso.


Boa leitura!



O Editor.

Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk

Um comentário:

  1. Ler escritos de outras pessoas nunca me causaram dor, já comentários sobre meus textos, sim. Para não criar inimigos, tenho o bom-senso de não retrucar, mas quando a intimidade permite, posso ter essa ousadia. Quem lê um comentário oposto ao que se acabou de dizer, pensa que o outro não entendeu, mas o mais provável é que discorde. Tão normal a discordância. A carapuça me assentou, ainda que diga a verdade sem asperezas.

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