sábado, 6 de fevereiro de 2010




Das Mulheres (um elogio)

* Por Fernando Mariz Masagão

“...quero te pegar no colo, te deitar no solo e te fazer mulher.”
Antonio Gilson Porfírio.


Há nas mitologias grande sabedoria e, à parte um grande número de consideráveis besteiras engendradas pela razão impúbere, a inteligência humana já percebia a essência das coisas e fatos que animam as ocorrências da vida de maneira mais sutil. Digo até que a própria inépcia da razão descortinava outro lado da vida, o qual fomos perdendo ao longo da nossa curta existência.

Interrompo-me neste ponto para matar na raiz uma digressão, impertinente como todas. Neste papel não caberia especular sobre como se desenvolveu a inteligência – deixemos este assunto para outro dia, outro estado de espírito – pois aqui, hoje, nos ocuparemos tão-somente da mulher, o que, como não poderia deixar de ser, tomará todo o espaço da nossa atenção. Aliás, como ser metafísico na presença de uma dama? E a mulher é a dama da existência. Sei que falo na mulher idealizada e que estou sendo um tanto quanto cafona. Mas, convenhamos, nós todos, por mais que nos esforcemos, somos um tanto quanto cafonas. Gosto e espírito têm as estrelas e a lua. Chique é o sol. Os seres humanos são a pisada na bola de Deus (da parte Dele em relação à criação, e da parte dos homens em relação à Ele, como preferirem). Sei até de mulheres que se ofenderiam ao serem chamadas de damas. Mas toda mulher, sem nenhuma exceção, é uma dama. Pode ter ela alma de beque central do Palmeiras; pode ser uma capitalista insaciável pisando tudo à sua frente, pode ter ela enterrado na modernidade sua feminilidade ou, simplesmente, ser uma puta nata. Não importa. No fundo, são todas umas Julietas congênitas.

Às vezes é preciso lançar mão de algumas técnicas psiquiátricas – como a camisa de força e a água gelada – para ter com elas. Mas, de modo geral, nada que a boa e velha combinação de flores e pontapés habilmente alternados não resolva. Neste ponto, leitores (e explico-me unicamente para as mulas dos homens, já que esta explicação seria ridiculamente desnecessária para as mulheres), lanço mão de duas metáforas, uma para significar Eros, a outra, Pathos – amor e paixão, meninas, amor e paixão. Tudo muito simples, não? Não. Se há alguma coisa mais conturbada e sofrida do que uma paixão, é o amor; e muito mais do que ambos juntos, é a mulher.

Eu falava do homem antigo e retomo. Dizia eu que o pensamento arcaico intuía verdades que transformavam em poesia (o mito vem posteriormente das necessidades políticas). Peguemos de exemplo o exemplo eterno da psique humana: Eva. Terá sido por causa da ignorância tacanha de nossa limitada inteligência que foi identificada na mulher a origem dos pecados? Bem se poderia dizer que por causa de uma desmiolada não se pode julgar todo o gênero. Argumentos virão em defesa da mulher e se dirá que a lenda é apenas o reflexo da mentalidade machista, de um povo machista, numa época machista. Concordo integralmente. Mas e Pandora? E Salomé? E a mulher de Tatau? Povos diferentes, épocas diferentes, culturas diferentes... mas a mesmíssima mulher.

Não foi à toa que o homem antigo escolheu a noite escura para representar suas inquietações com a morte e o claro dia para louvar a fertilidade da vida. Também não foi por acaso que a mulher foi identificada como a causa dos maiores problemas. Não há equívocos, meus caros, toda mulher é encrenca para o homem. E por quê? Porque o homem é fraco na sua substância. A culpa da mulher é indireta. E por que o homem é fraco? Porque ele descobriu o fogo e domesticou a natureza; escravizou seus semelhantes e reinventou infinitamente a morte; ganhou os mares e o espaço; concedeu valores à pedras e papéis; cantou, desenhou, escreveu, reescreveu e reescreveu tudo de novo, tudo só para que a mulher o amasse como ele a ama. O homem será cativo para sempre da beleza feminina e amará a mulher como nada mais até o fim dos seus dias. E nós bem sabemos que todos os apaixonados fazem merda, muita merda. Entenderam? Ou devo começar do zero?

Agora, se a mulher também ama o homem já é questão mais difícil. Penso que sim, mas de maneira oblíqua e dissimulada, pois são também todas umas Capitus. Mas, por ora, é melhor nos atermos apenas aos aspectos materiais.

*Fernando Mariz Masagão é músico, dramaturgo, poeta e colaborador de publicações online sobre arte, com crônicas e críticas musicais. Guitarrista e vocalista de bandas de rock'n'roll, tem formação clássica vigorosa, em cursos de regência sinfônica, apreciação musical e instrumentação.

2 comentários:

  1. O peso do pecado original...
    Ser mulher, ônus ou bônus?
    Ser mulher é uma dádiva e que
    venham as reencarnações, em todas
    quero voltar como mulher.
    Ótimo texto.
    Abraços

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  2. Discordo de boa parte da sua visão, especialmente do fato do homem ter "domesticado a natureza". Onde acontece isso? Sobre amor e paixão, não generalizaria por gênero(a palavra viria do sexo do indivíduo?). A dissimulação cabe melhor aos homens. Ou não?

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