Os amantes
* Por
Julio Cortazar
Tradução de José Jeronymo Rivera
Quem os vê
andar pela cidade
se todos
estão cegos?
Eles se
tomam as mãos: algo fala
entre seus
dedos, línguas doces
lambem a
úmida palma, correm pelas falanges,
e acima a
noite está cheia de olhos.
São os
amantes, sua ilha flutua à deriva
rumo a
mortes na relva, rumo a portos
que se abrem
nos lençóis.
Tudo se
desordena por entre eles,
tudo
encontra seu signo escamoteado;
porém eles
nem mesmo sabem
que enquanto
rodam em sua amarga arena
há uma pausa
na criação do nada
o tigre é um
jardim que brinca.
Amanhece nos
caminhões de lixo,
começam a
sair os cegos,
o ministério
abre suas portas.
Os amantes
cansados se fitam e se tocam
uma vez mais
antes de haurir o dia.
Já estão
vestidos, já se vão pela rua.
E só então,
quando estão
mortos, quando estão vestidos,
é que a
cidade os recupera hipócrita
e lhes impõe
os seus deveres quotidianos.
*
Poeta e escritor argentino.
Nenhum comentário:
Postar um comentário