segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Filhos de égua

* Por Ana Deliberador


Quando mudamos do Estado de São Paulo para o Paraná, em 1929, eu tinha minha primeira filha Maria Annita com um ano. O José não quis que eu viesse com ela antes, sem estar mais forte, pois isto era  mato, não havia recurso perto, Sertanópolis, que hoje é perto porque temos estradas asfaltadas, naquele tempo era longe pois a estrada era pura terra e quando chovia era puro barro, que só andando a cavalo.

Então, como começo de vila precisava de uma capelinha, foi feita bem pequena. Era onde eu rezava o terço. Resolvi juntar uns seis meninos filhos de pais que moravam na futura cidade e então resolvi ensinar um pouco de religião.    Quem era Deus, quem havia criado o  mundo…

Depois comecei a ensinar a eles uma das orações que até hoje eu acho que nos alivia de muita preocupação, que era Salve Rainha.

Quando achei que podia perguntar a eles se tinham guardado um pouco dela, pedi ao Braulino, que era filho do casal de índios  Cisino e Braulina, e o menino olhou muito sério para mim, começou muito bem, até a parte que diz “filhos de Eva”.
–“Filhos de Égua” – ele disse.

Levei um choque e fiquei tão desnorteada que acabei aquele dia o meu catecismo mais cedo e fui pra casa contar ao José o que tinha acontecido e que para ensinar eu não dava mesmo, pois achei que o menino não tinha entendido nada sobre religião.

Mas desculpei porque ele era criança e criança é de Deus.

* Professora, pintora e escritora


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