Preciso
de uma psicóloga
*
Por Gustavo do Carmo
Não
estou louco. Mas preciso de um psicólogo para desabafar todas as
minhas angústias, antes que eu realmente enlouqueça. Estou com
dificuldades para dormir. Sou cobrado e criticado por dormir fora do
horário em que todos dormem. Não quero desabafar com amigos e
seguir religião. Minha mãe já está muito idosa (aliás, ela está
até doente, um dos motivos da minha ansiedade), meu pai é
hipertenso (outra preocupação) e minha irmã só me põe para
baixo.
Quero
um profissional, pois este tem código de ética e se contar para os
outros (a não ser para o seu próprio terapeuta, porque ele também
precisa descarregar) vai preso, segundo ouvi uma vez da Narcisa
Tamborideguy. Ou melhor, uma profissional, porque prefiro me
consultar com mulheres. De preferência, bem boazinha. E bonita.
Claro que senhoras também servem. Mas com mulheres bonitas, me sinto
mais à vontade para desabafar.
Tenho
medo de encontrar aqueles psicólogos sinceros, que adoram dar bronca
e me culpar pelos meus próprios problemas. Como aconteceu uma vez em
Cabo Frio. Estava com este mesmo problema de agora. Fui procurar uma
em frente ao meu prédio. E ela me disse que eu sou fracassado porque
sou indisciplinado. Me deu vontade de ir embora imediatamente e jogar
o dinheiro no chão para ela catar. Saí mais para baixo do que já
estava.
Tentei
me consultar com uma amiga de uma vizinha de lá. Mas não a
encontrei mais. E também não queria deixar minha mãe sozinha em
casa, em Cabo Frio. Cheguei a perguntar por WhatsApp o preço de uma
lá também, mas não tive coragem de marcar consulta. Tive medo de
gastar dinheiro.
Eu
não quero homem porque tenho medo de sair na porrada caso encontre
algum com o mesmo método da psicóloga sincera que eu citei acima. A
não ser que seja um antigo colega de faculdade que tinha largado o
curso de comunicação logo no primeiro período para fazer
psicologia. Nem sei se ele fez. Nem sei se ele se formou e atende.
Depois
da psicóloga sincera de Cabo Frio não me consultei com mais ninguém
até conversar com a amiga da vizinha. As duas com quem eu mais me
consultei foram indicadas pelos meus pais. A primeira, por um primo
do meu pai, atendia em sua residência em Copacabana. Passava uma
hora mais conversando sobre banalidades do que sobre os meus
problemas. E ainda era interrompido pelo cachorro de estimação dela
e a filha que se despedia para sair da faculdade. Cansado do pouco
resultado (ela tinha prometido umas atividades, inclusive regressão,
que nunca cumpriu), descarreguei minha raiva nela, ameaçando
processá-la e denunciá-la ao Conselho de Psicologia. Depois, vi que
eu estava errado. Pedi desculpas depois, mas ela fingiu que perdoou
(aí entra aquela história da minha crônica A Farsa do Perdão:
mandam você perdoar, mas os outros não perdoam). Aliás, faz vinte
dias que a procurei, reforçando o meu pedido de desculpas, e
ela não respondeu.
A
segunda era psicóloga do INCA (Instituto Nacional do Câncer) e
atendia minha tia que sofria de câncer e acabou morrendo na época.
Foi a minha mãe, que cuidava dela (minha tia), quem me indicou.
Doutora Sílvia, esta sim, faço questão de citar o nome, foi a
melhor delas. Foi a que diagnosticou que eu estava com depressão
após alguns testes de formulário que fez comigo. Ela me atendia num
prédio comercial no Flamengo. Mas, no ano seguinte, a Dra. Sílvia
decidiu não me atender mais. Alegou cansaço em sair de Niterói,
onde morava, até o Flamengo. Ela já era uma senhora. Isso foi há
uns dez anos atrás.
Fiz
uma nova tentativa (aí fui eu mesmo que procurei) na clínica do meu
plano de saúde. Me atendeu uma senhora muito fria que me desmontou
quando perguntou porque eu não quero (falo no presente, mesmo) fazer
concurso público, que o meu pai me cobrava na época. Fiquei sem
resposta. Me senti culpado, mesmo tendo razão e talvez ela pudesse
compreender minha recusa. Nunca mais voltei.
Pelo
mesmo motivo, também parei de ir a uma segunda, só que psiquiatra,
em Copacabana. Sei lá, senti que estas duas me condenaram por eu não
querer fazer concurso público. Não quero fazer porque não sou
inteligente o suficiente para fazer sem estudar, não quero alimentar
indústria de cursinho, não quero dar dinheiro para a Folha
Dirigida, nem Degrau Cultural e quero trabalhar numa coisa que eu
entenda. Ah, e também não quero ser motivo de chacota por ser
honesto e muito menos ser obrigado a aderir a alguma greve ou fazer
piquete.
Voltando
ao assunto da psicologia: antes desta psiquiatra de Copacabana, já
tinha me consultado com outras duas. Uma atendia pelo meu plano de
saúde, na Tijuca. Mas parecia popular e burocrática demais. Ela
tinha marcado a consulta para as duas da tarde e só foi me atender
às sete da noite, quando já tinha muita gente impaciente na fila
atrás de mim. Até a vendedora de laboratório ficou impaciente:
virou os olhos e ficou fazendo careta. A doutora só me passou um
Rivotril em gotas. Nunca mais fui lá.
Depois
fui à clínica da famosa psiquiatra escritora. Por já ser famosa,
ela já não atendia mais novos pacientes. Fui atendido por uma
morena bonita, na faixa dos 40 anos, mas muito arrogante. Ela me
passou um exame de cintilografia após eu dizer que tinha déficit de
atenção. No exame não deu nada. Disse que eu não tinha nada. Me
senti um malandro querendo um atestado para não trabalhar. Depois
que eu falei que não tinha nada para fazer ali, ela admitiu que eu
tenho o distúrbio e me deu o atestado. Parece até que eu plantei o
diagnóstico. Detalhe: a consulta custava 300 reais (muito caro na
época, hoje uma consulta médica já custa quase isso).
Depois,
ela me indicou uma psicóloga da mesma clínica e com o mesmo nome
seu. Sem resultado depois de pagar 600 reais por quatro semanas que
eu fui, parei de ir.
Eu
tento respeitar a psicologia, mas não consigo. Acho que não adianta
nada. Ninguém vai conseguir mudar o meu jeito de ser. Mas preciso de
uma psicóloga para desabafar todas as minhas angústias que eu não
posso contar nesta crônica. Só que eu não tenho coragem. Tenho
medo de reencontrar os mesmos aborrecimentos que eu citei aqui.
*
Jornalista e publicitário de formação e escritor de coração.
Publicou o romance “Notícias que Marcam” pela Giz Editorial (de
São Paulo-SP) e a coletânea “Indecisos - Entre outros contos”.
Bookess
- http://www.bookess.com/read/4103-indecisos-entre-outros-contos/ e
PerSe
-http://www.perse.com.br/novoprojetoperse/WF2_BookDetails.aspx?filesFolder=N1383616386310
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