Abaixo a tirania da imposição
* Por Mara Narciso
O mundo está repleto de déspotas que, em diferentes graus, impõem suas vontades nos tempos e espaços. O regime de governo que suprime as liberdades, a religião que se utiliza do medo para forçar obediências absurdas, a obrigação do politicamente correto, a sisuda patrulha ideológica, a eterna exigência da magreza, e o culto ao belo e ao jovem são ditaduras que esmagam aquele que se opuser a elas.
Quem nasce feio demais, com feições tão horrendas que a cirurgia plástica não tem como melhorar, é obrigado a viver, mesmo contra a sua vontade, enfeando o mundo afora. Estranhas tribos instalam-se, notadamente nas metrópoles, em busca da uniformidade do horrendo, daquilo que mete medo ou causa horror. Do mesmo modo que a juventude já se divertiu assistindo às maldades de Freddie Krueger ou de Jason no filme “Sexta-Feira 13”, pessoas esforçam-se para ficar horripilantes. Esse tipo de comportamento afugenta os diferentes e atrai os semelhantes. Como parece estar em curso o quanto mais feio melhor, começa a disputa, uma espécie de corrida para ver quem fica mais disforme, ou quem melhor se assemelha aos monstros do cinema.
Algum motivo para não se cultuar o assustadoramente grotesco? O feio naturalmente desagrada aos cinco sentidos. A estética do feio também seria estética? O aspecto desagradável é o que caracteriza o feio, e quando ele foge intencionalmente do que se convencionou chamar de belo, harmônico ou agradável, está-se construindo a ditadura do horror. Fique indiferente se for capaz. Veja, depois feche os olhos, cubra o rosto com as mãos, e não volte a olhar, caso consiga. Repulsa ao invés de atração, pouco importa, pois os olhos insistem em querer ver.
Quem não pode combater a feiúra, quando ela é grande demais e irreversível, adere a ela com entusiasmo e se esforça para ampliar a sua legião. Da mesma forma que os gordos podem ser rejeitados pelos grupos magros, os feios detestam o que é belo, e se deliciam com o culto ao disforme, ficando em êxtase diante do medonho ou tudo que cause arrepios de medo. Alegria acontece quando causa repulsa e aversão com seus modos e imagem aterradores. A aparência que buscava ser original e diferente acaba se uniformizando, e os quase gêmeos passam a se equivaler na capacidade de assustar.
Operam massacres contra pessoas que se utilizam da imagem convencional, e roupas usuais. Aterrorizar os incautos só tem sabor quando o feio é feiíssimo e o medo é autêntico. Quem vê o belo sente-se bem, entrando em deleite e calma contemplação, não duvidando estar diante da perfeição, daquilo que preenche o conceito de beleza. Porém, quem se depara com o horrendo, sabe que a feiúra é ilimitada, pois é possível ser cada vez mais feio, num autêntico festival de obscena deformação. O impacto e a importância do feio são o contraponto para o belo, que não existiria sem o seu oposto, e vice-versa.
Um grupo pode desejar sobrepujar o outro, impondo suas modas, modos e desejos. Castrar vontades diferentes é uma forma de ampliar o poder. E os muito feios parecem estar se mobilizando para derrubar a ditadura da beleza e impor seus conceitos de ser, vestir e se apresentar. Não será preciso citar características internas e externas de deformações físicas, cores, acessórios e roupas para mostrar o que o senso comum considera feio. A falta de citação não é omissão, e sim tem por objetivo não querer derrubar uma ditadura para colocar outra. Que sentido faz não aceitar as regras da maioria para em seguida obrigar alguém a seguir novas regras? E logo as suas?
Convicções são como paradigmas: servem para ser pisoteados. Nada além. Abaixo as ditaduras. Para cima as liberdades individuais. E que os excessos de autoridade dos déspotas e tiranos de todas as cores se aposentem, mesmo daqueles que se dizem pacifistas.
* Médica, jornalista e autora do livro “Segurando a Hiperatividade”.
O mundo está repleto de déspotas que, em diferentes graus, impõem suas vontades nos tempos e espaços. O regime de governo que suprime as liberdades, a religião que se utiliza do medo para forçar obediências absurdas, a obrigação do politicamente correto, a sisuda patrulha ideológica, a eterna exigência da magreza, e o culto ao belo e ao jovem são ditaduras que esmagam aquele que se opuser a elas.
Quem nasce feio demais, com feições tão horrendas que a cirurgia plástica não tem como melhorar, é obrigado a viver, mesmo contra a sua vontade, enfeando o mundo afora. Estranhas tribos instalam-se, notadamente nas metrópoles, em busca da uniformidade do horrendo, daquilo que mete medo ou causa horror. Do mesmo modo que a juventude já se divertiu assistindo às maldades de Freddie Krueger ou de Jason no filme “Sexta-Feira 13”, pessoas esforçam-se para ficar horripilantes. Esse tipo de comportamento afugenta os diferentes e atrai os semelhantes. Como parece estar em curso o quanto mais feio melhor, começa a disputa, uma espécie de corrida para ver quem fica mais disforme, ou quem melhor se assemelha aos monstros do cinema.
Algum motivo para não se cultuar o assustadoramente grotesco? O feio naturalmente desagrada aos cinco sentidos. A estética do feio também seria estética? O aspecto desagradável é o que caracteriza o feio, e quando ele foge intencionalmente do que se convencionou chamar de belo, harmônico ou agradável, está-se construindo a ditadura do horror. Fique indiferente se for capaz. Veja, depois feche os olhos, cubra o rosto com as mãos, e não volte a olhar, caso consiga. Repulsa ao invés de atração, pouco importa, pois os olhos insistem em querer ver.
Quem não pode combater a feiúra, quando ela é grande demais e irreversível, adere a ela com entusiasmo e se esforça para ampliar a sua legião. Da mesma forma que os gordos podem ser rejeitados pelos grupos magros, os feios detestam o que é belo, e se deliciam com o culto ao disforme, ficando em êxtase diante do medonho ou tudo que cause arrepios de medo. Alegria acontece quando causa repulsa e aversão com seus modos e imagem aterradores. A aparência que buscava ser original e diferente acaba se uniformizando, e os quase gêmeos passam a se equivaler na capacidade de assustar.
Operam massacres contra pessoas que se utilizam da imagem convencional, e roupas usuais. Aterrorizar os incautos só tem sabor quando o feio é feiíssimo e o medo é autêntico. Quem vê o belo sente-se bem, entrando em deleite e calma contemplação, não duvidando estar diante da perfeição, daquilo que preenche o conceito de beleza. Porém, quem se depara com o horrendo, sabe que a feiúra é ilimitada, pois é possível ser cada vez mais feio, num autêntico festival de obscena deformação. O impacto e a importância do feio são o contraponto para o belo, que não existiria sem o seu oposto, e vice-versa.
Um grupo pode desejar sobrepujar o outro, impondo suas modas, modos e desejos. Castrar vontades diferentes é uma forma de ampliar o poder. E os muito feios parecem estar se mobilizando para derrubar a ditadura da beleza e impor seus conceitos de ser, vestir e se apresentar. Não será preciso citar características internas e externas de deformações físicas, cores, acessórios e roupas para mostrar o que o senso comum considera feio. A falta de citação não é omissão, e sim tem por objetivo não querer derrubar uma ditadura para colocar outra. Que sentido faz não aceitar as regras da maioria para em seguida obrigar alguém a seguir novas regras? E logo as suas?
Convicções são como paradigmas: servem para ser pisoteados. Nada além. Abaixo as ditaduras. Para cima as liberdades individuais. E que os excessos de autoridade dos déspotas e tiranos de todas as cores se aposentem, mesmo daqueles que se dizem pacifistas.
* Médica, jornalista e autora do livro “Segurando a Hiperatividade”.
Apoiado, Doutora. Ser diferente tem que ser normal!! Abraços e parabéns pelo texto.
ResponderExcluirÓtimo, Mara! A diversidade deveria ser vvienciada sem tirania, sem imposições por parte de quem quer que seja. Pena que a realidade é diferente. Abraço.
ResponderExcluirLiberdade acima de tudo.
ResponderExcluirAcima da forma, da cor, da simetria.
Ótimo texto Mara.
Abraços
Agradecida, gente, pela leitura e pelos acréscimos de interpretação que são muito bem-vindos. Obrigada!
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