Diário da Perua
Os desejáveis e os casáveis
* Por Ruth Barros
Anabel acordou no frio de domingo com um telefonema às 10h. Depois de ter conseguido abrir caminho entre fartas camadas de cobertores para atender, dei de cara, ou melhor, de orelha, com uma amiga querida, que mora em Brasília. Ela apresentou uma dúvida tão angustiada que conseguiu colocar meus parcos neurônios para funcionar mesmo em baixa temperatura. Como estou convencida de que a humanidade tem lá uma meia dúzia de uns oito ou dez problemas, sempre os mesmos, que se repetem sob diversos disfarces, vou compartilhar com meus amados leitores a conversa, que foi das mais instrutivas.
Minha amiga tem dois pretendentes, coisa que à primeira vista não configura problema, seria antes solução nesse mundo em que a maioria se queixa, não sem razão, de falta de homem. Acontece que um é um sedutor, daqueles que preparam jantares fantásticos, manda flores, transa divinamente, jura que não consegue viver sem ela, que amanhã a festa continua etc. etc. e some. O outro é romântico, beija mal, quer relação séria, colocar os filhos respectivos em contato, fazer programa família etc. etc. sempre dá assistência e cumpre o prometido quando diz que vai telefonar e aparecer.
Qual é a dúvida de minha amiga? Os mais atilados já devem ter adivinhado. Ela está louca para dispensar o bonzinho e quer amarrar para todo sempre o gostosão. Detalhe: ele some e ela fica na dela. Daí alguns dias reaparece o bofe como nada tivesse acontecido, dizendo que “foi obrigado a engolir o orgulho para procurá-la, que ela faz gato e sapato dele etc. etc. etc”.
Em que pese o grande número de etcs dessas mal traçadas linhas, fui obrigada a reconhecer: estamos diante de um profissional. Ele joga o jogo dele, aparece quando quer e aparentemente o mérito fica sendo dela, ou seja, como se ela decidisse quando e se vai vê-lo. Devo confessar que fiquei fã do cara, sempre gostei de bons profissionais seja lá em que área atuem – médicos, carpinteiros, políticos, todos os que sabem funcionar bem são gente que faz. Só que, como expliquei para a aflita, profissional de sedução não é tipo mais indicado para casar.
Primeiro, se ele tivesse intenções de continuidade, apareceria e cumpriria os combinados, ninguém investe em uma relação séria sumindo e mandando flores exóticas daí alguns dias. Depois, esses sujeitos tão bem dotados (sem trocadilho), tão encantadores, tão cheios de lábia, gostam de espalhar seus dons pelo mundo, ou seja, entre a mulherada, até para testar se continuam funcionando. Isso configura uma porta de entrada para o desassossego e o aluguel – vamos e venhamos, é duro aturar homem galinha.
Agora, jogar a toalha e amarrar um choco que não dá tesão, também não é rima nem solução. Depois de ponderar esses pontos todos com minha amiga, chegamos à conclusão que o melhor é ficar com o sedutor profissional e esquecer a idéia de casamento, pelo menos com ele. E nada de ir atrás, de ficar telefonando, que o cara pelo menos tome a iniciativa, quando nada para continuar inflando o ego dela. Já que a transa toda rola tão bem, para que transformá-la em posse? O usufruto, nesses casos, é bem melhor. E tem o mérito de não deixá-la carente, segurando bem a onda até o dia que algum príncipe que conjugue sedução e seriedade em doses certas apareça.
Anabel Serranegra acha que um grande amor continua sendo ideal de quase toda a humanidade, apesar de a maior parte continuar dando com os burros n’água
* Maria Ruth de Moraes e Barros, formada em Jornalismo pela UFMG, começou carreira em Paris, em 1983, como correspondente do Estado de Minas, enquanto estudava Literatura Francesa. De volta ao Brasil trabalhou em São Paulo na Folha, no Estado, TV Globo, TV Bandeirantes e Jornal da Tarde. Foi assessora de imprensa do Teatro Municipal e autora da coluna Diário da Perua, publicada pelo Estado de Minas e pela revista Flash, com o pseudônimo de Anabel Serranegra.
Os desejáveis e os casáveis
* Por Ruth Barros
Anabel acordou no frio de domingo com um telefonema às 10h. Depois de ter conseguido abrir caminho entre fartas camadas de cobertores para atender, dei de cara, ou melhor, de orelha, com uma amiga querida, que mora em Brasília. Ela apresentou uma dúvida tão angustiada que conseguiu colocar meus parcos neurônios para funcionar mesmo em baixa temperatura. Como estou convencida de que a humanidade tem lá uma meia dúzia de uns oito ou dez problemas, sempre os mesmos, que se repetem sob diversos disfarces, vou compartilhar com meus amados leitores a conversa, que foi das mais instrutivas.
Minha amiga tem dois pretendentes, coisa que à primeira vista não configura problema, seria antes solução nesse mundo em que a maioria se queixa, não sem razão, de falta de homem. Acontece que um é um sedutor, daqueles que preparam jantares fantásticos, manda flores, transa divinamente, jura que não consegue viver sem ela, que amanhã a festa continua etc. etc. e some. O outro é romântico, beija mal, quer relação séria, colocar os filhos respectivos em contato, fazer programa família etc. etc. sempre dá assistência e cumpre o prometido quando diz que vai telefonar e aparecer.
Qual é a dúvida de minha amiga? Os mais atilados já devem ter adivinhado. Ela está louca para dispensar o bonzinho e quer amarrar para todo sempre o gostosão. Detalhe: ele some e ela fica na dela. Daí alguns dias reaparece o bofe como nada tivesse acontecido, dizendo que “foi obrigado a engolir o orgulho para procurá-la, que ela faz gato e sapato dele etc. etc. etc”.
Em que pese o grande número de etcs dessas mal traçadas linhas, fui obrigada a reconhecer: estamos diante de um profissional. Ele joga o jogo dele, aparece quando quer e aparentemente o mérito fica sendo dela, ou seja, como se ela decidisse quando e se vai vê-lo. Devo confessar que fiquei fã do cara, sempre gostei de bons profissionais seja lá em que área atuem – médicos, carpinteiros, políticos, todos os que sabem funcionar bem são gente que faz. Só que, como expliquei para a aflita, profissional de sedução não é tipo mais indicado para casar.
Primeiro, se ele tivesse intenções de continuidade, apareceria e cumpriria os combinados, ninguém investe em uma relação séria sumindo e mandando flores exóticas daí alguns dias. Depois, esses sujeitos tão bem dotados (sem trocadilho), tão encantadores, tão cheios de lábia, gostam de espalhar seus dons pelo mundo, ou seja, entre a mulherada, até para testar se continuam funcionando. Isso configura uma porta de entrada para o desassossego e o aluguel – vamos e venhamos, é duro aturar homem galinha.
Agora, jogar a toalha e amarrar um choco que não dá tesão, também não é rima nem solução. Depois de ponderar esses pontos todos com minha amiga, chegamos à conclusão que o melhor é ficar com o sedutor profissional e esquecer a idéia de casamento, pelo menos com ele. E nada de ir atrás, de ficar telefonando, que o cara pelo menos tome a iniciativa, quando nada para continuar inflando o ego dela. Já que a transa toda rola tão bem, para que transformá-la em posse? O usufruto, nesses casos, é bem melhor. E tem o mérito de não deixá-la carente, segurando bem a onda até o dia que algum príncipe que conjugue sedução e seriedade em doses certas apareça.
Anabel Serranegra acha que um grande amor continua sendo ideal de quase toda a humanidade, apesar de a maior parte continuar dando com os burros n’água
* Maria Ruth de Moraes e Barros, formada em Jornalismo pela UFMG, começou carreira em Paris, em 1983, como correspondente do Estado de Minas, enquanto estudava Literatura Francesa. De volta ao Brasil trabalhou em São Paulo na Folha, no Estado, TV Globo, TV Bandeirantes e Jornal da Tarde. Foi assessora de imprensa do Teatro Municipal e autora da coluna Diário da Perua, publicada pelo Estado de Minas e pela revista Flash, com o pseudônimo de Anabel Serranegra.
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