Um autor-ator bem sucedido
O teatro é uma das formas de arte mais antigas, mais importantes e mais fascinantes que existem. Foi, por muito tempo, notadamente na Grécia, instrumento por excelência de comunicação. Informa, instrui, conscientiza e ajuda a formar cidadãos resolvidos e integrados. É, também, um dos gêneros literários dos mais complexos, todavia mais gratificantes. Imaginem a satisfação de um escritor ao ver seus personagens, frutos exclusivos de sua imaginação, ganharem formas, movimento, vida e protagonizarem as histórias que ele inventou! Considero isso não apenas gratificante, como emocionante.
Sempre achei que um ator, aquele que recria as pessoas “imaginárias” das peças e que vive seus dramas, tragédias e comédias como se fossem seus, pessoais – como se tais situações fictícias estivessem acontecendo com ele – tem maior facilidade de produzir as histórias a serem representadas nos palcos. Claro que não são todos os que têm o talento da escrita. E nem por isso são piores atores do que os que têm. Os que gostam (e sabem) escrever histórias, contudo, têm a vantagem de conhecer as dificuldades de interpretar determinados personagens. Sabem as agruras para reproduzir certos diálogos e dar-lhes naturalidade e, portanto, verossimilhança. Escrevem, pois, via de regra, os que sejam mais apropriados aos atores.
Pois bem, um misto de autor e ator simultaneamente, o norte-americano Bruce Norris, conquistou um dos mais cobiçados e reputados prêmios do mundo, o Pulitzer de 2011, na categoria “Drama”. Sua peça “Clayburn Park”, que fez enorme sucesso em sua ainda recente temporada londrina, onde ganhou vários prêmios, foi a escolhida pelo júri dessa premiação. Aborda, de forma irreverente, bem-humorada (embora de um humor um tanto cáustico) o sempre (e ainda) difícil relacionamento interracial nos Estados Unidos. E situa seu enredo numa época em que ele era ainda mais complicado do que atualmente, ou seja, em meados dos anos 50.
Bruce Norris é tido como o autor do “politicamente incorreto”. Em suas peças, põe, invariavelmente, o dedo nas principais e mais dolorosas feridas da sociedade norte-americana. Por isso, ou também por causa disso, seu relacionamento com a imprensa não é, digamos, dos mais harmoniosos. Pode ser caracterizado, isto sim, como espinhoso. A cada pergunta feita por algum repórter, tem sempre engatilhada, na ponta da língua, uma resposta sarcástica ou irônica. Ou que pelo menos é interpretada dessa maneira.
Norris é considerado, também, bom ator, emplacando vários sucessos na “Meca” do teatro mundial, a Broadway, de Nova York, onde já é um veterano. Fez algumas incursões no cinema e também se saiu bem. É verdade que nunca foi indicado ao Oscar e que seus filmes não são campeões de bilheteria. Mas suas atuações nunca destoaram e sempre foram corretas e competentes.
Há quem prefira, porém, seu desempenho nos bastidores, fora dos palcos e das telas, como autor de peças como “O infiel”, ou “Fomos todos para Amsterdã”, ou, principalmente, a agora premiadíssima “Clayburn Park”, em vez de atuar, incorporando algum personagem, não importa se criado por ele ou por outro autor. É, óbvio, questão de preferência e gosto, como diz o povão, não se discute. Os críticos, todavia, consideram-no, também, bom ator. Pontos, por isso, para ele.
Informo, para os que não sabem, que o Pulitzer é um prêmio jornalístico, o maior dos Estados Unidos e um dos maiores do mundo. Todavia, é outorgado, também, a algumas categorias não-jornalísticas. Estas são, principalmente, Música e mais seis premiações literárias: Não Ficção, Ficção, Drama, História, Biografia e Poesia. Qual o escritor, de qualquer desses gêneros, não gostaria de receber tamanha honraria?! E não é sequer pelo dinheiro que cada premiado recebe (se não me engano US$ 10 mil), mas pelo prestígio que a premiação confere. Ganhá-la equivale à consagração.
Os ganhadores do Pulitzer, em três tempos, conseguem polpudos contratos de publicação dos seus livros com grandes editoras pelo mundo afora, que além de lhes darem abrangência internacional, engordam suas contas bancárias com os conseqüentes direitos autorais. Ademais, tornam-se quase que candidatos naturais ao Nobel de Literatura.
Bruce Norris, de 50 anos (ainda tem muuuita lenha pra queimar), tem fortes laços afetivos com Chicago. Foi nessa cidade que se graduou, em 1982, na Northwestern University, onde obteve licenciatura em teatro, após passar a juventude no Texas. Não por acaso, portanto, situou sua premiada peça, “Clayburn Park”, nessa importante localidade norte-americana. A imprensa dessa cidade considera-o, inclusive, uma espécie de “filho da terra” e ele também confessa que se sente assim.
Não tenho dúvidas que essa relevante obra de Bruce Norris não tardará a chegar ao Brasil para ser encenada por alguma de nossas tantas e excelentes companhias de teatro. Guardadas as devidas proporções, nós, brasileiros, também temos os mesmos conflitos interraciais e, sobretudo, sociais, que os norte-americanos, face ao sempre negado, mas onipresente ranço de preconceito que ainda persiste no relacionamento entre brancos e negros, um dos comportamentos mais estúpidos e burros que poderiam existir.
O comitê responsável pela atribuição do Prêmio Pulitzer descreveu “Clayburn Park”, a peça vencedora de Bruce Norris, como “uma obra poderosa, com personagens memoráveis, que falam de maneira inteligente e perspicaz sobre os conflitos raciais e sobre a questão da consciência de classe”.
Como se vê, depois de dois milênios de existência (ou mais), o teatro continua, mais do que nunca, cumprindo seu relevante papel didático, de detectar os grandes problemas de relacionamento, os conflitos pessoais e sociais, e de conscientizar o público da necessidade de resolvê-los e da forma de tais males serem sanados. Por isso aprecio tanto esse nobre gênero literário.
Boa leitura.
O Editor.
O teatro é uma das formas de arte mais antigas, mais importantes e mais fascinantes que existem. Foi, por muito tempo, notadamente na Grécia, instrumento por excelência de comunicação. Informa, instrui, conscientiza e ajuda a formar cidadãos resolvidos e integrados. É, também, um dos gêneros literários dos mais complexos, todavia mais gratificantes. Imaginem a satisfação de um escritor ao ver seus personagens, frutos exclusivos de sua imaginação, ganharem formas, movimento, vida e protagonizarem as histórias que ele inventou! Considero isso não apenas gratificante, como emocionante.
Sempre achei que um ator, aquele que recria as pessoas “imaginárias” das peças e que vive seus dramas, tragédias e comédias como se fossem seus, pessoais – como se tais situações fictícias estivessem acontecendo com ele – tem maior facilidade de produzir as histórias a serem representadas nos palcos. Claro que não são todos os que têm o talento da escrita. E nem por isso são piores atores do que os que têm. Os que gostam (e sabem) escrever histórias, contudo, têm a vantagem de conhecer as dificuldades de interpretar determinados personagens. Sabem as agruras para reproduzir certos diálogos e dar-lhes naturalidade e, portanto, verossimilhança. Escrevem, pois, via de regra, os que sejam mais apropriados aos atores.
Pois bem, um misto de autor e ator simultaneamente, o norte-americano Bruce Norris, conquistou um dos mais cobiçados e reputados prêmios do mundo, o Pulitzer de 2011, na categoria “Drama”. Sua peça “Clayburn Park”, que fez enorme sucesso em sua ainda recente temporada londrina, onde ganhou vários prêmios, foi a escolhida pelo júri dessa premiação. Aborda, de forma irreverente, bem-humorada (embora de um humor um tanto cáustico) o sempre (e ainda) difícil relacionamento interracial nos Estados Unidos. E situa seu enredo numa época em que ele era ainda mais complicado do que atualmente, ou seja, em meados dos anos 50.
Bruce Norris é tido como o autor do “politicamente incorreto”. Em suas peças, põe, invariavelmente, o dedo nas principais e mais dolorosas feridas da sociedade norte-americana. Por isso, ou também por causa disso, seu relacionamento com a imprensa não é, digamos, dos mais harmoniosos. Pode ser caracterizado, isto sim, como espinhoso. A cada pergunta feita por algum repórter, tem sempre engatilhada, na ponta da língua, uma resposta sarcástica ou irônica. Ou que pelo menos é interpretada dessa maneira.
Norris é considerado, também, bom ator, emplacando vários sucessos na “Meca” do teatro mundial, a Broadway, de Nova York, onde já é um veterano. Fez algumas incursões no cinema e também se saiu bem. É verdade que nunca foi indicado ao Oscar e que seus filmes não são campeões de bilheteria. Mas suas atuações nunca destoaram e sempre foram corretas e competentes.
Há quem prefira, porém, seu desempenho nos bastidores, fora dos palcos e das telas, como autor de peças como “O infiel”, ou “Fomos todos para Amsterdã”, ou, principalmente, a agora premiadíssima “Clayburn Park”, em vez de atuar, incorporando algum personagem, não importa se criado por ele ou por outro autor. É, óbvio, questão de preferência e gosto, como diz o povão, não se discute. Os críticos, todavia, consideram-no, também, bom ator. Pontos, por isso, para ele.
Informo, para os que não sabem, que o Pulitzer é um prêmio jornalístico, o maior dos Estados Unidos e um dos maiores do mundo. Todavia, é outorgado, também, a algumas categorias não-jornalísticas. Estas são, principalmente, Música e mais seis premiações literárias: Não Ficção, Ficção, Drama, História, Biografia e Poesia. Qual o escritor, de qualquer desses gêneros, não gostaria de receber tamanha honraria?! E não é sequer pelo dinheiro que cada premiado recebe (se não me engano US$ 10 mil), mas pelo prestígio que a premiação confere. Ganhá-la equivale à consagração.
Os ganhadores do Pulitzer, em três tempos, conseguem polpudos contratos de publicação dos seus livros com grandes editoras pelo mundo afora, que além de lhes darem abrangência internacional, engordam suas contas bancárias com os conseqüentes direitos autorais. Ademais, tornam-se quase que candidatos naturais ao Nobel de Literatura.
Bruce Norris, de 50 anos (ainda tem muuuita lenha pra queimar), tem fortes laços afetivos com Chicago. Foi nessa cidade que se graduou, em 1982, na Northwestern University, onde obteve licenciatura em teatro, após passar a juventude no Texas. Não por acaso, portanto, situou sua premiada peça, “Clayburn Park”, nessa importante localidade norte-americana. A imprensa dessa cidade considera-o, inclusive, uma espécie de “filho da terra” e ele também confessa que se sente assim.
Não tenho dúvidas que essa relevante obra de Bruce Norris não tardará a chegar ao Brasil para ser encenada por alguma de nossas tantas e excelentes companhias de teatro. Guardadas as devidas proporções, nós, brasileiros, também temos os mesmos conflitos interraciais e, sobretudo, sociais, que os norte-americanos, face ao sempre negado, mas onipresente ranço de preconceito que ainda persiste no relacionamento entre brancos e negros, um dos comportamentos mais estúpidos e burros que poderiam existir.
O comitê responsável pela atribuição do Prêmio Pulitzer descreveu “Clayburn Park”, a peça vencedora de Bruce Norris, como “uma obra poderosa, com personagens memoráveis, que falam de maneira inteligente e perspicaz sobre os conflitos raciais e sobre a questão da consciência de classe”.
Como se vê, depois de dois milênios de existência (ou mais), o teatro continua, mais do que nunca, cumprindo seu relevante papel didático, de detectar os grandes problemas de relacionamento, os conflitos pessoais e sociais, e de conscientizar o público da necessidade de resolvê-los e da forma de tais males serem sanados. Por isso aprecio tanto esse nobre gênero literário.
Boa leitura.
O Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
Concordo com você, Pedro, interpretar diálogos para torná-los naturais é um desafio e tanto, assim como escrevê-los. Deste modo, o gênero literário Teatro é bem mais complexo do que se pode supor.
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