terça-feira, 31 de maio de 2011




Vinte e três meses

• Por Raul Fitipaldi e Tali Feld Gleiser.


Acordar com um Golpe de Estado, seja onde for, é como abrir os olhos na Idade Media. É uma viagem no tempo à negação da civilização. É o atraso, é um passo humano em direção às cavernas, à intolerância e a miséria espiritual e física. Mas, quando o estupor do barulho nos acorda,quando abrimos a janela para ver o que acontece, também podemos respirar um ar novo, reconhecê-lo, aspirá-lo profundamente. É assim que de Um Golpe, Honduras, conseguiu cumprir com a máxima leninista de dar um passo atrás para dar dois para frente. A Resistência Popular do Povo Hondurenho é o maior acontecimento de massas da América Latina em aras de mudar os rumos de um país, e vai desde o espanto medieval à liberdade definitiva. Irmana-se, por efeito e ação, ao resgate do Presidente Chávez conduzido pelas massas caraquenhas.
23 meses são nada, um ponto na história da humanidade, mas 23 meses são suficientes para lhe dar luz e conhecimento a um povo que resiste unido ao golpe, à morte, o desespero, a fome e todas as misérias do mundo.
23 meses são nada para mudar o rumo da história, mas 23 meses são suficientes para não ter medo nem mais um dia, para enfrentá-lo ao patrão, para se descobrir como UM e ÚNICO em um coletivo de milhões de almas. Bastaram algumas horas desses 23 meses para se dar conta, e se consolidar em marcha irreversível desde a vida cegada de Isis Obed Murillo.
23 meses são nada para acabar com injustiça, mas 23 meses são suficientes para se dar conta de que a palavra precisa sulcar os ventos e que o martírio do povo é a semente insurgente que inaugura a árvore da vitória. Nas praças, nas escolas, nas fábricas, no Bajo Aguán, essa palavra é levada pelo espírito justo de Omar Rodríguez, a poesia rebelde de Roberto Sosa.
23 meses são nada para apagar 500 anos de genocídio, mas 23 meses são suficientes para clarear as ideais, se sustentar de pé, acumular as energias, descobrir o objetivo supremo, marchar a caminho do palácio, limpar seus salões e enche-los de justiça, liberdade e independência.
23 meses são um cálculo para uma multinacional, mas 23 meses são suficientes para doar a cada dia à memória de Vanessa Zepeda, Wendy Ávila e todos os outros que se uniram aos mártires da família Velázquez, e com essa memória no punho entender que é Agora ou Nunca.
23 meses são una página da história da Nossa América, mas 23 meses são suficientes para que esta página seja definitiva, e que o Império seja derrotado na sua tentativa de nos separar, nos invadir, nos privar, nos escravizar e nos enterrar em sua cova de ódio, violência, guerras e iniquidade.
Talvez a história diga que a Liberdade e a Independência definitiva de Honduras se forjaram em 23 meses, para sempre, para bênção da nossa Pátria Grande, para orgulho da Pacha Mama, Madre Terra de todos os filhos de Morazán, de Artigas, de San Martín, de Martí e do Che.
Que venham outros 23 meses de Resistência e de Marcha imparável se for necessários. Nessa Marcha estaremos, a cada dia, a cada instante, como irmãos privilegiados que participam da Vitória da Gente Pobre, das Gentes da Nossa América. E que venham dias melhores!

• Raul Fitipaldi é jornalista

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