Céu sem fronteiras
A imaginação, se levada para o lado negativo, deixa de ser nossa principal aliada e fonte de toda a criatividade, para se transformar num tormento de gigantescas proporções. Por exemplo, às vésperas de enfrentar alguma situação desagradável, da qual não possamos fugir, nossa tendência é fantasiar o que ainda não aconteceu e projetar na mente sofrimentos e conseqüências terríveis.
Quando, finalmente, encaramos o que nos afligia, percebemos, surpresos, que aquilo não era tão ruim e trágico quanto imaginávamos que seria. Ou seja, é como o povo freqüentemente diz: “o diabo não é tão feio quanto o pintam”. Por isso, devemos, sim, dar asas à imaginação, mas apenas nas coisas positivas.
Nas situações adversas, mandam o bom-senso e a prudência, devemos dar ouvidos, única e exclusivamente, à razão. Agindo assim, evitaremos sofrimentos inúteis e desnecessários e manteremos o desejável equilíbrio psicológico e emocional.
Se é verdade que a imaginação, mal-direcionada e utilizada sem critério e sabedoria, pode se transformar em terrível adversária para nós, se usada com inteligência e tirocínio, torna-se poderoso instrumento que nos leva a operar maravilhas.
Distorcida, transforma-se em potentíssima lente de aumento, que amplia, desmesuradamente, os males e os perigos. Tende a nos fazer ver, por exemplo, uma formiga como se fosse um elefante e este, como um dinossauro.
Todavia, a imaginação sadia e bem-direcionada não tem limites. Foi, é e sempre será a fonte de toda a criatividade, que nos impulsiona ao progresso e às grandes realizações. O que seria das artes sem esse fantástico ingrediente? E das idéias, da ciência e da tecnologia? Nada, não é mesmo? Seu alcance é ilimitado e nos torna poderosos, muito mais do que possamos supor.
O “cenário”, contudo, – embora não seja fator determinante – ajuda a darmos asas à imaginação. Por exemplo, em uma noite calma e clara de luar e de céu estrelado, nosso pensamento viaja, livre e solto, por mundos desconhecidos, por entre as constelações de estrelas (das quais somos, literalmente, pó) vislumbrando planetas que talvez sequer existam (provavelmente), mas cujas imagens, em detalhes, consegue criar em nossa mente.
O mesmo já não ocorre – não pelo menos com a mesma facilidade – em dias nublados e cinzentos, nos quais imperem a melancolia e a saudade. Essas ocasiões são mais propícias à introspecção, a calmas e preguiçosas “viagens” pelo nosso interior, descobrindo (ou redescobrindo) imagens guardadas no fundo do cérebro por anos ou até por décadas e que sequer nos dávamos conta que estavam ali.
Paulo Mendes Campos descreve, numa de suas crônicas, o cenário ideal para a imaginação voar livre e veloz. Antes de citar o que escreveu, cabem, aqui, algumas considerações sobre esse escritor mineiro, do qual sou grande admirador e que considero injustiçado, se for levada em conta a qualidade da sua obra.
Curiosamente, ele relutou muito em abraçar o que sempre foi a sua grande e nítida vocação (para os outros, não para ele) a literatura, embora tenha sido um literato precoce. Seu sonho, na verdade, (nunca realizado), era o de ser aviador. Tinha fascínio por aviões e, não tanto por eles, mas pela altura, pelo céu, principalmente quando azul e sem nuvens. Estudou Odontologia, Veterinária e Direito, mas não concluiu nenhum desses cursos.
Foi parar no jornalismo. Primeiro, atuou como repórter (e dos bons). Depois, cansou de bater pernas nas ruas e ganhou uma coluna de crônicas diárias, o que lhe possibilitou não precisar mais sair da redação à cata de notícias. Mostrou-se, nessa função, um redator sumamente criativo (e imaginativo), comparável a seus colegas da chamada “geração mineira” da Literatura, como Otto Lara Resende, Murilo Rubião, Fernando Sabino e Hélio Pellegrino.
Sem exagero algum, comparo Paulo Mendes Campos ao “rei dos cronistas” brasileiros, Rubem Braga (este, todos sabem, era capixaba) embora cada qual, claro, com seu estilo característico. Quando, no início da adolescência, cursava o ginásio, na cidadezinha de Cachoeira do Campo, um padre, que era seu professor de Português, previu: “Você ainda será escritor”. Mas o menino imaginativo não queria nem saber das letras. Sonhava em pilotar aviões, de todos os tipos e tamanhos, o que nunca conseguiu.
Para nossa felicidade (minha, particularmente, que o tenho como um dos meus referenciais na crônica), seu velho mestre ginasial acertou em cheio nas previsões. Paulo Mendes Campos acabou se tornando escritor (e que escritor!). Tive a felicidade de ler a maioria dos 24 livros que publicou. E tenho uma coleção enorme das suas crônicas publicadas na Revista Manchete.
Em uma delas, intitulada “De um caderno cinzento”, datada de 17 de agosto de 1967, pincei este trecho que se refere ao cenário ideal para as “viagens” da imaginação: “Céu azul não conhece fronteira de sombra; céu azul é indispensável antes de tudo aos cegos; azul do céu não é cor, mas uma qualidade do mundo, uma luminosidade apreensível por todos os sentidos, fragrância, convivência mais delicada, concerto de sons, transparência do universo”.
Como se vê, dei voltas e mais voltas, como o próprio mundo dá, e retornei ao ponto de origem destas descompromissadas divagações. A imaginação é, mesmo, assim: veloz, imprevisível e não raro dispersiva e caótica. Por isso, precisa ser direcionada, e sempre, para o lado positivo e belo da vida. E tem, por isso, como campo preferido de atuação, o espaço, ou seja a imensidão sem limites, o céu sem fronteiras.
Boa leitura.
O Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
A imaginação, se levada para o lado negativo, deixa de ser nossa principal aliada e fonte de toda a criatividade, para se transformar num tormento de gigantescas proporções. Por exemplo, às vésperas de enfrentar alguma situação desagradável, da qual não possamos fugir, nossa tendência é fantasiar o que ainda não aconteceu e projetar na mente sofrimentos e conseqüências terríveis.
Quando, finalmente, encaramos o que nos afligia, percebemos, surpresos, que aquilo não era tão ruim e trágico quanto imaginávamos que seria. Ou seja, é como o povo freqüentemente diz: “o diabo não é tão feio quanto o pintam”. Por isso, devemos, sim, dar asas à imaginação, mas apenas nas coisas positivas.
Nas situações adversas, mandam o bom-senso e a prudência, devemos dar ouvidos, única e exclusivamente, à razão. Agindo assim, evitaremos sofrimentos inúteis e desnecessários e manteremos o desejável equilíbrio psicológico e emocional.
Se é verdade que a imaginação, mal-direcionada e utilizada sem critério e sabedoria, pode se transformar em terrível adversária para nós, se usada com inteligência e tirocínio, torna-se poderoso instrumento que nos leva a operar maravilhas.
Distorcida, transforma-se em potentíssima lente de aumento, que amplia, desmesuradamente, os males e os perigos. Tende a nos fazer ver, por exemplo, uma formiga como se fosse um elefante e este, como um dinossauro.
Todavia, a imaginação sadia e bem-direcionada não tem limites. Foi, é e sempre será a fonte de toda a criatividade, que nos impulsiona ao progresso e às grandes realizações. O que seria das artes sem esse fantástico ingrediente? E das idéias, da ciência e da tecnologia? Nada, não é mesmo? Seu alcance é ilimitado e nos torna poderosos, muito mais do que possamos supor.
O “cenário”, contudo, – embora não seja fator determinante – ajuda a darmos asas à imaginação. Por exemplo, em uma noite calma e clara de luar e de céu estrelado, nosso pensamento viaja, livre e solto, por mundos desconhecidos, por entre as constelações de estrelas (das quais somos, literalmente, pó) vislumbrando planetas que talvez sequer existam (provavelmente), mas cujas imagens, em detalhes, consegue criar em nossa mente.
O mesmo já não ocorre – não pelo menos com a mesma facilidade – em dias nublados e cinzentos, nos quais imperem a melancolia e a saudade. Essas ocasiões são mais propícias à introspecção, a calmas e preguiçosas “viagens” pelo nosso interior, descobrindo (ou redescobrindo) imagens guardadas no fundo do cérebro por anos ou até por décadas e que sequer nos dávamos conta que estavam ali.
Paulo Mendes Campos descreve, numa de suas crônicas, o cenário ideal para a imaginação voar livre e veloz. Antes de citar o que escreveu, cabem, aqui, algumas considerações sobre esse escritor mineiro, do qual sou grande admirador e que considero injustiçado, se for levada em conta a qualidade da sua obra.
Curiosamente, ele relutou muito em abraçar o que sempre foi a sua grande e nítida vocação (para os outros, não para ele) a literatura, embora tenha sido um literato precoce. Seu sonho, na verdade, (nunca realizado), era o de ser aviador. Tinha fascínio por aviões e, não tanto por eles, mas pela altura, pelo céu, principalmente quando azul e sem nuvens. Estudou Odontologia, Veterinária e Direito, mas não concluiu nenhum desses cursos.
Foi parar no jornalismo. Primeiro, atuou como repórter (e dos bons). Depois, cansou de bater pernas nas ruas e ganhou uma coluna de crônicas diárias, o que lhe possibilitou não precisar mais sair da redação à cata de notícias. Mostrou-se, nessa função, um redator sumamente criativo (e imaginativo), comparável a seus colegas da chamada “geração mineira” da Literatura, como Otto Lara Resende, Murilo Rubião, Fernando Sabino e Hélio Pellegrino.
Sem exagero algum, comparo Paulo Mendes Campos ao “rei dos cronistas” brasileiros, Rubem Braga (este, todos sabem, era capixaba) embora cada qual, claro, com seu estilo característico. Quando, no início da adolescência, cursava o ginásio, na cidadezinha de Cachoeira do Campo, um padre, que era seu professor de Português, previu: “Você ainda será escritor”. Mas o menino imaginativo não queria nem saber das letras. Sonhava em pilotar aviões, de todos os tipos e tamanhos, o que nunca conseguiu.
Para nossa felicidade (minha, particularmente, que o tenho como um dos meus referenciais na crônica), seu velho mestre ginasial acertou em cheio nas previsões. Paulo Mendes Campos acabou se tornando escritor (e que escritor!). Tive a felicidade de ler a maioria dos 24 livros que publicou. E tenho uma coleção enorme das suas crônicas publicadas na Revista Manchete.
Em uma delas, intitulada “De um caderno cinzento”, datada de 17 de agosto de 1967, pincei este trecho que se refere ao cenário ideal para as “viagens” da imaginação: “Céu azul não conhece fronteira de sombra; céu azul é indispensável antes de tudo aos cegos; azul do céu não é cor, mas uma qualidade do mundo, uma luminosidade apreensível por todos os sentidos, fragrância, convivência mais delicada, concerto de sons, transparência do universo”.
Como se vê, dei voltas e mais voltas, como o próprio mundo dá, e retornei ao ponto de origem destas descompromissadas divagações. A imaginação é, mesmo, assim: veloz, imprevisível e não raro dispersiva e caótica. Por isso, precisa ser direcionada, e sempre, para o lado positivo e belo da vida. E tem, por isso, como campo preferido de atuação, o espaço, ou seja a imensidão sem limites, o céu sem fronteiras.
Boa leitura.
O Editor.
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Paulo Mendes Campos, juntamente com Rubem Braga, no colégio e Monteiro Lobato, em casa, me mostraram o caminho da Literatura.
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