A
amante fiel
* Por Celamar
Maione
Heleneide se olhou mais uma vez no
espelho, passou batom, apertou os lábios, ajeitou os brincos e foi ao encontro
de Osório.
Quando chegou no restaurante, pediu uma
mesa ao garçom e não tirou os olhos da porta. Assim que avistou o namorado,
abriu um sorriso. Osório se aproximou e
beijou Heleneide no rosto. Estava muito
agitado:
-Não posso demorar. Estou no meio do
expediente. Precisamos conversar e não pode passar de hoje.
Heleneide apertou as mãos preocupada:
-Você me assustou com sua urgência . O que houve?
-Antes
precisa me prometer que vai ficar
calma.
-Eu estava calma. Agora fiquei nervosa. Anda Osório, fala!
Osório respirou fundo e saiu-se com
essa:
-Caso-me amanhã, Heleneide. Pronto,
falei.
-Como ??!!
-Caso-me amanhã!
-Casar amanhã?! Não entendi. Que
brincadeira de mau gosto é essa? Que eu saiba, você é meu namorado. Namoramos
há sete meses....e...
-Eu sei, eu sei, mas quando conheci
você, já era noivo. Tentei terminar o noivado. Não consegui. Sabe como é, coisa
de infância. Família envolvida.
-Você me fez de palhaça durante todo
esse tempo?!
Heleneide aumentou o tom de voz.
-Heleneide, controle-se. Estamos num
restaurante no centro da cidade na hora do almoço. Não quero chamar a atenção. Eu tenho uma
proposta para fazer.
-Proposta?! Depois de me dizer que casa
amanhã você tem uma proposta para me fazer?! ---Vai me convidar para ser
madrinha?
-Podemos ser amantes. Volto da
lua-de-mel e continuamos nossa relação.
Heleneide não sabia se ria ou se chorava.
De repente tudo girou. O restaurante perdeu o foco. “Pela manhã, tinha um namorado”, pensou. “Na hora
do almoço, o namorado diz que vai se casar e propõe que sejam amantes”. Não
entendeu nada. A boca amargava. Pegou a bolsa e se levantou:
-Almoça sozinho. Preciso pensar.
Osório comeu em silêncio. Pediu a
conta e voltou para o trabalho. Enquanto isso, Heleneide vagava pelas ruas do
centro. Colocou os óculos escuros para chorar melhor. Parava em frente às
vitrines com o pensamento longe. Queria entender o que acontecera. Jamais
desconfiou de nada. Osório foi perfeito. Era mesmo um profissional da
infidelidade.
No final da tarde ligou para o
namorado:
-Preciso falar com você. Desce aqui.
- Cinco minutos e já desço.
Encontraram-se. Heleneide tinha lágrimas
nos olhos. Teve vontade de agarrar Osório e implorar para não se casar, mas pediu outra coisa:
- Posso pedir uma última coisa?
-Até duas. Caso, mas não sumo. Você
será minha amante fiel.
-Só se você realizar um pedido. Um
único pedido.
-Peça.
-Quero um pedaço de bolo do seu
casamento.
-Pedaço de bolo? Como assim?
-Vou ao casamento e você me entrega o
bolo do lado de fora da Igreja, durante a festa. Simples.
-Não. É perigoso.
-Então nada feito. Não serei sua
amante. Não me procure mais.
-Tá. Eu topo.
Á noite, Heleneide
desabafou com Marinalda . A amiga achou absurda a história do bolo:
-Tem certeza?
-Absoluta. Pelo menos me vingo: como o
bolo da noiva do Osário!
Heleneide deu um sorriso satânico que
assustou Marinalda. Marinalda percebeu
uma certa estranheza no olhar da amiga . “A notícia do casamento mexeu com
Heleneide”, pensou.
No dia seguinte, Marinalda acompanhou
Heleneide até a Igreja e receosa perguntou:
-Se Osório não aparecer? Você vai
aprontar alguma?
-Não. O castigo dele está guardado.
Quando acontecer você vai saber. Sou ou não sou a amante fiel?
Marinalda sentiu medo de Heleneide. Um
arrepio perpassou-lhe o corpo. Percebeu naquela instante que Heleneide não
estava no juízo perfeito. Enquanto isso, durante a festa, Osório tentava
arranjar um jeito de escapar para falar com
Heleneide. Quando pegou o pedaço de bolo e saía para entregá-lo, foi
puxado pela noiva:
-Amor, aonde é que você vai com esse
bolo?
Osório disfarçou:
-Vou dar para uma mendiga na porta da
Igreja. Promessa.
A noiva pegou o bolo, entregou para o
garçom e beijou Osório:
-Vem, deixa para outro dia. Minha
família quer tirar a última foto.
Osório olhou para a porta do salão da
Igreja, preocupado. Tinha medo de escândalos. Lá fora Heleneide perdia a
paciência. Marinalda tentava acalmá-la:
-Não é melhor irmos embora?
-Não. Ele prometeu. Se daqui a 15
minutos não aparecer, entro lá e armo um barraco.
Osório só conseguiu se desvencilhar da
noiva quando ela se distraiu com os familiares. Olhando para os lados e se esgueirando
pelos cantos, foi ao encontro de Heleneide:
- O bolo. Missão cumprida.
-Agora me dá um beijo.
-Não posso.
-Dá um beijo. Se não beijar...
-Tá bom. Tá bom.
Os dois se beijaram e Osório, apressado,
se despediu de Heleneide, prometendo procurá-la quando chegasse da lua-de-mel. Durante
o caminho para casa, Marinalda perguntou:
-Não vai comer o bolo?
-Detesto bolo de maracujá. Vou jogar na
lixeira!
Novamente a risada satânica da amiga
assustou Marinalda. Assim que Osório chegou
de viagem, ligou para Heleneide:
-Estou de volta. Não disse que ligava?
-Quero me encontrar com você. Agora.
Já!
-Amanhã.
-Hoje. Estou com saudades.
Osório obedeceu. Heleneide vestiu a
melhor roupa e passou o perfume preferido de Osório. Arrumou tudo como
planejara. Antes de sair, fez uma
ligação. Quando se viram, se abraçaram. Osório entregou um presente para
Heleneide:
-Viu? Pensei em você. Veja se gostou do
brinco.
-Lindo, amor! Adorei! Vou colocar já.
-Não disse que você seria minha amante
fiel?
-E sou.
Apenas sua.
Osório não percebeu a ironia na voz. Tiveram
uma tarde de amor inesquecível. Logo voltaram à realidade:
-Heleneide, acabou-se o que era doce.
Sou um homem casado. Tenho hora.Vamos?
-Claro, amor. Mas antes tenho uma
surpresa para você.
Heleneide vendou Osório.
-Vê lá o que você vai aprontar sua
danadinha.
-Você vai gostar. Surpreeesaa!!
Heleneide tirou um facão da bolsa e
cortou o pênis de Osório. Osório deu um grito alucinado e desmaiou. O sangue
jorrava. Heleneide pegou o pênis do amante, foi até o banheiro, jogou no vaso e
apertou a descarga. O telefone soou,
estridente. Heleneide atendeu:
-Pode deixar subir.
Heleneide abriu a porta e sorriu para
Samara, repórter de um jornal sensacionalista:
- Entra, vou contar minha história para
você.
*Radialista, jornalista e
escritora.
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