Tudo explicado agora
* Por Rodrigo Ramazzini
Patrícia era uma loira linda. Corpo esbelto, olhos verdes e um cabelo
comprido que, ao caminhar com elegância, as pontas escondiam os glúteos,
provocando certo fetiche nos homens que tinham o prazer de cruzar com a bela
mulher. Logicamente que, por onde passava, Patrícia se fazia notar pela beleza,
apesar de carregar um ar de timidez, ter gestos equilibrados, tom de voz baixo
e hábitos discretos. E essa “sina” de ser notada não foi diferente em um renomado
bar, que começou a frequentar todas as sextas-feiras à noite, que oferecia aos
clientes uma variedade de pratos, cervejas, drinks e música ao vivo.
Desde a primeira sexta-feira em que ingressou no bar, ela virou o centro
das atrações dos frequentadores assíduos (ou não) e dos garçons da casa,
embora, sucessivamente seguisse uma rotina. Ela ingressava no local sempre no
mesmo horário, sentava-se mais ou menos no mesmo ponto, na parte intermediária
do bar, pedia uma cerveja e, solitária, ficava a curtir a música tocada pelo
cantor e o seu violão, cantarolando baixinho, entre um gole e outro. Assim,
ficava de duas a três horas, tomava de duas a três cervejas, depois pagava a
conta e deixava o bar.
Após cinco sextas-feiras seguidas mantendo esta rotina, a curiosidade de
todos já estava aguçada, pois pouco se sabia de Patrícia, apenas que era
analista em um laboratório de análises clínicas. Quem é ela? O que faz? Por que
está sempre sozinha? Por que não conversa com ninguém? Por que fica ali apenas
curtindo a música e a cerveja? Eram as indagações que inquietavam os garçons e
os frequentadores do bar. Foi então que, depois de vários goles de cerveja, um
dos clientes tomou coragem e tentou se aproximar. Cumprimentou-a e perguntou se
poderia se sentar junto a ela. Ele voltou para local em que estava
anteriormente segundos depois carregando um enfático “Não! Estou bem sozinha.
Obrigada!” na bagagem.
Essa atitude de Patrícia deixou todos ainda mais curiosos. Tinha virado
um desafio descobrir algo sobre a bela loira de cabelos compridos, que se sentava
no bar, ficava bebericando por horas e olhando para o mesmo músico cantar,
quase sempre as mesmas músicas.
Nas seis sextas-feiras seguintes, clientes frequentes do bar tentaram de
todas as maneiras possíveis se aproximarem de Patrícia. Foram pessoalmente até
ela, ou mandaram recados pelos garçons, ou mandaram uma amiga dar um recado, ou
escreveram em guardanapos, ou fizeram sinais, enfim, todas alternativas não
tiveram sucesso. Ela, elegantemente e educadamente, agradecia, porém, respondia
estar bem sozinha e voltava a beber a cerveja e a se entreter em cantar
discretamente os sucessos populares.
Ela era o assunto principal do bar. Até os garçons ingressaram na missão
e tentaram com simpatia arrancar algo da loira solitária. Fora alguns sorrisos
e palavras delicadas de agradecimento, também, não tiveram êxito. As garçonetes
do bar, igualmente, tentaram uma aproximação. Nada.
Nas redes sociais, Patrícia mantinha perfis quase sempre desatualizados
ou privados para amigos, que selecionava muito bem na hora de aceitar os
seguidores ou convites de amizade.
Nenhuma “abertura” ou flertada aparente com os homens do bar. Nem
mulheres.
Sempre sozinha.
Sempre a mesma rotina.
Sempre discreta.
Afinal, qual era o segredo da solitária loira misteriosa?
O óbvio é tarefa difícil de enxergar.
Foi então que, mais uma sexta-feira chegou e o bar encheu rapidamente. Todos
esperavam por Patrícia. Ansiosos. Mas, a primeira surpresa da noite, surgiu do
músico, que não apareceu. Desesperado, o dono do bar ligou para o cantor, que
confirmou não poder ir naquele dia. Estava com problemas pessoais. Pediu
desculpas e, constrangido, o músico contou a verdade ao proprietário do bar:
tinha sido pego pela esposa com a amante.
Às pressas, um novo músico foi contratado. Passado o transtorno gerado,
uma segunda surpresa surgiu no bar naquela noite:
Onde estava Patrícia?
A indagação correu pelo interior do bar e ninguém encontrava a resposta.
Até que a “ficha caiu” e alguém se deu conta:
Ela era a amante.
Todos concordaram e, quase em coral, exclamaram:
- Tudo explicado agora!
* Jornalista e contista gaúcho.
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