sexta-feira, 17 de julho de 2015

Carta para mim mesmo


* Por Fábio Maia


Olá, Fábio dez anos mais novo. Aqui quem fala é o Fábio dez anos mais velho. Sim, você mesmo. Quero dizer, nós mesmos, só que cada um em um mundo diferente, paralelo. Eu estou à frente, e você atrás, e esta carta é para você entender como as coisas funcionam por aqui.

Embora você não acredite, há muita diferença entre nós. Os anos passarão rápido, e quando você menos se der conta, dez anos se passaram. Mas não há tristeza alguma nisso, apenas uma lição: conte logo para o mundo que você é gay. Saia do armário. Se descubra. Afinal, seu amigo Jean é lindo. Brincadeira. Você não é gay, não se espante. Eu sei que você se assustou. Eu sei. Eu sou você. E imagino a cara de nabo que você deve ter feito agora. Pode começar a rir, pois sei que é disso que você gosta – e é justamente por isso que estou lhe escrevendo.

Com o tempo, o senso de humor das pessoas vai começar a se esgotar. Não é algo que escolhi, mas que simplesmente vai acontecer. Tudo irá se transformar rapidamente, e o mundo que hoje você conhece será irreconhecível daqui um tempo. Celulares que beiram a possibilidade de substituir computadores, iPods, iPads (você vai descobrir o que são estes dois últimos), aplicativos que facilitam sua vida até para se conseguir sexo rápido, pessoas com valores cada vez mais distorcidos, seres cada vez menos humanos, uma competição no mercado que ultrapassa a honestidade, e o dinheiro valendo mais que uma vida humana.

Tudo isso parece horrível vindo de você mesmo do futuro, mas não é. Embora a parcela de pontos negativos seja demasiadamente grande, o outro lado da moeda é muito saboroso. E este lado é salvo pelas pessoas que ainda são pessoas – e você compõe este grupo. Você perceberá que a energia que você gera volta em dobro pra você, e é por isso que eu te digo: continue sempre com este bom-humor. Esta será sua estrela guia, que o guiará para os caminhos certos quando a dúvida bater à sua porta.

Eu não vou contar mais nada, embora acredite que sua curiosidade seja enorme. Não quero estragar as surpresas que a vida lhe guardou. Não entrarei em detalhes sobre sua vida amorosa, mas não se preocupe: você não morrerá virgem. É tudo que tenho para lhe dizer agora.

Daqui dez anos a gente se fala de novo. E eu te conto como são as coisas daqui mais dez anos. Você é um garoto fantástico, continue assim. Um grande beijo para você, de você mesmo dez anos mais velho.


* Jornalista

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