Vida longa
Nós, que escrevemos ficção, vivemos gerando e matando tipos dos mais diversos –, jovens, idosos, crianças, bebês, homens, mulheres etc. – alguns heróicos e fascinantes, outros asquerosos e cruéis. Calma, leitor! Não afirmei que nós, escritores, sejamos psicopatas “serial-killers”, a nos comprazermos com sangue para satisfazermos eventuais taras. Quando falo de “geração e morte”, refiro-me, óbvio, aos personagens que criamos, para darem vida às histórias que nos propomos a narrar.
Alguns escritores criam verdadeira multidão, que daria para povoar uma dessas tantas pequenas cidadezinhas interior afora. Eu mesmo devo ter produzido umas três centenas deles ou mais, cada qual com suas próprias características físicas, psicológicas e comportamentais. Via de regra, vou “matando-os”, um a um, ao longo do enredo e raros sobrevivem a essas “carnificinas literárias”. Muitas vezes, sequer o herói das histórias narradas escapa.
Ao longo da produção do texto (romance, novela ou conto, este último o gênero da minha predileção e minha grande especialidade), afeiçôo-me aos tipos que vou criando. Familiarizo-me com eles, sofro seus desgostos e decepções, vibro com seus êxitos, curto os seus amores, revolto-me com as traições de que são vítimas, como se fossem pessoas reais, de carne e osso, meus parentes, meus amigos, meus filhos, sei lá. Quando concluo a narrativa, chego a sentir saudades de alguns desses personagens, uma certa nostalgia e uma enorme tentação de “utilizá-los” nas histórias seguintes que me proponho a escrever.
Vários escritores confessaram-me que sentem a mesmíssima coisa. Portanto, nem nesse aspecto consigo ser original. Alguns, vão mais longe, e aproveitam, de fato, vários desses personagens em histórias seguintes, uma, duas, três, cinco a mais.
Isso funciona? Depende! Desde que você dê coerência ao enredo e tenha o cuidado de não cair em contradição, não raro dá certo. Vejam o caso de Edgar Rice Burroughs, que se consagrou com o seu Tarzan. Escreveu, se não me falha a memória, cerca de três dezenas de romances, narrando as peripécias desse mesmo personagem.
O alemão Karl May (não confundir com Karl Marx), foi até mais longe. Criou uma espécie de super-homem, um herói imbatível e com uma sorte fenomenal, que escapa de todos os perigos, até dos que nós, mortais comuns, sucumbiríamos apenas de vislumbrá-los, e utilizou-o em mais de 50 aventuras, que tiveram por cenário todos os continentes, e países os mais diversos, inclusive o Brasil. Para não ir muito longe, posso citar a britânica J. K. Rowlings, com seu Harry Potter, que faz a delícia da garotada que gosta de ler (e de muitos marmanjos também, inclusive deste).
Aliás, estou estudando uma forma de “ressuscitar” alguns dos meus personagens mais fascinantes e fazê-los viver novos episódios em contos (e até romances) que tenho na cabeça. De uns tempos para cá, tenho evitado de “matar” os que considero com maior potencial para despertar empatia com os leitores. Espero conferir-lhes vida longa num futuro, quem sabe, bastante próximo.
Isso não quer dizer que tenha sido esgotada minha capacidade de criar novos tipos. Aliás, ela não se esgota jamais para escritor algum, mesmo para o assustado principiante. Ocorre que alguns personagens são tão fortes, tão fascinantes e tão peculiares, física e psicologicamente, que não merecem morrer no final das histórias em que estão envolvidos. Isso é narcisismo intelectual? Apontem um só escritor que não seja narcisista nesse aspecto, ora bolas!
Boa leitura.
O Editor.
Nós, que escrevemos ficção, vivemos gerando e matando tipos dos mais diversos –, jovens, idosos, crianças, bebês, homens, mulheres etc. – alguns heróicos e fascinantes, outros asquerosos e cruéis. Calma, leitor! Não afirmei que nós, escritores, sejamos psicopatas “serial-killers”, a nos comprazermos com sangue para satisfazermos eventuais taras. Quando falo de “geração e morte”, refiro-me, óbvio, aos personagens que criamos, para darem vida às histórias que nos propomos a narrar.
Alguns escritores criam verdadeira multidão, que daria para povoar uma dessas tantas pequenas cidadezinhas interior afora. Eu mesmo devo ter produzido umas três centenas deles ou mais, cada qual com suas próprias características físicas, psicológicas e comportamentais. Via de regra, vou “matando-os”, um a um, ao longo do enredo e raros sobrevivem a essas “carnificinas literárias”. Muitas vezes, sequer o herói das histórias narradas escapa.
Ao longo da produção do texto (romance, novela ou conto, este último o gênero da minha predileção e minha grande especialidade), afeiçôo-me aos tipos que vou criando. Familiarizo-me com eles, sofro seus desgostos e decepções, vibro com seus êxitos, curto os seus amores, revolto-me com as traições de que são vítimas, como se fossem pessoas reais, de carne e osso, meus parentes, meus amigos, meus filhos, sei lá. Quando concluo a narrativa, chego a sentir saudades de alguns desses personagens, uma certa nostalgia e uma enorme tentação de “utilizá-los” nas histórias seguintes que me proponho a escrever.
Vários escritores confessaram-me que sentem a mesmíssima coisa. Portanto, nem nesse aspecto consigo ser original. Alguns, vão mais longe, e aproveitam, de fato, vários desses personagens em histórias seguintes, uma, duas, três, cinco a mais.
Isso funciona? Depende! Desde que você dê coerência ao enredo e tenha o cuidado de não cair em contradição, não raro dá certo. Vejam o caso de Edgar Rice Burroughs, que se consagrou com o seu Tarzan. Escreveu, se não me falha a memória, cerca de três dezenas de romances, narrando as peripécias desse mesmo personagem.
O alemão Karl May (não confundir com Karl Marx), foi até mais longe. Criou uma espécie de super-homem, um herói imbatível e com uma sorte fenomenal, que escapa de todos os perigos, até dos que nós, mortais comuns, sucumbiríamos apenas de vislumbrá-los, e utilizou-o em mais de 50 aventuras, que tiveram por cenário todos os continentes, e países os mais diversos, inclusive o Brasil. Para não ir muito longe, posso citar a britânica J. K. Rowlings, com seu Harry Potter, que faz a delícia da garotada que gosta de ler (e de muitos marmanjos também, inclusive deste).
Aliás, estou estudando uma forma de “ressuscitar” alguns dos meus personagens mais fascinantes e fazê-los viver novos episódios em contos (e até romances) que tenho na cabeça. De uns tempos para cá, tenho evitado de “matar” os que considero com maior potencial para despertar empatia com os leitores. Espero conferir-lhes vida longa num futuro, quem sabe, bastante próximo.
Isso não quer dizer que tenha sido esgotada minha capacidade de criar novos tipos. Aliás, ela não se esgota jamais para escritor algum, mesmo para o assustado principiante. Ocorre que alguns personagens são tão fortes, tão fascinantes e tão peculiares, física e psicologicamente, que não merecem morrer no final das histórias em que estão envolvidos. Isso é narcisismo intelectual? Apontem um só escritor que não seja narcisista nesse aspecto, ora bolas!
Boa leitura.
O Editor.
Quem sabe seja uma boa ideia criarmos alguém absolutamente sem atrativos, de personalidade fraca, com uma vida totalmente tola, com um comportamento apático, cujos anos passam exatamente iguais, entra década e sai década. Será que valeria a penas mantê-lo vivo? Não sei, mas conheço gente assim. Nem só de personagens maravilhosos, fortes e capazes vive a literatura. Alguém, cuja vida, em princípio não daria um parágrafo, poderá encher um livro e a paciência do leitor. Só não sei se vende.
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