Poesia
*
Por Emanuel Medeiros Vieira
Os
poetas, como os cegos, enxergam na escuridão. Hoelderlin já
nos ensinava: “O que permanece, fundam-no os poetas”. Alphonsus
de Guimaraens Filho escreveu:
“Se
não for pela poesia
como
crer na eternidade?”
Numa
mensagem, meu amigo Ronaldo Cagiano, confessa: “Um minuto no túmulo
de Balzac, uma tarde à beira do Sena ou um café n’A Brasileira,
onde sentou Pessoa, me ensinam mais que todas as religiões e
filosofias”. Kafka já dizia: tudo o que não é literatura me
aborrece.
Complementa
Cagiano, o colega escritor: Não tenho medo de andar contra a
corrente. A vida não é feita de adesões ao política, estética e
culturalmente correto, mas ao que tem dimensão onírica, humana e
solitária. E isso não dá votos, nem resenhas na Folha”.
Me
perguntaram numa escola aqui em Brasília: “Como se faz um bom
livro?” Eu sorri, sala cheia, jovens de 20 anos. Sabia de cor a
resposta de Somerset Maugham: “Há três regras para se escrever um
bom livro. Infelizmente, ninguém sabe quais são.”
Dia
de citações, não é? Meus perdões. Porque escrever não tem
receita. Tem inspiração sim. Mas tem muito trabalho.
“Transpiração”, disciplina. Há que começar a faina diária
mal rompe a aurora. Todos os dias, todos. E ler, muito. Reler. Ler
mais. Sempre. Até o último suspiro.
Se
paramos de ler, vamos morrer. O aprendizado da escrita é misterioso.
“O
processo de aprender a escrever é desanimador porque é
inexplicável”, afirma Alberto Manguel. Ele complementa: “A
leitura é uma atividade pela qual os governos sempre manifestaram um
limitado entusiasmo”
É
claro. A leitura abre os espíritos. A literatura “revela”. A
verdade liberta. Com ela no seu coração, você não votaria mais
por ter recebido uma esmola, um saco de cimento, umas telhas ou uma
bolsa-família.
Ler
sempre incomoda os ditadores, os napoleões tupiniquins, desagrada os
poderosos, os idiotas e medíocres de plantão. E, no geral, eles
estão nos órgãos ditos culturais, com o seu vasto número de
funcionários entediados, seus burocratas mesquinhos e seus lanches
vespertinos, suas panelinhas burlescas, que querem camuflar o seu
enorme vazio com roupas chics ou retóricas e preciosismos. Não
enganam. Não adianta. São figuras que merecem a piedade. Serão
varridos por qualquer vento sul. Podem receber prebendas, se acham
“sérios”, às vezes assinam colunas diárias.
Mas
serão sempre figuras menores: aquelas que morrerão sem a
solidariedade de si mesmas. Manguel lembra que Pinochet proibiu “Dom
Quixote”, de Cervantes. Lógico, o leitor lendo Quixote descobriria
a alma nazista do ditador chileno, uma besta do Apocalipse
sul-americano.
Penso
no que disse um republicano espanhol (pai de um escritor) que passou
muitos anos numa prisão política: “Até
na cadeia vocês serão mais felizes se gostarem de ler”. É
verdade!
*
Romancista, contista, novelista e poeta catarinense, residente em
Brasília, autor de livros como “Olhos azuis – ao sul do
efêmero”, “Cerrado desterro”, “Meus mortos caminham comigo
nos domingos de verão”, “Metônia” e “O homem que não amava
simpósios”, entre outros. Foi
indicado ao Prêmio Nobel de Literatura de 2018.
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