Dando
pipoca aos macacos
*
Por Marcelo Sguassábia
“Eu devia estar feliz pelo Senhor
Ter me concedido o domingo
Pra ir com a família
No Jardim Zoológico
Dar pipoca aos macacos”
(Raul Seixas – “Ouro de Tolo”)
A
disputa com o ex-futuro cunhado no ossinho da sorte, depois do almoço
de sábado. O ato de contrição, a confissão, a hóstia, o Cristo
vivo e ressuscitado no coração. O vale-ducha do posto de gasolina
para quem abastece trinta ou mais litros de segunda a quarta. O
lustro com Kaol na prataria, o zelo com o par de abotoaduras, os
sapatos pretos e prontos para a reunião da associação de bairro, a
imagem de São Cristóvão no retrovisor do Clio.
Vai
que um pneu fura, é bom lembrar de calibrar também o estepe. Vai
que chega lá e não tem mais mesa, é bom se precaver e reservar com
antecedência o lugar para a família no jantar de caridade. Vai que
o tempo fecha de repente, é bom carregar sempre um guarda-chuva na
maleta. Vai que o chefe resolve chegar mais cedo, é bom já estar a
postos, meia hora antes de todos, para não correr o risco. Vai que o
cuco não desperta, é bom dar corda até o fim, e assim que
endurecer ainda forçar mais um pouco, para dormir sossegado e
amanhecer bem disposto.
Deus
me livre de dar palpite onde não sou chamado, mas a filha caçula do
vizinho anda metida com um tranqueira. Longe de mim maledicência e
intriga, mas é mesmo muito estranho um homem temente aos céus andar
assim tatuado, com cinco filhos nas costas e patente de major. Olha,
não é por nada não – até porque eu nunca liguei para essas
coisas – mas que ali tem, isso tem. E como tem. Misericórdia…
Não
foi por falta de aviso que a coisa deu no que deu, o quanto que eu
alertei! Se conselho fosse bom ninguém dava – vendia; mas como já
vi muita água passar por debaixo da ponte, não ia deixar meu
compadre ser o último a saber.
Eu
posso não ter nem a metade do que esse sacana do meu chefe acumulou
tungando os outros, mas quando eu chego em casa eu boto a cabeça no
travesseiro com a consciência tranquila. E ele, será que? Nada como
um dia depois do outro para ver quem ri por último. Essa lição e
esse exemplo eu trouxe do meu pai. Esse sim, sabia tudo.
Quando
eu tinha sua idade, também tinha pôster, boina e barba do Guevara.
Quando eu tinha sua idade, experimentei mas não traguei. Quando eu
tinha sua idade, também queria virar o mundo do avesso. Quando eu
tinha sua idade, devia ter perdido menos tempo com bobagem e
assistido mais episódios do mundo submarino de Jacques Cousteau.
Quando eu tinha sua idade, me segurei e respeitei sua mãe até o
casamento. Quando se tem 20 e não se é comunista, o sujeito é mau
caráter; quando se chega aos 40 e se permanece comunista, o sujeito
é retardado.
Nem
adianta eu tentar te convencer agora que você está errado, é só
quebrando a cara que você vai mudar de ideia. O tempo vai ensinar.
Escuta bem o que eu estou te falando.
*
Marcelo
Sguassábia é redator publicitário. Blogs:
WWW.consoantesreticentes.blogspot.com (Crônicas e Contos) e
WWW.letraeme.blogspot.com (portfólio).
Não conheço muitos comunistas, mas socialistas sim, uma porção. Não os acho retardados. Afora este detalhe, gostei das histórias.
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