O maior romancista
As
pessoas (e me incluo entre elas, claro) têm o péssimo hábito de
avaliar o desempenho alheio, nas mais variadas atividades, de forma
puramente emocional. Quem já não ouviu dizer (ou não disse), por
exemplo, que Pelé é o maior jogador de futebol de todos os tempos
(os argentinos diziam que foi Diego Maradona e hoje dizem que é
Messi, mas os portugueses garantem que é o Cristiano Ronaldo)? Eu
já fiz essa afirmativa zilhões de vezes.
Ou
quem não se manifestou de forma idêntica em relação a Michael
Jordan, “mago” do basquete, ou ao jamaicano Usain Bolt,
atualmente o homem mais rápido do mundo no atletismo? Onde o erro
dessa avaliação? A falha reside no fato de não haver qualquer
parâmetro exato e infalível a respeito. Eu simplificaria um pouco a
afirmação e, em vez de dizer “o maior”, diria “um dos
maiores”. Com isso, ficam abertas as possibilidades de superação,
sem arranhar os méritos de quem já consumou suas conquistas.
Você
afirma (ou já ouviu alguém afirmar) que fulano é o maior estadista
da História. Muito bem. E você conhece todos os demais? Tem, ao
menos, conhecimento profundo, íntimo e não somente o superficial,
colhido ao acaso no noticiário da imprensa, sobre o que você elegeu
como o “super dos supers”? Óbvio que não!
Então,
por que se arriscar a fazer uma avaliação desse tipo? Se você
disser que ele é “um dos maiores estadistas”, mesmo que estiver
errado, seu erro já não será tão grande. O mesmo raciocínio vale
para os maiorais das artes, da ciência, da filosofia etc.etc.etc.
Em
papo com os amigos, em rodinhas de bar, costumo fazer provocações
com perguntas do tipo: “qual foi melhor romancista, Leon Tolstoi,
Fedor Dostoievski ou Honoré de Balzac”? Esse questionamento rende
horas, dias, quando não semanas de acesas discussões, sem que se
chegue a conclusão alguma. Não passam de inócuo bla-bla-blá.
Por
que? Pelo simples fato de não se poder comparar pessoas, talentos ou
coisas desiguais. Cada um desses escritores foi excelente em sua
especialidade. Os três citados têm estilos, realidades de vida e
concepções literárias muito diferentes um do outro. E qual a razão
objetiva de se buscar determinar suposta superioridade de um sobre o
outro? Nenhuma! E há algum parâmetro infalível, que não seja o
mero gosto pessoal (e assim mesmo esse é sumamente volúvel e muda
de um dia para outro), para aferir não somente capacidades, mas
obras completas? Claro que não!
Faço
esse tipo de questionamento de propósito. Claro que não espero
obter, com isso, a mínima resposta conclusiva. Jamais a obtive,
obterei ou obteria. Não faz muito, fiz a mesma provocação, mas em
relação a Machado de Assis e João Guimarães Rosa. O resultado,
evidentemente, foi o mesmíssimo. Afinal, esses escritores têm
biografias, realidades, temáticas e estilos absolutamente
diferentes. E não se pode dizer, nem precipitadamente, para se
arrepender depois, que um tenha sido melhor do que o outro. Ambos
sequer foram contemporâneos.
Uma coisa, porém, é levantar esse tipo de questionamento em rodinhas de bar e outra é levá-lo para o âmbito acadêmico (como muitos fazem). Aí já considero o suprassumo da injustiça e da irresponsabilidade. Por mais talentosa que uma pessoa seja em sua atividade, nada me credencia a afirmar que amanhã não apareça outra que seja considerada superior (mesmo sem o ser).
Sem
deixar de reconhecer os incontestáveis méritos e nem desmerecer
suas realizações, o que me credencia a dizer, com irrestrita
convicção, que amanhã não irá aparecer outro atleta considerado
(com todas as restrições que já fiz neste texto), mais talentoso e
mais habilidoso do que Pelé, ou do que Michael Jordan ou do que
Usain Bolt, em suas respectivas modalidades? E quem garante que
estes, por sua vez, não venham, também, a ser superados em seus
feitos por outros, e assim sucessivamente? Ninguém, obviamente!
Há,
contudo, uma e uma única exceção e esta se refere (por paradoxal
que pareça) a romancistas. Por que esta admiração, paciente
leitor?! Não, não estou sendo contraditório. Aliás, para não
dizerem que me desdisse, recorro aos préstimos de Honoré de Balzac.
O
ilustre escritor apontou, sem titubear, o maior romancista do mundo.
Por modéstia, talvez, não disse que era ele. Seria algum francês
(Hugo, quem sabe)? Seria russo, norte-americano, inglês ou japonês?
Não! E nem brasileiro.
Balzac assegurou: “O acaso é o maior romancista do mundo; para ser fecundo, basta estudá-lo”. Eureka!!! Aí, já sou obrigado a concordar. A própria experiência pessoal me indica que ele tem plena razão. E, aliás, desmente a afirmação que a todo o momento ouço por aí, de que “nada acontece por acaso”. Sou tentado a dizer que o que ocorre é exatamente o inverso. Ou seja, que “tudo” é casual..Ou você tem dúvida a respeito, meu paciente, compreensivo e fiel leitor?
Boa
leitura!
O
Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
Ah, quanta contradição! Quando defende a existência de Deus, já afirmou aqui que nada foi por acaso e sim nasceu da vontade de um ser superior (claro que não me recordo as palavras, apesar de lê-lo diariamente há uma década). Para mim, tudo acontece por acaso.
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