domingo, 14 de maio de 2017

Querer e poder


* Por Pedro J. Bondaczuk


A História da humanidade, infelizmente, foi escrita com sangue, muito sangue, derramado em nome de ideais supostamente nobres, mas que, na verdade, escondiam interesses inconfessáveis. Daí as contradições do nosso tempo no relacionamento das pessoas. Daí haver tanta cobiça, maldade, violência, ignorância, corrupção e injustiças pelo mundo afora. E as coisas só não são piores, porque homens generosos e sábios nos legaram ideias, conceitos e valores eternizados pelo tempo.

Os pensadores é que deveriam ser exaltados pelos historiadores, não os tiranos, os generais, os soldados e os semeadores de morte e de destruição. Destruir pessoas e obras nunca foi heroísmo. A possibilidade de pensar é uma das prerrogativas mais nobres que temos e, ao mesmo tempo, é um dever.

Compete-nos contribuir para a solução dos grandes problemas que afligem a humanidade. Há, contudo, os que não “querem” pensar, aferrados a pensamentos alheios, que colocam como dogmas. São os fanáticos, que impedem, com sua falta de visão, o progresso dos povos.

Há, por outro lado, os que não “podem” exercer essa prerrogativa, por deficiência mental. São os loucos e idiotas, que não têm culpa desses males e aos quais se perdoa essa falta de raciocínio. Mas não “ousar” pensar é o delito dos delitos. Significa omissão. E o omisso é um parasita, que sempre depende que outros façam o que lhe caberia fazer.

Não raro lamentamos obstáculos e dificuldades que temos que enfrentar durante a vida e lhes atribuímos eventuais fracassos, o que é um álibi sem nenhuma consistência. A atitude mais correta é a de considerarmos esses “acidentes de percurso” como privilégios, pois se tratam de desafios a vencer e que, superados, valorizam nossas conquistas.

Mesmo que não venhamos a nos dar conta, temos forças físicas e/ou mentais para superar qualquer barreira. Para isso, fomos dotados de inteligência, arma irresistível quando utilizada com competência e persistência. Obstáculos e dificuldades são testes aos nossos limites, que nunca sabemos, a priori, quais são.

Deveríamos “visitar-nos” com mais freqüência, se possível diariamente. Deveríamos penetrar em nosso íntimo e conferir o que, de fato, somos, pensamos e queremos. Raros são os que fazem esse saudável exercício. Por isso, não se conhecem. Manda a prudência que façamos balanço permanente dos nossos pensamentos e sentimentos e que renovemos, dia a dia, o “estoque” de ideias, descartando as ineficazes e colhendo, onde for possível, as nobres, positivas, eficientes e construtivas.

O ato de escrever proporciona essa oportunidade. É uma responsabilidade imensa esse exercício de registrar conceitos e emoções para transmitir ao próximo. Afinal, o texto tende a nos sobreviver por dias, meses, anos, não raro por séculos e até milênios após a nossa morte, dependendo da sua qualidade e das circunstâncias. Pode tanto testemunhar a nosso favor, quanto depor contra nós.

As ações podem ser ditadas ou pela razão, ou pela emoção, embora ambas não sejam excludentes. O ideal é que sejam sempre construtivas e que tenham esses dois componentes da nossa alma atuando em conjunto. Atos ditados somente pela razão tendem a ser frios e, muitas vezes, ferir suscetibilidades. Se movidos, apenas, pela emoção, podem ser ilógicos e até destrutivos.

As ações puramente racionais são, quase sempre, previsíveis. Afinal, são ditadas, somente, pela lógica. Já as emocionais, têm característica oposta. Ou seja, são inesperadas e, portanto, imprevisíveis. Os atos mais eficazes, construtivos e duradouros, no entanto, são os ditados pelo coração, mas coordenados pela razão. Ambas devem caminhar sempre juntas.

Todavia, se por algum motivo tiver que optar por qualquer dessas características, que se escolha a primeira. Pois, para mim (e para Machado de Assis), “o coração é a região do inesperado”, quer para o bem, quer para o mal.

É certo que querer é poder. Essa vontade, todavia, precisa ser prática, acompanhada de ações. Não basta só desejar alguma coisa: é preciso lutar por ela, agir positivamente para a sua obtenção, ser veemente e perseverante em sua tentativa. É verdade que muitas vezes (diria, a maioria), por mais que nos empenhemos, não somos bem-sucedidos. Seria isso uma derrota? Não considero assim.

Há circunstâncias que anulam todos nossos esforços e nos impedem de transformar o querer em poder. Isso, no entanto, não pode ser considerado fracasso. Porque, mesmo não atingindo o objetivo principal, em nosso empenho para consegui-lo, faremos coisas admiráveis, que não conseguiríamos se não nos empenhássemos tanto. E isso faz qualquer esforço valer a pena.



* Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance Fatal” (contos), “Cronos & Narciso” (crônicas), “Antologia” – maio de 1991 a maio de 1996. Publicações da Academia Campinense de Letras nº 49 (edição comemorativa do 40º aniversário), página 74 e “Antologia” – maio de 1996 a maio de 2001. Publicações da Academia Campinense de Letras nº 53, página 54. Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com. Twitter:@bondaczuk

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