Três
palavras
* Por
Marta Góes
1.
Russo
É
o nome da neblina densa e leitosa que baixa no inverno sobre a cidade
de Petrópolis e sobre a estrada que leva ao Rio. É tão densa que
não se veem as casas da calçada em frente nem os outros carros na
pista. É preciso avançar a 20 km por hora, de nariz grudado no
párabrisa, e guiar-se pela fosforescência dos olhos de gato no
asfalto, no silêncio preocupado que congela a conversa. Desaparecem,
engolidos pelo russo, todos os traços do verão - o trânsito dos
cariocas em férias, os restaurantes lotados, a música dos bailes de
Carnaval. Essas cenas longínquas passam a habitar um tempo difuso
chamado “o verão passado”. Agora faz frio e tudo destila
umidade. O russo é o cúmulo do inverno, é a outra cara de
Petrópolis.
2. Flamboyant
As
três vogais, com som de quatro - falamos flambuaiã - dão à
palavra, um tremor de pluma, igual ao dos galhos da árvore,
esparramados a pouca altura do chão, com suas folhas miúdas e
flores cor de tangerina. Por florir no calor, os flamboyants trazem
trilha sonora própria, a estridência de cigarras. Alguns, não se
sabe por quê, trazem também o Aterro do Flamengo.
3. Carambola
Além
da fruta de desenho caprichoso, cujas fatias são estrelas amarelas,
ideais para enfeitar pratos (patos?) de fotografia, esse era o nome
do biscoito amanteigado de minha avó (uma xícara de manteiga, uma
de açúcar e duas de farinha, estava escrito no caderno de
receitas). A carambola deu margem a uma série de discussões sobre a
mesquinharia que se esconde nas justificativas dietéticas. Falava-se
até, se bem me lembro, em alguma relação entre economia de
manteiga e falta de caráter.
*
Jornalista, escritora e dramaturga
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