quarta-feira, 31 de maio de 2017

Conflitos internos e externos da falsidade


* Por Mara Narciso
 

Mediar conflitos internos, brigar com fantasmas, criar medos, acabar com eles, definindo o que é possível são tarefas árduas, quando não impossíveis. Arrastam-se bolas de chumbo e correntes frutos da insegurança, influenciada pela mídia. As ameaças vêm do macro (bólido espacial), do micro (incontáveis vírus) e da falsidade. Não se consegue ler o que está escrito, porque a intenção não vem com o texto.
 
Conviver em harmonia é tarefa complexa, por isso muitas pessoas preferem largar gente para conviver com animal ou máquina - outra invasão. Do convívio vem o conflito, então entram em cena os políticos, porque fazer política é mediar conflitos. O Brasil sabe que a política é conflituosa e incestuosa. Não pensa no coletivo, apenas no egoísmo. A Política precisa ser reinventada, deixar de ser pessoal e voltar a ser pública.
 
Isso no atacado, no varejo do próprio quintal, a convivência tropeça insegura. Há tantas cobras por ali, dando seus pequenos botes, tirando seus pequenos, médios e grandes bocados, injetando seu pérfido veneno, que alguns não têm imediata consciência dos riscos e, por comodismo, deixam estar. Amores, amigos, funcionários rondam por anos, e acostumam-se com suas maneiras, e muitas delas fazem mal. Debitam-se os tropeços às características pessoais imutáveis e dardos lançados são entendidos como normais. Sinal amarelo: atenção!
 
Está em voga aquele tipo de amigo que disputa tudo, medindo forças como se nunca pudesse relaxar e ser ele próprio. Nem todos conseguem se salvar, fugindo de pessoas envolventes, ardilosas, sinistras, que por detrás do sorriso e alegado rol de bondades, têm objetivo traiçoeiro. Há quem se sinta e queira provar, ainda que com disfarces, que é mais do que o outro em tudo. Usa as pessoas de forma vil, e muitos não se percebem usados. Acabam por acreditar que são menos capazes do que quem os oprime/ dirige.
 
Num tempo em que a palavra “amigo” não diz quase nada, mal serve para diferenciar do inimigo, a qualquer momento pode-se mudar, e até mesmo de forma radical. Bom seria arrumar outra expressão para denominar quem compartilha dores e glórias, sem inveja. Ou resignificar a palavra amigo, não se deixando levar pela vaidade, compreendendo o limite do outro e se afastando das cobras (as venenosas).
 
O que se diz e o que se escreve escondem armadilhas. Não é possível acreditar em palavras, áudios e vídeos. Os sentidos são enganados com relativa facilidade. A questão vem: o que está por trás disso? Sem paranoia, qual é a intenção dessa fala? Nada e tudo parecem verdadeiros. Ainda que nas redes sociais se veja, leia e ouça “amor, amigo e lindo”, a todo instante, e até por isso perderam o sentido, o que se vê são inimigo, ódio, crueldade e feiura. A interna maior do que a externa.
 
Os internautas vão “surfando” e se sentindo lúcidos e certos, confiantes e convictos, a cada hora manipulando ou se deixando levar por um ou por outro, achando que pensam, que definem o próprio caminho. São levados por onda forte, sem poder se agarrar ao salva-vidas. E o pior, enganados, pensam que sabem, que podem, que o caminho é fruto do acaso, sem um condutor maior: o Dinheiro.
 
Tomar decisões está difícil, ainda que pareça o contrário. Depois é não pensar em culpa e arrependimento. O que está feito está feito, em nível pessoal e coletivo. O conjunto dá a dimensão do conflito mental e social. Misturar para passar na peneira, sabendo que a falsidade campeia o mundo, abraçada à mentira. Todos estão certos, inclusive os errados. Como dizia Chacrinha: eu vim para confundir, não para explicar. A internet anda assim. E os passos são largos. Sair ileso do contato com as pessoas traiçoeiras e suas falsidades é uma arte.


* Médica endocrinologista, jornalista profissional, membro da Academia Feminina de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico, ambos de Montes Claros e autora do livro “Segurando a Hiperatividade”



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