quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

Visita dos pensamentos


O homem contemporâneo, ferozmente materialista, obcecado pela conquista de bens materiais dos quais, provavelmente, sequer terá tempo de usufruir, dá cada vez menos valor à reflexão, ao indispensável (e por ele temido) encontro consigo mesmo. Como conseqüência, decresce a quantidade de  seus pensamentos e, mesmo vivendo em meio a crescentes multidões, num mundo superpovoado (que caminha para oito bilhões de habitantes)  e crescentemente hostil, sente-se cada vez mais solitário e vazio. Não conta, sequer, com a “própria” companhia.

Meditar é um hábito, que se deve desenvolver desde a mais tenra idade. É uma espécie de treino para o cérebro. As pessoas preocupam-se, cada vez mais, com o corpo. Freqüentam academias, contratam profissionais para lhes dar orientação sobre a quantidade e intensidade de exercícios que devem fazer para manterem-se em forma, submetem-se a dietas, enfim, cuidam do organismo, para que este se mostre saudável e bonito.

É errada essa preocupação? Claro que não! Afinal, vale a máxima: “corpo são, mente sã”. É evidente que nem todas as pessoas podem se dar a esse luxo. Aliás, ele é restrito à minoria, que conta com renda que lhe permite uma vida confortável e sem grandes (ou nenhuma) privações. Dois terços, dos mais de sete bilhões de habitantes do mundo, têm preocupações muito mais imediatas e urgentes: a do almoço de hoje, por exemplo.

É ao cidadão que mora bem; come do bom e do melhor; tem um carrão potente (do ano); conta com polpuda conta bancária; passa férias nos Estados Unidos, na Europa, em Bali ou nas praias do Nordeste ou de Santa Catarina; que tem tempo e dinheiro para cuidar do corpo (não somente dos músculos, mas também da pele, dos cabelos, dos dentes, das unhas etc.) que me dirijo. E por que? Por que sou preconceituoso? Claro que não! Porque é esse o tipo de pessoas que constitui a quase totalidade dos meus leitores, por ter acesso a livros, jornais, revistas, internet, onde divulgo meus textos. Que bom seria se todos os habitantes do Planeta pudessem ter acesso a essas facilidades!!!

A preocupação dessa gente em manter o melhor condicionamento físico possível, reitero, é, não somente prudente como, sobretudo, inteligente. Com isso, tem probabilidade de viver mais e, o importante disso tudo, de ter vida de qualidade. O único senão dessas pessoas é o fato de (salvo raras exceções) não se preocuparem com o principal: a boa forma intelectual. É certo que ainda não existem academias que se esmerem no condicionamento intelectual. E nem são necessárias. Basta que se adquira o saudável, mas cada vez mais raro, hábito da meditação.
       
Para recebermos a “visita” dos pássaros dos pensamentos, é preciso que criemos um ambiente propício, que lhes seja atrativo. Que não haja risco deles se perderem, o que fará, ao mínimo sinal desse perigo, com que busquem outros lugares para construir seus ninhos. Temos que formar um “estoque” razoável de idéias, o que se faz com boas leituras, com músicas que realmente mereçam esse nome, com freqüência às exposições de arte, com conversas sadias e proveitosas etc. etc.etc. São hábitos chatos? Alguns acham que sim. Esses alienados são irrecuperáveis

Mas o que essa gente privilegiada, que cuida com tamanho afinco do corpo (o que reitero, mais uma vez, é saudabilíssimo e inteligente) faz? Em seus momentos de folga, entrega-se a diversões que sequer são divertidas, para espantar o tédio de suas vidas. Em poucas horas nas boates, danceterias e outros tantos locais semelhantes, que não lhes trazem o mínimo proveito, mas somente despesas e riscos, perdem parte do condicionamento adquirido em semanas de duros e sofridos exercícios, ao se excederem na comida, na bebida, no sexo, quando não recorrendo a drogas.
 
Os pássaros dos pensamentos jamais visitarão as mentes dessas pessoas. São ambientes hostis, nos quais não resta sequer um único graveto disponível para que possam construir seus ninhos. Dessa forma, suas vidas continuarão tediosas, perdulárias e vazias, caracterizadas, principalmente, pela tola e estúpida ostentação, a despeito do bem-estar orgânico que conquistaram com tanto sacrifício. Exagero? Reflitam e concluirão que não.

Henry David Thoreau escreveu o seguinte a respeito, no ensaio “Caminhando”, publicado em seu livro “Desobedecendo”: “Na Nova Inglaterra temos o hábito de dizer que a cada ano é menor o número de pombos que nos visitam. Nossas florestas não lhes fornecem um bom lugar para pousar. Da mesma forma, talvez, vai diminuindo de ano a ano a quantidade de pensamentos que visitam um homem que vai crescendo, pois destruímos os arvoredos de nossas mentes, para alimentar o fogo útil das ambições ou a fornalha das fábricas e mal sobra um graveto no qual possa repousar uma reflexão. Os pensamentos não mais fazem seu ninho em nossa mente”.

Conservemos, pois, mesmo que escassos gravetos, que permitam que as aves dos pensamentos façam seus ninhos em nossas mentes e corações. Não se esqueça que corpo e mente formam um único e magnífico conjunto, que é o homem. Medite sobre isso, como exercício inicial para desenvolver o saudável e indispensável hábito da meditação.

Boa leitura!

O Editor.

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Um comentário:

  1. Gostei da sua sinceridade:
    "São hábitos chatos? Alguns acham que sim."
    Eu nunca tentei meditar. Vou procurar saber como se faz isso, pois nada sei, ainda que tenha lido já há alguns anos sobre esse seu hábito.

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