quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Somos essas manhãs

* Por Thereza Rocque da Motta


para João de Abreu Borges


Os olhos da noite
espreitam
os muros de musgo
por onde passam
gatos suspeitos
e lagartixas
apressadas.

Madrugada adentro
a lua ausculta
o sussurrar cúmplice
dos pássaros
engaiolados.

Luares prateados
envolvem poemas
vértices
vórtices
votivos.

Lua dia e noite.
Sol noite e dia.
Vivemos cumplicidades
estreitas
brilhos candeeiros
chuva fina sobre os pastos.

O mito dos índios
avança, os índios
avançam na escuridão.
Impossível morte
Impossível silêncio.
Tantos
muitos
fins.

O rosto desenhado na areia
memória salobra
mares de sal
saudades
guardadas sob os telhados
aragens das tempestades
que se aproximam.

Somos essas manhãs
em que nada se avizinha
e somente a espera habita
os espaços deixados
por nós mesmos.

Somos essas esperas
de noites mal dormidas
e corações que escutam
outros corações.

Amanhã tudo melhora.
Não importam mais
os cuidados, os mitos,
as perdas, as faltas,
as falas, as cotovias
que partiram.
Nada mais importa
senão o porvir.


* Poetisa, advogada e tradutora

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