sábado, 11 de julho de 2015

Devaneios de uma roqueira 7


* Por Fernando Yanmar Narciso


CAPÍTULO 3


Now a little bit ‘bout me...

Pelo que venho contando já há algum tempo, deu ‘procêis’ se ligarem que eu não sou exatamente a mocinha limpinha e pudica que a mãe apresenta ao filho, né verdade, moçada? Pra mim, um dia sem boas doses de sexo, rock, caos e meu Kurt Cobain é como chuva sem água. Simplesmente uma obra de arte incompleta.

Desde menina minha relação com o rock tem sido uma experiência libertadora. Como mãe sequer lavava minhas calcinhas e até hoje finge que eu não existo, ela pouco se importava se eu ligasse um som tão alto que fizesse os pedaços de mofo se soltarem do teto do apê em ‘belzônti’. Tocando na vitrola bossa nova ou o disco mais berrado do Mudhoney, ela não ‘tava’ nem aí, nem quando os vizinhos vinham esmurrar a porta da frente reclamando. Mesmo tendo começado minha vida sexual muito nova, Dna. Maria Ibanez continuava sem falar comigo ou perguntar quem era o boyzinho entrando comigo no quarto. Velha doida...

Admito, talvez com alguma modéstia, ser uma pequena virtuose nas seis cordas. Aos cinco anos já conseguia tirar de ouvido qualquer som que me apresentassem. Mas, apesar de a profissão de professora de música exigir certa erudição, assim que apago as luzes da classe, prefiro tentar esquecer que entendo as partituras de Franz Liszt e Beethoven.

Dick Peterson, vocalista da banda de blues psicodélico Blue Cheer- Já ouviram falar? Pois deviam!- dizia: ‘Rock n’ Roll são 10% de técnica e 90% de atitude. Uma nota com a atitude certa vale mais que 60 notas sem atitude’. Feeling is everything! Todas as minhas bandas favoritas nasceram e morreram na garagem, entorpecidas em crueza, sinceridade e produção mambembe, quase artesanal, mas cheias de alma.

Já fiquei de saco cheio de tanto atender pedidos em nossos shows de ‘toca solo-tal de música-tal’ de Steve Vai, Joe Satriani, Eddie Van Halen ou de qualquer outro guitarrista ‘punhetinha’ que meus alunos tanto idolatram. O que aqueles guitarristas egocêntricos tocam desafia as leis da física, certas músicas eu até curto, mas quase tudo que compõem segue o estilo ‘disparo 500 notas por segundo, todas aleatórias, nenhuma com sentimento’.

Eu não sou como aqueles malucos narcisistas! Eu não canto, eu RUJO! Eu não extraio melodias do instrumento, eu o faço implorar por misericórdia! Mas não chego a ser como certos punks xiitas que se recusam a solar, mesmo sabendo. Eu e Barbie conseguimos conduzir verdadeiras jam sessions de rock progressivo e acid blues em nossos shows, mas uma coisa que não fazemos é desperdiçar frases de guitarra.

‘Nóis’ pode até viajar na maionese por mais de 20 minutos, mas se eu não conseguir tocar fundo na alma de pelo menos um no meio da multidão, perdi meu tempo. Vou dizer uma coisa muito engraçada: As Margaridas Psicóticas podem até ser uma banda à moda dos anos 60, mas além do som daquela época Barbie é fã de armário do Glam Metal pop dos anos 80!
Metal-farofa! Dá pra acreditar? Lembram dos cabelões de ovelha, das cores fluorescentes e da maquiagem?

O lado dela no quarto tem seu pôster de Jim Morrison, paixão da vida dela, mas tem uns 50 vinis de metal-farofa escondidos no guarda-roupa. Precisam ver as reações da plateia quando resolvo sair do palco pra tomar um ar e Bárbara tira uma baladinha dos Scorpions ou do Bon Jovi da cartola! É sempre hilário, especialmente porque em vez de guita, ela toca aquelas músicas chicletentas num saltério elétrico! (Risos)

Não somos tão excêntricas como ‘ocêis’ podem imaginar. Sou uma pessoa como qualquer outra, tenho minha sorte de fetiches como qualquer mulher. Apesar de não seguir o look ‘piriguete’, sou viciada em usar roupas justíssimas. Minha família diz até que minhas calças jeans são tão apertadas que eu preciso passar graxa de máquina nas pernas para poder caber dentro delas, maldade...

I dunno, só gosto de sentir cada parte de meu corpo forçando as fibras do tecido enquanto ando, a ponto de a roupa quase se desfazer. Dá-me um tesão esquisito sentir meus fartos seios sufocados, minha bunda se dobrar dentro das calças como uma tapioca... É quase masoquismo de minha parte, numa cidade tão fria quanto São Modesto, eu só andar por aí de calça jeans stretch e camiseta baby-look do tamanho de uma flanela. (Risos)

Mas certas peças de roupas me são indispensáveis: Minha bandana preta de estimação, minha coleirinha de espetos, meu ‘pingente de azar’ em forma de Espadas, meus tênis All-Star vermelhos surrados que uso há dez anos e qualquer peça de roupa amarela ou verde. Agora, se me dão licença, ainda estou dormindo. Quem vos falou foi meu estabanado subconsciente. Falta ainda uma meia hora de sono até que o alarme do celular dispare então good night! See y’all later!

Alexia, sua não tão confiável narradora.

* Escritor e designer gráfico. Contatos:
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