terça-feira, 8 de maio de 2018

Amanhã pode ser o fim - Tião Martins


Amanhã pode ser o fim

* Por Tião Martins

Morrer é coisa que só se vive uma vez, ainda bem.

Pior seria se fossem várias, para agradar aos mais vaidosos. Chegamos indefesos ao mundo e, no final da viagem, estamos mais cansados e nem sempre mais sábios.

Rugas, cabelos brancos, alarmes falsos, desmaios, atropelamentos, cirurgias e perdas amorosas são sinais que acumulamos. Sinais que nos lembram, dia após dia, ano após ano, que existe um fim.

Ao final dessa curta ou longa viagem, chega a hora de partir. E muitos se sentem piores do que ao chegar.

Cada um vem a este mundo cercado de desconhecidos: pais, irmãos e irmãs, doutores, o meio em que crescem, as amigas, os amigos e os mestres.

Pequenas áreas dentro de nós deixam de receber o amor, o cuidado e a atenção que desejávamos. Recebemos nota zero em vez de dez e ninguém diz que somos bons, bonitos, inteligentes e sábios.

E essa qualificação incomoda, gerando a tal da “criança ferida”, interna e carente de amor, perdão e cura.

Queríamos nos livrar das dúvidas e caímos nas armadilhas da culpa, que não atuam apenas em um dia, mas passo a passo, mês após mês, ano após ano.

Sabemos que a morte nos espera, um saber que nada tem de delicioso, mas é inevitável. Só então, se tudo correr bem, alcançamos a autêntica humanidade, irmã da paciência, da serenidade e do amor.

Ao compreender essa verdade, já estamos bem perto do fim e quase sempre com a ilusão de reescrever a história, agora que julgamos saber mais.

Ainda bem que só nascemos uma vez.


* Jornalista. Assina coluna diária no jornal “Hoje em Dia” de Belo Horizonte


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