quarta-feira, 5 de abril de 2017

Sempre e nunca são tempos longos demais!

* Por Mara Narciso


Por hábito, há pelo menos 16 anos, escrevo com frequência e periodicidade. Com o tempo fui reparando que, depois de pronto, o texto aceita a supressão de muitos vocábulos. Inclusive meu primo Cláudio Narciso, que também é jornalista, fala que escrever bem é saber cortar palavras. Logo vi que “sempre” e “nunca” não fazem falta nenhuma. Passem a reparar.

Se não mudam o sentido por escrito, na vida mudam tudo. Sempre ou nunca, qual delas traz maior desconforto? Há a máxima “na Medicina, nem sempre, nem nunca”, e depois de mais de 37 anos de exercício pude confirmar isso muitas vezes. São tantos os resultados inexplicáveis, que o melhor é não tentar elucidar. Diante de uma hipótese diagnóstica, trabalha-se com informações variáveis e flexíveis por si mesmas. Utiliza-se a história da doença, o exame físico e os exames complementares para se tomar uma decisão. Algumas vezes se faz necessário o uso da prova terapêutica, cuja tentativa e resultado podem ser os únicos caminhos. A Medicina baseada em evidências é uma larga estrada e a experiência do médico marca pontos.

Erros médicos podem ocorrer por imperícia (não sabe o que está fazendo), negligência (não faz o que deveria ser feito), e imprudência (é precipitado e faz o que não deveria). O corpo humano é plástico e pode consertar pequenos desacertos. O organismo se ajusta, “apesar do médico”, dizem os próprios médicos. O que nunca pode falhar é a relação médico-paciente, em que devem pesar empatia, confiança e respeito.

Algumas situações médicas aproximam-se do quase nunca e do quase sempre. Tanto uma quanto a outra expressão podem significar coisa boa ou ruim. Se há iminência de coisa ruim, o médico poderá tranquilizar dizendo (desde que seja informação verdadeira), que aquilo quase nunca acontece. Por outro lado, se há tendência a coisa boa, mas a maior probabilidade matemática é para coisa ruim, pode ser aventada delicadamente essa hipótese do mau. A angústia de quem espera o resultado de uma biópsia com tudo desfavorável, não deve ser confrontada com esperanças vãs de exame normal. Isso é irresponsabilidade. Melhor esperar pra ver.

A morte é para sempre, e o reencontro será para nunca. Já no amor a conotação do sempre e do nunca recebe mil outros significados. Quem ama e é amado, quer que o amor bilateral dure para sempre, pelo menos até que a morte os separe. Mas, enquanto a liquidez de dinheiro é uma coisa boa, o sentimento em estado sólido parece ser mais durável. Saber lidar com perdas amorosas é tarefa para gigantes. Mas o apaixonado só se agiganta com essas perdas. Algumas vezes é preciso alguém dar uma bofetada na cara do abandonado, com uma frase dura: ele não vai voltar nunca mais. Assusta, mas é didático. Fazer nascerem esperanças inúteis é dar duas surras na mesma pessoa. Não esperar nada e nada receber é menos traumático do que ficar paralisado esperando algo que não chegará.

Para quem espera, qual tempo será maior e mais terrível, o sempre ou o nunca? Na vida tudo é relativo, personalizado, individualizado. E para coisa boa, um novo amor, por exemplo, que nunca precisemos esperar pelo nunca mais.

* Médica endocrinologista, jornalista profissional, membro da Academia Feminina de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico, ambos de Montes Claros e autora do livro “Segurando a Hiperatividade”   


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