Previdência:
sonegadores ignorados
Por
Frei Betto
A
reforma da Previdência proposta pelo governo Temer retira direitos
dos trabalhadores para defender privilégios dos empregadores e do
capital. Se o governo precisa de recursos, por que não pôr fim às
desonerações concedidas a bancos, agronegócio e empresas?
Desonerar é dispensar de pagar impostos.
Por
que não cobra as multas devidas por fazendeiros flagrados por adotar
trabalho escravo em suas terras? E por que não divulga mais a lista
com os nomes desses criminosos?
Por
que não cobra o que devem os grandes sonegadores do imposto de
renda? Calcula-se que o montante da sonegação equivale a 13% do
PIB. E a sonegação dos encargos trabalhistas ultrapassa R$ 500
bilhões! A informação é da Procuradoria-Geral da Fazenda
Nacional.
Ao
liberar o FGTS, o governo não fez nenhuma bondade. Quis apenas
amenizar a recessão econômica e encher ainda mais os gordos cofres
dos bancos, já que grande parte de nossa população está
endividada e, assim, as dívidas podem, agora, ser amortizadas.
Muitos
trabalhadores, ao correrem à Caixa Econômica Federal, descobriram
que seus patrões não recolheram o FGTS. Mais da metade do valor
total das contas do FGTS não foi paga pelas empresas. Afirma a CEF
que mais de 7 milhões de trabalhadores não receberam corretamente
os depósitos a que teriam direito. O valor total devido pelas
empresas chega a mais de R$ 24,5 bilhões. Por que o governo não
multa esses sonegadores? Por que não os obriga a depositar o que
roubaram do trabalhador?
O
Estado brasileiro está quebrado não por culpa da Previdência, e
sim dos juros que ele paga para rolar a dívida pública. Metade do
orçamento da União vai para a dívida pública. Quando o médico
Adib Jatene foi convidado pelo presidente FHC para ser ministro da
Saúde, exigiu que se garantissem recursos à pasta com a adoção da
CPMF (0,38% do valor de cada cheque). O presidente concordou. Mas não
cumpriu a palavra. Canalizou boa parte do dinheiro da CPMF para
assegurar o superávit primário (dinheiro sagrado dos bancos).
O
médico Adib Jatene, em entrevista ao jornalista Josias de Souza, em
agosto de 2007, ao ser indagado se pedira demissão do cargo de
ministro da Saúde, no governo FHC, por causa da CPMF, respondeu:
“Teve relação direta. Eu disse ao presidente que precisava de
recursos. Ele pediu para eu falar com o Malan, ministro da Fazenda.
Malan me disse que, em dois ou três anos, daria o dinheiro que eu
precisava. Eu não podia esperar tanto tempo. Propus a volta do
imposto sobre o cheque, o IPMF, extinto em 1994. FHC disse: ‘Não
vai conseguir aprovar isso.’ ‘Posso tentar?’ Ele autorizou.
Pedi o compromisso dele de que o orçamento da Saúde não seria
reduzido. A CPMF entraria como adicional. Ele disse: ‘Isso eu posso
te garantir.’ Depois da aprovação, a Fazenda reduziu o meu
orçamento. Voltei ao presidente. Disse a ele: ‘No Congresso me
diziam que isso ia acontecer. Eu respondia que não, porque tinha a
sua palavra. Se o senhor não consegue manter a sua palavra, entendo
a sua dificuldade. Mas me faça um favor. Ponha outro no meu lugar.
Foi assim que eu saí, em novembro de 1966”.
*
Frei Betto é escritor, autor de “O que a vida me ensinou”
(Saraiva), entre outros livros.
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