domingo, 22 de maio de 2016

Noturno

* Por Paulo José Cunha
 
Rush de faróis na chuva
Avenidas líquidas 
Automóveis mergulham
rápidos
no cristalino dos teus olhos 
Faíscas de luz estalam no asfalto 
Tremo de medo no alto
deste trampolim noturno
entre nuvens e estrelas 
Mesmo assim me atiro no vazio
Para a vertigem do mergulho
No cristalino dos teus olhos
 
Confiteor 
Sou ator
e cada cena em que te amo
dura o tempo de um amor 
Sou atriz
e quando faço a meretriz
sou a mais devassa puta
do país 
Sou poeta
e quando escrevo
sou assim:
sem começo nem fim,
sem meta, sem mim 
Tarde 
agora é tarde
os pássaros
abandonaram os quintais
não sei se ainda te amo
ou se nem mais 
agora é tarde
(foi por um triz)
mas passa da hora
e a última perdiz
já foi-se embora 
é tarde, amiga
agora é tarde
já nem lembro mais
do verso daquela cantiga
e o pássaro de fogo
já não arde 
é tarde 
Galo  
No estandarte da crista,
a imponência de um marechal-de-campo,
o olhar superior, as esporas de aço.  
E assim,
imbuído dos mais alevantados propósitos,
o comandante-em-chefe dos quintais subordinados
ergue a voz de comando sobre o silêncio dos telhados,
estufa o peito recoberto de alamares e condecorações,
ordena o arquivamento da noite, revoga as disposições em contrário 
e declara aberta a manhã  


·         Poeta, jornalista, professor e documentarista piauiense, autor dos livros “Salto sem trapézio”, “Perfume de resedá”, “Vermelho, um pessoal garantido” e “Caprichoso, a terra do azul”.


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