quarta-feira, 18 de maio de 2016

A poética do pardalzinho

* Por Gustavo Pilizari


De repente, assombro-me com um barulhinho de chiado... viro a face... e no escuro do canto da casa, vejo o bater contorcido de um animalzinho que, naquela situação, me faz parar tudo para ajudá-lo – e, assim o fiz...

Fui pego pelo grande prazer de poder acolher em minhas pálidas mãos um pequeno bichinho tão docilmente comum, tão banalmente presente em nossas vidas e tão desprezado pelos nossos olhares – nós não olhamos mais com o compasso cadencioso de uma bailarina...

Assim, uma criaturinha frágil, de olhos brilhosos feito burcas novas, pedia o clamor da liberdade, enquanto seu corpinho, de plumagens cinzentas-marrons, com pezinhos feito galhinhos secos perdidos no gramado, mantinha um doloroso tremor...

Mantive-o abraçado em minhas mãos por mais tempo apenas por uma necessidade racional de repensar a vida... acariciando seu corpinho liso, de penas viçosas e bem distribuídas, captava seu olhar sereno, aberto a um negror ovalado nunca visto antes... queria poder dizer a ele que segurá-lo fazia um bem muito bom pra mim, como se a paisagem da vida parasse apenas para admirar este poético enquadramento de vida...

Ali, em pé, observando meus dedos brancos formarem uma jaula de proteção ao pequenino passarinho, sai de mim e me vi por outro ângulo - de fora - na necessidade de pensar a vida que temos...

...Alguém que nesta curta vida tenha o privilégio de se embriagar com o brando olhar luminoso e frágil de um doce pardalzinho não pode pensar em guerras, não pode ser assolado por pensamentos negativos, não pode pensar em maldade ao próximo...

Aquele pardalzinho suplicava piedade em seus olhinhos cheios duma pintura matinal, quando o mesmo nos oferece o gostoso chiado de seu piado, anunciando as manhãs...

O pardalzinho foi, para mim, inspiração para composição desta crônica; foi uma composição poética a me fazer refletir e parar por minutos em meu eixo... Para o pardalzinho, eu era um mostro gigantesco, pronto para devorá-lo com minhas enormes brancas mãos erigidas como jaulas... seu coraçãozinho versava um tom disparado em minhas frágeis mãos – estava em pânico, pedindo uma chance para voar e dançar no céu uma valsa conjunta com seus amigos...

E, com lágrimas no rosto, soltei-o...

Nunca pensei que um pardalzinho pudesse fazer toda a diferença...


* Jornalista

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